Rio - O Rio de Janeiro se junta, a partir desta quarta-feira, a cidades do Brasil e do mundo que dispõe de um espaço para lembrar e impedir que se repitam os horrores do Holocausto. O memorial, no Morro do Pasmado, em Botafogo, Zona Sul da cidade, será aberto para convidados a partir desta quarta-feira (7). A inauguração está marcada para as 9h30, com as presenças confirmadas do prefeito Eduardo Paes e do governador Claudio Castro. A abertura do novo equipamento cultural ao público em geral está prevista para o dia 27 de janeiro.
Até lá, explica o presidente da Associação Cultural Memorial do Holocausto, Alberto Klein, o espaço receberá visitas guiadas para treinamento da equipe.
O memorial foi idealizado pelo ex-deputado estadual Gerson Bergher, marido da vereadora Teresa Bergher, que por sua vez, foi autora da lei que autoriza a obra. Entre os perseguidos, na segunda Guerra Mundial, estavam judeus, ciganos, homossexuais, comunistas e deficientes físicos. O monumento em memória do período existe em várias partes do mundo, como Israel, Berlim, na Alemanha, Washington (EUA), São Paulo e Curitiba, no Brasil. A parlamentar ressalta que o museu será inaugurado em um momento em que o país ainda sofre com a existência de grupos neonazistas.
"O monumento existe em vários países do mundo. Era um sonho muito antigo do Gerson, seu idealizador, e chega num momento importante no Brasil, onde temos visto acentuado crescimento de grupos neonazistas que pregam não só o antissemitismo, mas a discriminação aos negros, aos homossexuais, às mulheres e o uso de armas de fogo. Precisamos falar sempre do horror da segunda guerra, para que não se repita", diz Teresa.
O presidente da Associação Cultural Memorial do Holocausto reforça que o novo museu vai propagar valores como tolerância, respeito e coexistência. Klein acrescenta que há um esforço para que o equipamento permaneça com um espírito apartidário. Ele, que também é presidente da Fierj (Federação Israelita do Rio), cobra que o combate ao nazismo seja uma política de Estado.
"Vamos preservar para que o memorial seja apartidário e não exclua grupos. Estimulamos a tolerância, a coexistência e o respeito. Penso que precisamos ter uma política de estado contra crimes de ódio. Temos que combater a apologia ao nazismo de forma mais veemente e adequar o marco civil da internet", citando um ataque a escolas em Aracruz (ES) promovido por um adolescente em novembro deste ano. O jovem de 16 anos ostentava símbolos nazistas.
Projetado pelo arquiteto André Orioli, vencedor de um concurso promovido pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil em 1988, o monumento tem quase 20 metros de altura. Em sua base, está escrito "Não Matarás". A obra lembra o genocídio de mais de 11 milhões de pessoas, promovido pelos nazistas de 1936 a 1945.
"O objetivo do memorial é reforçar a importância de uma cultura de paz e tolerância. É possível visitar o monumento por dentro para conhecer o seu acervo. Tenho a certeza de que vai atrair muitas pessoas de todo o Brasil, interessadas em conhecer de perto, na exposição permanente, o que foi aquele período tão cruel na História da Humanidade, aceitando o compromisso de manter a paz entre os povos", completa Teresa Bergher.
A obra externa foi inaugurada em 2020 com a presença de autoridades municipais e federais e é dividida em dez partes, que representam os Dez Mandamentos. No total, a estrutura tem 1.624 metros quadrados. A praça conta com um subsolo dedicado à memória do holocausto, com área para exposições. É este o espaço que será aberto a convidados amanhã (7).
Com vista para a enseada de Botafogo e entorno arborizado, o terreno foi cedido pela Prefeitura à Associação Cultural Memorial do Holocausto em abril de 2018. Coube à instituição, a captação de recursos junto à iniciativa privada para a construção do empreendimento. O Instituto de Desenvolvimento e Gestão (IDG) é responsável pela cogestão do espaço, juntamente com a Associação Cultural Memorial do Holocausto, pelos próximos quatro meses.
O presidente da associação cultural destaca que o local se junta aos memoriais de Curitiba e de São Paulo, mas também ressalta suas diferenças. "Nós vamos trabalhar juntos, em termos de base de dados e cadastro de sobreviventes. No entanto, nós teremos um caráter interativo, com mais materiais audiovisuais do que peças", observa.
O conceito do museu que preserva a memória das vítimas do nazismo também se diferencia pelo local que está localizado. "Além do memorial ser tecnológico e moderno, está em um lugar maravilhoso, entre o Corcovado e Pão de Açúcar, em frente à enseada de Botafogo. Dificilmente haverá outro memorial em lugar tão maravilhoso. O visitante sai de uma imersão sobre o que ocorreu no holocausto nazista, e vê a beleza da natureza e do que o homem pode fazer", ressalta. O projeto, que tem paisagismo do escritório Burle Marx, conta com trilhas e bosques, que foram contrapartidas exigidas pela Prefeitura do Rio, à época que o terreno foi cedido.
O museu vai focar nas histórias das vítimas, em suas vidas antes, durante e depois do Holocausto. O memorial terá o papel de levar à compreensão das raízes e ramificações dos preconceitos, do racismo e da construção de estereótipos para conseguir identificá-los e combatê-los.
"A importância de locais como este é a preservação da memória. Aos poucos, sobreviventes vão falecendo. Já existe gente que nega a existência do Holocausto. É importante lembrar para mostrar aonde a intolerância pode nos levar. Por outro lado, precisamos trabalhar a transmissão de valores", afirma Klein.
O museu também vai trazer reflexões sobre outras minorias perseguidas pelo Holocausto, como negros, ciganos, pessoas com deficiência física ou mental, comunidade LGBTQIA+, testemunhas de Jeová, maçons e opositores do regime nazista.
Além da exposição de longa duração, o Memorial do Holocausto terá espaços para mostras temporárias, loja de souvenir, café e espaço multiuso para atividades educativas e culturais, além de um projeto de acessibilidade, não apenas física, mas de interação com o conteúdo e com atividades para todos os públicos.
Áreas e conteúdos
Na rampa de entrada à exposição, na parede lateral do espaço, nomes de comunidades de vários países vão diminuindo à medida em que a entrada principal se aproxima, em uma metáfora visual que remete às comunidades que foram dizimados durante o período do Holocausto. No espaço "Celebração da Vida", no interior do espaço, serão expostos citações e retratos de sobreviventes do horror.
O percurso previsto para a exposição de longa duração é dividido em 3 grandes áreas. O primeiro módulo, "A vida antes do Holocausto", trará os diferentes modos de vida na Alemanha, Polônia, Rússia e outros países, com fotos e vídeos da vida plena dos judeus e demais minorias perseguidas de várias classes sociais — ida às festas, escolas, casamentos, a diversidade dos idiomas e alfabetos, entre outros. À medida que o visitante caminha, ele terá contato com diferentes sons, que vão se transformando e ficam mais intensos, marcando o início da perseguição.
Ao entrar na área "A vida durante o Holocausto", será possível ter contato com o processo que levou ao período, bem como os dilemas éticos enfrentados pelas vítimas em um mundo de caos e perseguição, desde as primeiras ações de discriminação até a deportação e o extermínio. Ali os visitantes terão a real percepção da luta das pessoas pela sobrevivência, a luta pela vida. Seguindo o percurso da mostra, a terceira área será "A vida depois do Holocausto", na qual a liberação, a imigração e a reconstrução serão o foco principal. Com histórias de sobreviventes que vieram para o Brasil, um mapa interativo vai mostrar os fluxos migratórios do período.
Com foco nos direitos humanos, uma instalação artística na varanda do museu promete encerrar a exposição principal do Memorial do Holocausto transportando o visitante para a realidade atual da sociedade. O caminho de saída da exposição — a "Alameda dos Princípios" — será marcado por 18 valores éticos, estimulando o visitante a compreender a lição do conteúdo apresentado. O número 18, em hebraico, tem o simbolismo da vida, pois é o número que corresponde à palavra CHAI, convocando para a reflexão "O que você está levando daqui?".
O Memorial às Vítimas do Holocausto recebe o nome de seu idealizador, Gérson Bergher. O político faleceu em 30 de maio de 2016, vítima de uma parada cardíaca. O parlamentar era casado há 32 anos com a vereadora Teresa Bergher, do Rio de Janeiro, e deixou dois filhos e dois netos.
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