Esgoto da Zona Oeste do Rio vira composto orgânico para agriculturaDivulgação

Rio - A agricultora Hercilia Harumi Iwanaga, moradora de Itaguaí, na Região Metropolitana do Rio, é alérgica a determinados compostos, como esterco de vaca e de aves, que a deixava refém de luvas na hora de fazer o manuseio do plantio. No entanto, ela decidiu trocar o seu insumo de costume pelo composto orgânico feito com resíduos do esgoto da Zona Oeste do Rio, que além de não atacar sua dermatite, também colabora com o meio ambiente.
A concessionária Iguá, que atende os 18 bairros da região da cidade, destina todo o lodo de suas estações de tratamento para compostagem - cerca de 300 toneladas mensais que viram adubo orgânico. Quem cuida da transformação do resíduo é a empresa Organosolo, que tem como principais clientes agricultores dos estados do Rio, Espírito Santo e Minas Gerais.

De acordo com a Iguá, tudo começou em setembro do ano passado, quando a equipe começou a pensar em como ser mais sustentável com os resíduos provenientes do esgoto urbano. "O nosso DNA sempre teve uma busca pela sustentabilidade. Ano passado nos reunimos para pensar nas rotas que vão ajudar o meio ambiente, evitando emissão de CO2 e outros gases que podem contribuir pra poluição da atmosfera. Foi então que percebemos que percorríamos 85 quilômetros para destinar todo o lodo ao aterro sanitário", disse Ícaro Maltha, gerente de operações da empresa.

Ao perceber a longa distância e a alta emissão de CO2, a equipe pensou em dar outro destino ao lodo. "A gente começou a estudar na região o que teríamos de possibilidade de uma destinação ambientalmente correta. Não que o aterro não seja algo certo, mas ele também gera outros resíduos, como a queima de gás, então percebemos que a compostagem é muito mais limpa. Encontramos a empresa Organosolo e iniciamos as conversas. Em novembro findamos o contrato e passamos a transportar todo o nosso lodo, oriundo da ETE Barra da Tijuca (Estação de Tratamento de Esgoto) para eles", explicou Ícaro.

Segundo o gerente de operações, o adubo tratado pela Organosolo pode ser utilizado em diversas frentes de agricultura, seja com plantações de hortaliças ou reflorestamento, por exemplo: "É importante citar também que, nesse movimento, há uma redução da quilometragem rodada. Reduzimos 50 quilômetros de transporte, isso quer dizer que reduzimos a emissão de CO2 também".
Ele afirmou também que há um projeto para que até 2025, 75% de todo o lodo gerado nas operações sejam destinados, de alguma forma, ao reaproveitamento para terem o ciclo completo: "Pensamos em reingressar esse lodo em alguma frente nossa, como o reflorestamento mesmo ou até na compostagem".

Herlicia compra 600 sacos de adubo por ano e seu principal foco é a horta de seu sítio em Itaguaí. "Começamos a comprar da Organosolo há quatro anos. Antes, usávamos esterco bovino e de galinha, mas depois que conheci esse adubo orgânico, percebi o desenvolvimento das plantas e a melhora no meio ambiente. Também posso manusear sem luvas, pois não dá alergias", relatou.

A produtora rural cultiva alface, cheiro verde, repolho e vários outros tipos de folhagens, além de também ter amoras, goiabas e aipins: "Colocamos um pouco do adubo para as frutas e tivemos um resultado muito bom. Acreditamos que esse tipo de adubo é bom para as plantações e para o planeta também, por ser saudável".

A compostagem

Francisco Dantas, sócio-diretor da empresa Organosolo, explicou a importância do resíduo do esgoto ser destinado de forma adequada. "Normalmente, ele vai para o aterro sanitário, entrava junto com todos os outros resíduos, era aterrado e poluía o meio ambiente. A compostagem é a reciclagem da matéria orgânica, nada mais é do que a reutilização de um material. É um processo biológico, que pode ser feito com tudo, não apenas com alimentos como é mais conhecido", afirma.

De acordo com ele, a empresa recebe o lodo e faz a preparação da transformação desse resíduo, que é poluente e degrada o meio ambiente, em um composto orgânico, também conhecido como adubo: "O processo é algo natural e benéfico ao meio ambiente. Não tem patógenos ou contaminantes, pois há uma quebra das cadeias de carbono, transformando aquele lodo em um substrato para o solo. É bom para o reflorestamento, jardinagem e para a produção de alimentos".

Para Francisco, o processo é quase uma receita de bolo: a empresa mistura no lodo outros ingredientes ricos em carbono e madeira, galhos, para equilibrar e preparar a mistura até criar um cenário adequado para as bactérias se desenvolverem ali.
"Tem umidade, tem equilíbrio entre carbono e nitrogênio e ainda inserimos o que chamamos de biocatalizador, um produto próprio nosso que é tipo um coquetel de bactérias totalmente natural. Ao serem introduzidas nessa mistura do lodo com outros ingredientes, esses microorganismos que consomem o oxigênio começam a se reproduzir e se alimentar do resíduo, degradando-o. Como resultado dessa atividade, nasce o calor natural que pode chegar ate 70 graus. Esse calor fica retiro dentro da mistura por três meses. Com isso, há uma sanitização do produto", disse.

Por causa do calor, o adubo é liberado para plantações de legumes e frutas: "A gente segue mais ou menos a lógica de esterilização. Mas, também garantimos que não há contaminantes com provas laboratoriais que medem nível de coliformes fecais, salmonela que é super perigoso, entre outros. Seguimos o critério do ministério da agricultura para garantir que o produto é seguro para utilização humana".