- Comerciantes da Feira de São Cristóvão realizam um grande protesto, na manhã da terça-feira (02), contra a privatização do Centro Luiz Gonzaga de Tradições Nordestinas, onde acontece o famoso evento, em São Cristóvão. A caminhada, com centenas de comerciantes e funcionários, começou na própria Feira e percorreu ruas do pavilhão. Em seguida, o grupo caminhou até a porta da sede da prefeitura, na Cidade Nova, onde empunhou cartazes e gritou palavras de ordem.Reginaldo Pimenta / Agencia O Dia

Rio - Comerciantes da Feira de São Cristóvão realizam um grande protesto, na manhã da terça-feira (02), contra a privatização do Centro Luiz Gonzaga de Tradições Nordestinas, onde acontece o famoso evento, em São Cristóvão. A caminhada, com centenas de comerciantes e funcionários, começou na própria Feira e percorreu ruas do pavilhão. Em seguida, o grupo caminhou até a porta da sede da prefeitura, na Cidade Nova, onde empunhou cartazes e gritou palavras de ordem. A manifestação também conta com um carro de som tocando forró e outros ritmos típicos do Nordeste.
Há uma semana, um ato com as mesmas reivindicações já havia sido realizado. Lindalva de Moraes, feirante há mais de 20 anos, fala com indignação sobre a possível privatização. "A gente depende dessa feira para sobreviver, e eu não admito isso. Você [Eduardo Paes] tem que acabar com isso. Nós somos contra e isso dói muito no coração da gente", desabafa Lindalva. 
O objetivo da passeata, que também irá até a porta da Câmara Municipal, é pressionar o poder público e cobrar explicações da prefeitura sobre o edital de licitação, publicado no dia 20 de maio. Pelo documento, a empresa escolhida deverá gerir, por 35 anos, o tradicional polo nordestino.
Luiz Carlos Santos, presidente da comissão de feirantes, teme pela descaracterização do espaço cultural após a entrada de uma gestão privada. "Querem vender a nossa feira e tirar a característica nordestina. Com mais de 78 anos de tradição, isso é um desastre para mais de 5 mil famílias que tiram seu sustento daqui. Hoje, nós não sabemos para onde vamos”, afirma.
Procurada, a Companhia Carioca de Parcerias e Investimentos (CCPar) afirmou que o "Centro de Tradições Nordestinas Luiz Gonzaga não será privatizado e muito menos corre o risco de virar shopping". O órgão também ressalta que o edital de concessão garante a permanência da Feira de São Cristóvão como local de expressão da cultura nordestina e que os feirantes e artistas que atuam hoje no local terão preferência pela permanência.

Ainda de acordo com a CCPar, a empresa vencedora apenas fará a administração do espaço. Ou seja, o Município continuará sendo o proprietário do Pavilhão de São Cristóvão.
Maria da Guia, representante dos feirantes, afirma que a privatização irá afetar a cultura e a origem do povo nordestino. "Nesse momento estão querendo colocar nossa cultura no lixo e nós não vamos deixar. A Feira de São Cristóvão não está para negócio. A gente construiu esta feira e agora estão querendo nos expulsar. Lutem pela nossa origem", completa Maria, indignada. 
Transformações
O vencedor da licitação deverá investir R$ 97 milhões em intervenções durante dois anos e meio para renovar a estrutura do espaço. Ao todo, serão 82 mil m² de área revitalizada.

O secretário municipal de Coordenação Governamental do Rio, Jorge Arraes, afirma que a intenção é investir na feira para torná-la uma âncora cultural que integre o bairro ao Porto Maravilha.
"A ideia é manter os atuais comerciantes da feira e agregar outros tipos de uso vinculados à tradição nordestina. Seja do ponto de vista gastronômico ou do ponto de vista cultural. É uma área muito importante para a cidade no bairro de São Cristóvão que é como se fosse a expansão do Porto Maravilha, no sentido urbanístico, com a construção do Terminal Gentileza e a passagem do VLT para São Cristóvão", diz o secretário.

O presidente da Companhia Carioca de Parcerias e Investimentos (CCPar), Gustavo Guerrante, explica que o imóvel precisa de intervenções estruturais e reforça que os trabalhadores do local terão suas atividades de tradições mantidas e respeitadas ao longo do processo.

"É um ponto de encontro querido pelos cariocas e um importante centro de tradições da cultura nordestina no Rio. Hoje a infraestrutura erguida na década de 60 está precisando de grande modernização. Essa concessão trará os investimentos necessários sem dinheiro do tesouro e com as devidas garantias do poder público para a população que tira seu sustento dali", afirma Gustavo.
Inaugurado em 1962 como centro de convenções, o espaço já foi usado como barracão provisório das escolas de samba e, desde 2003, o rei do Baião, Luiz Gonzaga, deu nome ao Centro de Tradições Nordestinas. O local é famoso pela música regional, culinária, além de ser ponto de encontro dos amantes do karaokê.

A feira tem 31,7 mil m² de área construída e 29,8 mil m² de estacionamento. Ao todo, são cerca de 600 boxes e restaurantes, mas metade fechou durante o pior momento da pandemia de covid-19. Atualmente cerca de 150 mil pessoas visitam a Feira de São Cristóvão mensalmente.

"A venda da Feira Nordestina de São Cristóvão à iniciativa privada é um golpe duro contra nossa cultura e história. É um exemplo claro de como interesses comerciais estão prevalecendo sobre a preservação de nosso patrimônio cultural. É hora de reagir, de lutar pela preservação de nossas tradições, de defender a importância da cultura em nossas vidas. Não podemos permitir que nossos espaços culturais sejam transformados em meros negócios em nome do lucro. É preciso resistir e preservar nossa identidade cultural", protestou Maria da Guia.
*Reportagem do estagiário Leonardo Marchetti, sob supervisão de Raphael Perucci