O ator de teatro Bruno Muniz está à frente do retorno do Cine Joia, tradicional e único cinema de rua de CopacabanaMarcos Porto / Agência O Dia
"Por conta do fechamento do Roxy, essa região de Copacabana ficou sem atrativo nenhum. Como eu estava sempre aqui na sala ensaiando com grupos de teatro, algumas senhoras apareciam constantemente, perguntando quando a sala iria voltar a funcionar. Então falei com o proprietário, assumi o Cine Joia e voltei com o cinema, especificamente para atender a este grupo. Enxerguei esse potencial, o Joia tem um apelo muito nostálgico, faz parte da vida de quem vive em Copacabanal", revela Bruno, citando o histórico cinema do bairro, na esquina da Rua Bolívar com Av. Nossa Senhora de Copacabana, que fechou em 2021 e deverá ser reinaugurado em breve, mas como casa de shows.
Para o novo gestor, a reabertura do Cine Joia representa uma vitória para a cidade, pois mexe com a memória afetiva dos cariocas. "É mais do que cultura, é a história da população de Copacabana que é, em grande percentual, terceira idade. No dia em que reabrimos, uma senhora chegou, aos prantos, dizendo que foi aqui que ela conheceu o seu finado marido. Foi onde eles se beijaram pela primeira vez", conta Bruno.
Uma equipe apaixonada pela sétima arte, formada por cinco pessoas, contando com o Bruno, se desdobra para dar contra da administratação, do marketing, recepção e parte técnica. "Eu só tinha a sala com as cadeiras, nada mais", recorda Bruno, ao falar sobre o arrendamento do espaço, que é de propriedade do marchand Cláudio Valansi. O local estava sem projetor, equipamentos de luz e som, e ar-condicionado. Os planos, no entanto, eram muitos.
"É um caminho contrário esse que estamos fazendo. A cultura está acostumada a perder, no Brasil estamos acostumados a fechar. Perdeu, faliu, não deu, o teatro tal fechou, cinema tal encerrou... Então, quando vem algo na contramão, quando vem uma reabertura, acho que choca mais do que se estivesse anunciando um fechamento. O público e a classe artística estão super receptivos", comemora Bruno.
As 87 cadeiras de couro coloridas do cinema, marcas do Cine Joia, dão um clima ao mesmo tempo vanguardista e cult. O letreiro é outro destaque que deixa a fachada ainda mais chamosa. Em breve, uma pipoqueira com estilo vintage também passará a fazer parte do espaço.
A curadoria é feita por Bruno, com o suporte do proprietário, Claudio Valansi, e de professores de cinema da Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC), além de uma escuta geral com o público. Os filmes são escolhidos mensalmente.
É o caso dos amigos Alan Luiz Magalhães e Ana Carolina Martins, ambos de 18 anos, que foram ao Cine Joia, na última segunda-feira (5), ver o clássico "O Que Terá Acontecido com Baby Jane?", de 1962, com as icônicas atrizes Bette Davis e Joan Crawford. Eles não conheciam o espaço, mas decidiram conhecê-lo após a indicação de um amigo em comum.
Quem também esteve na sessão de "Baby Jane" foi a estudante de Cinema Lia Terry, 18, que não esconde a alegria com a "descoberta". "O Cine Joia tem uma programação diferente da que grande parte dos cinemas tem, e não é difícil para mim chegar em Copacabana. Eu gosto muito de filmes antigos. Aqui passam filmes que não estão passando em nenhum outro lugar. Eu já sabia do cinema, mas só vim após a reinauguração", conta Lia.
O aposentado Luiz Carlos Carvalho, 80, também festeja a retomada. “É muito importante a volta do cinema, pois exibe filmes antigos, que são muito bons e melhores do que os filmes de hoje em dia. Antigamente havia outros cinemas aqui em Copacabana, como o Roxy, mas agora está tudo certo. Temos o Cine Joia de volta".
A aposentada Vilma Fonseca, 76, faz coro. "O fechamento do cinema foi uma pena, pois moro aqui perto. Então, eu gostava muito, vinha sempre. São filmes diferenciados, do jeito que eu gosto. Esta é a segunda vez que eu venho desde que reabriu, estou gostando muito desta volta."
A professora aposentada Maria Clara Cascaes ressalta que a reabertura é um alento para os moradores do bairro. "Ah, o Cine Joia sempre foi uma joia em Copacabana. Essa volta é emocionante, uma excelente ideia! Aqui em Copa tem muito idoso, e é um cinema com preço acessível. Cinema está quase o preço de teatro", comenta, após pagar R$ 15. Já a partir dessa semana, as sessões de cinema serão gratuitas.
Apesar de contar somente com recursos próprios, Bruno pretende impulsionar o projeto aos poucos. A ajuda de parceiros também não é descartada. "É óbvio que se chegar apoio, até mesmo como a Lei Paulo Gustavo, é bem-vindo. Nós vamos pleitear as leis de auxílio até para podermos investir em mais melhorias no espaço, como dar um upgrade nos equipamentos, colocar carpete, apostar mais na parte estética do estabelecimento. Vamos focar em projetos de parceria, com a Secretaria Municipal de Cultura, para exibição de filmes e documentários aqui, e vamos também enquadrar o projeto em leis. Temos que agregar outros parceiros nesta caminhada, para devolvermos o Cine Joia à Copacabana em sua plenitude”, analisa Bruno, que completa. "Nem cogito a hipótese de fechar, isso nem passa pela minha cabeça."
A programação do Cine Teatro Joia está disponível no Instagram @novocinejoia
Uma relação antiga
Copacabana e o Cine Joia vivem um longo caso de amor, com direito a "términos" e "reconciliações". Fundado em 1969, o espaço foi comprado pela família Valansi em 1970, quando se chamava Cine Hora. Na época, não exibia filmes, apenas notícias e desenhos animados para as pessoas que faziam hora dentro da galeria onde está localizada a sala.
Em julho de 2021, o Joia foi alugado por um produtor gaúcho, que usou o espaço para cursos, agenciamentos e pequenas apresentações teatrais. Foi desta forma, ao alugar um horário para o seu grupo de teatro, que o ator Bruno Muniz esteve no espaço e viu de perto o interesse do público pelas sessões de cinema. Em seguida, fez uma proposta para o proprietário, já que a gestão anterior não pode seguir investindo no local.
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