Identificação da empresa suspeita foi divulgada nesta terça-feira (29) durante coletiva no prédio da CedaeBruno Kaiuca/Agência O Dia
Polícia e Inea identificam empresa suspeita por jogar substância que paralisou ETA do Guandu
A investigação encontrou o mesmo surfactante, composto presente em detergente, na Burn Indústria e Comércio LTDA; produto foi jogado no Rio Queimados
Rio - A Polícia Civil e o Instituto Estadual do Meio Ambiente (Inea) identificaram a empresa suspeita pelo despejo ilegal de surfactantes, compostos presentes em detergentes, que geraram a espuma branca e paralisaram por 14 horas o funcionamento da Estação de Tratamento de Água (ETA) do Guandu, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. O fato afetou a distribuição de água para oito cidades, incluindo a capital do estado e sete municípios da Baixada, e impactou 11 milhões de pessoas.
A informação foi divulgada na noite desta terça-feira (29) durante coletiva realizada no prédio da Companhia de Água e Esgoto do Rio (Cedae) na Cidade Nova, região central do Rio. Segundo os investigadores, houve coletas do material de diversas empresas produtoras de detergentes na região de Queimados, também na Baixada Fluminense, mas só a Burn Indústria e Comércio LTDA, localizada no Parque Industrial da cidade, mostrou compatibilidade com a substância encontrada na água até o momento.
Os agentes já haviam identificado que o despejo aconteceu no Rio Queimados, que possui uma extensão de 12,5 km e está localizado no mesmo município da empresa citada. Ele tem os rios Camorim e Abel, que também passam pela cidade, como seus formadores, além de fazer parte da Bacia do Rio Guandu, pertencente à Região Hidrográfica II do Rio de Janeiro. O Rio Queimados é um dos principais afluentes do Rio Guandu, localizado ao braço leste das águas que compõem a ETA.
De acordo com o governador em exercício Thiago Pampolha, a Burn não tinha licença para jogar afluentes no corpo hídrico. A empresa é autorizada pela Prefeitura de Queimados para produzir detergentes, mas foi embargada por causa desse despejo. Os agentes responsáveis pela investigação ainda pediram a interdição judicial da fábrica.
"A gente trata desde o início como crime ambiental. Agora, nós conseguimos detectar o autor desse crime. Ao longo desses dias, nossa equipe do Inea esteve visitando todas as empresas do distrito industrial de Queimados para poder identificar qualquer sinal que corroborasse com a espuma que foi verificada tanto na bacia antes da tomada d'água quanto ao longo do curso do rio Queimados e do rio Guandu. Nós identificamos algumas empresas que tinham perfil dentro da produção daquele tipo de componente químico. A gente concentrou as investigações nessas empresas e conseguimos identificar que a empresa Burn Indústria e Comércio, que é fabricante de sabão e detergente, tinha dentro de suas galerias de água fluviais uma vazão que não é comum", explicou Pampolha.
O governador em exercício ainda completou que tinha resquícios da mesma espuma encontrada na água da ETA. Houve um cruzamento do material coletado na estação de tratamento e também com as empresas. O resultado, segundo o governador em exercício, apontou que a empresa cometeu esse crime ambiental.
"Nós podemos dizer de forma assertiva que houve falta de perícia. Houve desconformidade com a legislação ambiental. Não há outro caminho se não apontá-lo como possíveis autores desse crime ambiental. É claro que o estado do Rio de Janeiro irá agir com todo rigor. Nós não admitiremos que esse crime aconteça e fique impune. Já houve o embargo por conta dessa desconformidade. Isso facilita nosso trabalho. Vamos agora com o Inea com o auto de infração para mensurar o dano e todas as questões técnicas para mensurar as multas que serão aplicadas. Nós vamos aplicar todos os agravantes que fizerem sentido e que a gente possa punir de forma exemplar na medida e na proporção sem cometer injustiças, mas dando o exemplo que o estado do Rio de Janeiro não pode aceitar esse tipo de crime ambiental de forma pacífica", completou.
A multa por causa do crime pode chegar a R$ 50 milhões. Responsáveis pela indústria já foram intimados para prestar depoimento e a empresa foi enquadrada pelo crime de poluição hídrica.
A investigação segue sendo comandada pela Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente (DPMA). Novas visitas estão marcadas para esta quarta-feira (30) em outras indústrias para saber se há outros culpados pelo crime ambiental.
"Tão logo que a Polícia Civil foi notificada do fato, foi instaurado inquérito na DPMA que apura a prática do crime de poluição hídrica. O delegado Wellington Vieira, diante dos elementos, está requerendo à Justiça a interdição das atividades produtivas da empresa. Já existe uma interdição administrativa, mas também está sendo buscada essa interdição pelo juízo criminal. Em breve, estarão sendo ouvidos os sócios e os diretores da empresa para que o delegado consiga o maior número de provas", explicou Fernando Albuquerque, secretário de Estado de Polícia Civil.
Empresa nega contaminação
Procurada, a Burn negou que haja relação entre a sua fábrica e a presença de material químico na bacia do Rio Guandu. Confira a nota na íntegra.
A Burn esclarece que não há nenhuma relação entre a sua fábrica de Queimados, na Baixada Fluminense, e a presença de material químico na bacia do Rio Guandu. A unidade opera com tecnologia de ponta e de padrão internacional, seguindo os mais rigorosos procedimentos de controle, onde o manuseio da matéria-prima é automatizado e em ambiente de circuito fechado, ou seja, sem qualquer escoamento ou ligação com a rede pluvial.
Além disso, tem todas as licenças necessárias e destinação ambientalmente correta de seus resíduos, estando sob monitoramento e controle permanentes dos órgãos ambientais competentes. Cabe ressaltar que a fábrica está a 11 quilômetros de distância do sistema do Guandu seguindo o fluxo do rio, e adota uma série de iniciativas sustentáveis, como sistema de reuso de água da chuva, iluminação por fontes renováveis e selo EU Reciclo. A empresa também contratou laboratório especializado para coleta e análise da água e está colaborando com as investigações, à disposição das autoridades.
Relembre a paralisação
A ETA do Guandu, em Nova Iguaçu, voltou a operar com 100% da capacidade na madrugada desta terça-feira (29) depois do serviço de captação de água ser interrompido por 14 horas por conta da presença dos surfactantes, composto presente em detergentes, que provocou uma espuma branca no Rio Guandu.
A Cedae retomou a produção de água ainda na noite desta segunda-feira (28), mas a captação de água só foi totalmente normalizada às 4h17 desta terça-feira (29). De acordo com a companhia, a água com a substância não foi, em momento algum, distribuída para a população. Assim que os técnicos constataram a presença do composto, a captação foi interrompida e a água que estava no interior da estação foi descartada.
Apesar da retomada da operação na ETA, o abastecimento pode levar até 72 horas para ser normalizado nos oito municípios, incluindo a capital do estado e sete cidades da Baixada Fluminense, atendidos pelo Sistema Guandu, que é responsável por 80% da água potável da capital e Região Metropolitana. A interrupção afetou 11 milhões de pessoas.
Por conta do impacto no abastecimento, a Secretaria de Estado de Educação informou que, nesta terça-feira (29), o Colégio Estadual Rodrigo Otávio Filho, em Vaz Lobo, na Zona Norte, teve aulas em horário parcial. Segundo a Secretaria Municipal de Educação, as unidades da rede funcionaram normalmente no dia da paralisação, mas, nesta terça-feira (29), devido ao tempo necessário para a completa normalização do abastecimento, oito escolas ficaram fechadas e outras 26 tiveram funcionamento parcial.
A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) divulgou um comunicado informando que, devido à perspectiva de retorno gradual do abastecimento na capital e na Baixada Fluminense, a Reitoria decidiu pela suspensão das aulas nas unidades do Rio e de Duque de Caxias. A Universidade Federal do Estado do Rio (Unirio) também não teve atividades em todos os campi, nos turnos da tarde e noite. "Apenas os procedimentos de heteroidentificação do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), agendados para hoje e amanhã, estão mantidos".
Segundo a Águas do Rio, com o processo de normalização acontecendo de forma gradual, ainda há falta d'água em diversos pontos da região sob influência da ETA, que compreende mais de 300 bairros e sub-bairros das cidades do Rio, Nova Iguaçu, Nilópolis, Duque de Caxias, São João de Meriti, Belford Roxo, Queimados e Mesquita, principalmente pontas de rede e áreas mais elevadas.
A Rio+Saneamento informou que voltou a abastecer, desde o final da noite de ontem, os 21 bairros da Zona Oeste atendidos pela empresa, mas algumas localidades ainda podem sentir o impacto. "A concessionária orienta aos consumidores que utilizem água de forma consciente e adiem tarefas não essenciais ou que exijam grande consumo de água até a efetiva normalização do sistema".
Em nota, a Iguá disse que após o restabelecimento da ETA Guandu, o fornecimento de água começou a ser gradativamente retomado na madrugada desta terça-feira (29), mas os 18 bairros da capital fluminense atendidos por ela ainda sofrem impacto. A empresa esclarece que, até que a operação seja totalmente reestabelecida, pode haver intercorrências, incluindo baixa pressão e falta d’água.
"A concessionária reforça a necessidade de consumo consciente da água durante esse período (...) A Iguá lamenta quaisquer transtornos causados e, caso necessário, disponibilizará caminhões-pipa para locais emergenciais como hospitais, clínicas e UPAs, entre outros".
Às 18h desta terça-feira (29), a Iguá informou que o abastecimento, sobretudo nas partes baixas dos bairros Praça Seca (atendido parcialmente pela concessionária), Taquara, Tanque, Pechincha, Anil, Freguesia, Vargem Pequena e Curicica, já está sendo restabelecido gradativamente.
O fornecimento de água ainda sofre impacto nos bairros Barra da Tijuca, Recreio, Vargem Grande, Vargem Pequena e nas partes altas de Taquara, Pechincha, Freguesia, Tanque, Curicica, Anil e Jacarepaguá.
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