Assim, totalmente sem jeito para sombras e corretivos, sigo exercitando o meu pensamento para delinear caminhos e iluminar outros cuidadosArte: Paulo Márcio

Já passava das 23h de uma terça-feira. Foi quando tive tempo para me sentir incomodada com duas espinhas que resolveram aparecer no rosto. Ri sozinha e me senti uma adolescente. Recorri ao sabonete líquido em forma de amostra grátis que havia trazido de uma consulta com a dermatologista quase dois meses antes. Sou relapsa com os cuidados para a pele, mas ainda quero sair bem nas fotos. Aliás, quem me conhece sabe que amo um clique, só que realmente nunca fui afeita aos rituais de cuidados.
Foi aí que me lembrei de um creme que havia encomendado em uma farmácia de manipulação, receitado pela mesma médica. O cosmético ainda estava na geladeira do jeitinho que eu o recebi: com a embalagem lacrada. Conferi a sua data de fabricação e a de validade. Ainda estava no prazo! Estava um bom tempo ali, sem ser utilizado. Resolvi, então, que era o momento de sua estreia. Mas o fato é que entendo pouco ou quase nada de skincare ou maquiagem. Até já ganhei pincéis e outros itens e simplesmente não sei usá-los.
Assim, sigo totalmente sem jeito para sombras e corretivos, mas continuo exercitando o meu pensamento para delinear caminhos e iluminar outros cuidados. Quanto mais me conheço, mais entendo os sinais que a minha emoção desperta. São sutis. E descobri que não existe creme para cicatrizá-los. Penso também que é incrível envelhecer, carregar uma bagagem cada vez maior de memórias e, ainda assim, se sentir mais leve. Um peso que as balanças tradicionais não podem medir.
De volta às espinhas, lembro que elas seguiam evidentes na manhã do dia seguinte — pelo menos para mim. Antes de ir à aula de pilates, ainda recorri ao filtro solar com base na tentativa de escondê-las. Não camuflou muito. Tanto que, dirigindo no caminho para o estúdio, parei algumas vezes no trânsito e olhei pelo retrovisor do carro, percebendo as espinhas. Como não notá-las? É incrível como a gente se incomoda com certas miudezas. No entanto, ninguém no estúdio comentou nada.
Acompanhada dos meus pensamentos, imaginei que, se fosse na época do colégio, eu teria a certeza de que todos estariam reparando no meu rosto. Lembro, inclusive, de uma história da juventude quando saí de Caxias, na Baixada, rumo a Rio das Ostras, na Região dos Lagos. Naquele dia, cismei que estava com olheiras e desisti de ir à rua à noite para a tradicional paquera da adolescência. Tolice a minha. Hoje sei que na juventude tudo é mesmo gigante. Mas a gente cresce e percebe que nossas reais imensidões são outras. E não podem ser maquiadas.