Monumento a Estácio de Sá, no Aterro do Flamengo, aponta para o Morro Cara de Cão, onde cidade foi fundada Reginaldo Pimenta / Agencia O Dia
O militar Estácio de Sá foi chamado pelo tio, o terceiro governador-geral do Brasil, Mem de Sá, para ajudar no combate contra os invasores franceses que estavam na cidade do Rio de Janeiro com o apoio dos indígenas Tupinambás, explica o historiador Rafael Mattoso. "Estácio de Sá vem para cá, um fidalgo português jovem, e ao chegar, ele tem que fazer um rito simbólico para mostrar que os portugueses estavam retomando a cidade. Ele fez no dia 1º de março de 1565 o ato de fundação do Rio de Janeiro", diz Mattoso.
Na fundação, Estácio de Sá instalou uma porta simbólica aos pés do Morro Cara de Cão, na qual bateu e abriu para simbolizar a efetiva ocupação do território, explica o historiador. No entanto, este marco foi só o início da disputa entre os europeus aliados a povos indígenas locais pelo domínio do Rio de Janeiro.
"É esse o ato simbólico que a gente comemora no dia 1º de março. Mas, a cidade foi fundada só para constar porque os franceses não tinham sido expulsos em função disso. Inicia-se uma guerra muito intensa entre portugueses e franceses", explica Rafael Mattoso. "Para conseguir bater de frente com os franceses que estavam aliados aos Tamoios, os portugueses tiveram que buscar ajuda dos Temiminós, inimigos dos Tamoios", continua Rafael Mattoso. Uma das principais lideranças Temiminós, era o cacique Arariboia, que aceitou se juntar a Estácio de Sá na batalha.
A vitória dos portugueses e Temiminós sobre franceses e Tamoios consolidou-se dois anos depois, em de 20 de janeiro, dia do padroeiro São Sebastião, e feriado comemorado atualmente na cidade. "Muitas vezes confunde-se o dia 20 de janeiro com o 1º março, dia da fundação, porque são dois episódios feitos pelo mesmo personagem histórico, Estácio de Sá", avalia Mattoso.
Dois anos após a chegada do militar português, no dia 20 de janeiro de 1567, aconteceu a batalha mais decisiva para a conquista definitiva dos portugueses. "Aí sim, houve a garantia da fundação da cidade", explica o historiador. Trata-se da Batalha das Canoas também conhecida como Batalha do Uruçumirim, como era chamada aquela região das praias da Glória e do Flamengo.
"Nessa batalha, tem um ato simbólico. Os portugueses estavam perdendo e de repente um canhão português estourou. Relata-se que saiu uma fumaça branca e os inimigos dos portugueses, os indígenas Tamoios, viram nessa fumaça a imagem de um guerreiro vindo contra eles. Criou-se a ideia de que esse guerreiro era São Sebastião, que tinha sido escolhido como padroeiro da cidade do Rio de Janeiro quando a primeira expedição portuguesa chegou aqui em 1502", acrescenta Mattoso.
Estácio de Sá morreu na Batalha do Uruçumirim, atingido por uma flecha envenenada no olho. Quem passou a liderar a vitória foi Arariboia. Do outro lado da disputa, centenas de Tamoios, liderados por Aimberê, e cinco franceses foram mortos. "Tem todo esse sincretismo desses dois episódios 1º de março e 20 de janeiro, que marca o dia do padroeiro e da Batalha de Uruçumirim", resume o historiador.
Força do dia 20 de janeiro
O professor de História da Uerj e da UFF, Marcus Dezemone, ressalta que a data 20 de janeiro ganhou mais destaque para os cariocas por conta da força da religião católica até o Século XIX no Brasil, período em que houve uma junção entre o Estado monárquico português e a Igreja.
"Até o século dezenove existiu o regime do Padroado. Os reis de Portugal e depois os imperadores, a partir de 1822, eram responsáveis pela expansão da religião no Brasil. Tinham a atribuição de nomear bispos, por exemplo. Por isso as festas católicas eram tão importantes. O 20 de janeiro até hoje é feriado e marcado por uma grande festa, uma vez que a cidade é consagrada a São Sebastião", ressalta Dezemone.
Já 1º de março, é a data de fundação da cidade na fortificação para proteger o território. "Não é feriado porque não tem festa religiosa", explica o professor de História da Uerj e da UFF.
Por causa das religiões, o dia 20 de janeiro ganha protagonismo no calendário da cidade, por ser o dia do santo padroeiro. "Esse santo é sincretizado como um guerreiro, caçador, Oxóssi, nas religiões de matriz africana. Um guerreiro indígena caçador, então tem toda essa relação religiosa com a data", acrescenta Mattoso.
Quem institucionalizou que o aniversário do Rio seria em 1º de março e não no dia 20 de janeiro foi o governador do então estado da Guanabara, Carlos Lacerda, em 1º de março de 1965.
Nome da cidade
O primeiro contato dos portugueses com a atual cidade do Rio de Janeiro deu-se em janeiro de 1502, quando uma expedição portuguesa avistou a Baía de Guanabara. "Por se assemelhar ao Rio Tejo, chamaram de Rio de Janeiro. A fundação só acontece 1565, numa época em que os portugueses ainda não haviam consolidado a presença no litoral brasileiro", explica o professor de História da Uerj e da UFF Marcus Dezemone. No período, o litoral brasileiro despertava a cobiça de potências europeias, como franceses protestantes. "A Igreja Católica havia sofrido a Revolta Protestante, e franceses protestantes huguenotes estabeleceram na região do Rio de Janeiro a colônia França Antártica", ensina Dezemone. A colônia francesa foi destituída em seguida pelos portugueses no processo de fundação da cidade do Rio de Janeiro.
O nome São Sebastião do Rio de Janeiro homenageia, além do padroeiro, o rei de Portugal daquele tempo, Dom Sebastião. "Faz referência a Dom Sebastião, o rei português que desapareceu, dando início ao Sebastianismo, e ao padroeiro", lembra o professor Dezemone.
Outros marcos de 1º de março
Além da fundação simbólica da cidade do Rio, 1º de março também marca o dia em que o Brasil venceu, oficialmente, a Guerra do Paraguai, em 1870. "Por isso a gente tem uma rua no Centro chamada Primeiro de Março", diz Rafael Mattoso.
Lápide e monumento a Estácio de Sá
Estácio de Sá foi enterrado no Morro Cara de Cão, depois teve o túmulo transferido para o Morro do Castelo, que por sua vez foi demolido, fazendo com que os restos mortais do fundador português fossem transferidos para a Igreja dos Capuchinhos, na Tijuca, onde está até hoje.
Nos anos 1970, quando se construiu no Aterro do Flamengo o monumento em homenagem a Estácio de Sá, quiseram transferir os restos mortais para lá, mas a Igreja reivindicou a permanência da lápide nos Capuchinhos.
Em forma de pirâmide, o monumento tem uma das pontas voltada para o Morro Cara de Cão, onde a cidade foi fundada, outra para o Morro do Castelo, onde começou a ocupação urbana do Rio de Janeiro e a terceira ponta na direção de expansão da cidade.
Programação
Para celebrar os 459 anos do Rio, será realizado um ato cívico-religioso no Cristo Redentor, que começará às 8h nesta sexta-feira (1) com a execução do Hino Nacional Brasileiro e do Hino da Cidade do Rio de Janeiro pela Banda da Guarda Municipal. Em seguida, haverá a missa em Ação de Graças pelo aniversário, presidida pelo arcebispo do Rio, Cardeal Orani João Tempesta, com a presença do prefeito Eduardo Paes.
Após a celebração, haverá o bolo comemorativo dos 459 anos do Rio e a entrega do troféu "O Mais Carioca de Todos", produzidos pela Sociedade Amigos da Rua da Carioca e Adjacências (Sarca).
"Somos gratos a Deus por tantas bênçãos derramadas sobre o Rio de Janeiro e pedimos que abençoe esta nossa terra, cercada de belezas naturais, e esta nossa gente, iluminando os governantes, para que sempre haja paz e prosperidade nesta cidade e ela continue sendo maravilhosa", declara o reitor do Santuário Arquidiocesano Cristo Redentor, Padre Omar.
Já o Museu do Amanhã vai promover um passeio de bicicleta às 9h no sábado (2), na atividade "Museu na Rua". O projeto vai percorrer ruas que já foram rios para mergulhar na história de fundação da cidade. Os 71 inscritos - as vagas estão esgotadas - vão fazer um percurso de 11 km desde o Museu do Amanhã até o Monumento a Estácio de Sá.
"Essa visita foi pensada para a data do aniversário da cidade. Vamos partir da ideia de que os corpos hídricos foram importantes para a fundação e estabelecimento da cidade e passar por alguns desses pontos na Praça XV, no Largo da Carioca, Outeiro da Glória até chegar na foz do Rio Carioca, na Praia do Flamengo", explica a coordenadora de Educação do Museu do Amanhã, Laís Daflon. Esta será a primeira de quatro edições realizadas no ano. As próximas atividades do Museu na Rua serão divulgadas nas redes sociais do museu.
Na Zona Sul, na Gávea, o Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro (MHC) recebe às 10h do domingo (3) o encontro literário com a autora do "Rio do meu tio" em comemoração ao aniversário da cidade. A Editora SM Educação preparou a atividade gratuita com a autora Lucia Fidalgo, que terá oficina de escrita criativa, bate-papo e sessão de autógrafos.
O projeto Música na Praça, organizado pelo Point Carioca Feiras, também estará no MHC no final de semana, 2 e 3 de março, celebrando o aniversário com arte, música, economia criativa e gastronomia. No sábado (2) haverá oficina de percussão gratuita e roda de samba ao vivo. A programação é grátis e de classificação livre.
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