Cláudia Ferreira morreu depois de ser baleada em 2014 e ser arrastada por uma viatura da PMReprodução

Rio - Após a absolvição de seis policiais militares envolvidos na morte da auxiliar de serviços gerais Cláudia Silva Ferreira, o gesseiro Júlio César da Silva, irmão da vítima, disse que a decisão da Justiça traz um sentimento de "covardia e injustiça". Cláudia morreu depois de ser baleada, em 2014, no Morro da Congonha, em Madureira, na Zona Norte. Ela ainda teve o corpo arrastado por cerca de 300 metros pela viatura dos agentes.
Ao DIA, Júlio disse que já imaginava sobre a decisão de absolvição, feita pelo juiz Alexandre Abrahão Dias Teixeira do Tribunal de Justiça do Estado do Rio (TJRJ) no dia 22 de fevereiro. Segundo o gesseiro, a família já havia sido avisada pelo Estado que o processo não ia dar em nada.
"Já tinham falado para a gente que não ia dar em nada. Que a gente poderia mover qualquer ação contra o Estado e que eles iam recorrer quantas vezes fosse possível. O tempo foi passando e a gente foi vendo que foi se concretizando o que falaram. Tudo ia se arrastar para no final absolver todo mundo e mostrar a gente como errado como se tivéssemos culpa de alguma coisa. Nós que não temos dinheiro caímos no esquecimento. Infelizmente, é dessa forma", disse.
O magistrado entendeu que os policiais agiram em legítima defesa, uma vez que Cláudia foi baleada em uma troca de tiros entre os PMs e traficantes. A bala que atingiu a vítima não conseguiu ser recuperada para que fosse comprovada que saiu da arma de um dos policiais. "Diante do conjunto probatório existente nos autos, infere-se que os acusados agiram em legítima defesa", escreveu o juiz na sentença.
Júlio reclamou da justificativa. O gesseiro disse que a irmã estava com um café e um cigarro na mão quando foi atingida. Ainda de acordo com ele, o julgamento foi feito sem a presença de familiares. 
"Foi legítima defesa porque ela ia atirar um copo de café neles e o cigarro. Eles se sentiam ameaçados, só pode. O mais absurdo é o juiz decidir isso. Eles fazem o julgamento com ninguém da família presente. Foi um julgamento que aconteceu que a gente nem sabe quem estava lá. Sentimento de covardia e de injustiça. O Estado age assim, fazer o que? A gente tem que ver e ouvir calado. Para o pobre, nunca vai dar em nada. Todo dia eles estão matando morador, criança, idoso e nada muda. Não tem impunidade para eles", completou o gesseiro.
Danos morais
O advogado João Tancredo, que representou familiares de Cláudia na esfera cível por indenizações, também contestou a decisão do juiz que inocentou os agentes. Tancredo ajudou a família em processos por danos morais, mas também não ficou satisfeito com o resultado.
"A indenização não foi nada satisfatória. O Alexandre e os filhos fizeram um acordo extremamente lesivo, forçados pela Secretaria de Direitos Humanos da época, então governo do Pezão. Fizeram um acordo muito ruim, não orientado por nós. Entramos com uma ação da mãe e dos irmãos. A mãe fez um acordo de 50 mil pela Defensoria Pública e os irmãos a justiça concedeu 50 mil para cada um por dano moral. Uma quantia irrisória pela gravidade do fato. Neste caso, a família foi arrasada. Perde a Claudia de maneira violenta e a família recebe uma ninharia de indenização. Na parte criminal a absolvição foi repugnante. Tanto na parte cível como criminal, os resultados trazem o sentimento de impunidade e revolta", disse em nota.
Absolvição
Na decisão, concedida no dia 22 de fevereiro, o juiz Alexandre Teixeira absolveu os PMs Rodrigo Medeiros Boaventura, Zaqueu de Jesus Pereira Bueno, Adir Serrano Machado, Alex Sandro da Silva Alves, Rodney Miguel Archanjo e Gustavo Ribeiro Meirelles.
Rodrigo Medeiros e Zaqueu Bueno foram julgados por homicídio, por terem atirado em Cláudia. Já Adir, Alex Sandro, Rodney e Gustavo, por fraude processual. Eles teriam removido o corpo da cena do crime.
Sobre a remoção do corpo, o juiz entendeu que Cláudia foi colocada na viatura em uma tentativa de socorro. Nos depoimentos, PMs alegaram que acreditavam que a vítima mantinha sinais vitais e afirmaram que os moradores dificultaram a ação de socorro.
A Justiça manteve o pedido de prisão preventiva de Ronald Felipe dos Santos, também acusado. Ele é apontado como um dos criminosos que trocaram tiros com os agentes e está foragido.
O que dizem os depoimentos
Além de agentes da Polícia Militar, a enfermeira Danusa de Souza Ramos, que estava de plantão no Hospital Estadual Carlos Chagas, para onde a vítima foi levada após ser baleada, e a atendeu, também foi ouvida. Ela disse que, ao retirar Cláudia da viatura, pareceu que ela ainda tinha movimento torácico. Mas na sala de trauma, perceberam que ela já estava sem os sinais vitais. "Ela chegou ao hospital dentro da viatura. Naquele momento não percebemos que ela estava morta. Achávamos que ela poderia estar viva", declarou.
O policial Paulo Henrique Nunes afirmou que após o confronto entre os policiais e criminosos, permaneceu no local, onde havia um traficante morto. "Não presenciei o momento em que Cláudia foi socorrida. Acompanhei apenas a perícia no local do óbito do criminoso". Ainda segundo ele, o motivo da operação foi combater o tráfico de drogas existente na comunidade, que é dominada pela facção do Comando Vermelho.
Já Rodrigo Boaventura, um dos acusados, disse que viu Cláudia caída no chão após um confronto com os suspeitos. "Tivemos que adentrar a região com cuidado, dada a pouca visibilidade. Iniciou-se um confronto com diversos criminosos. Após o cessar fogo e a evasão dos criminosos, vi Cláudia caída ao chão. Imediatamente determinei o socorro dela na viatura. Não esperei a chegada da ambulância porque havia risco de novo confronto armado e era necessário socorrê-la rapidamente.", justificou.
Zaqueu de Jesus, outro acusado por atirar na vítima, disse que Cláudia não estava na linha de tiro. "Ela foi encontrada na rua, perto de uma curva e do mato. Ela ainda tinha sinais vitais. Pouco tempo depois populares apareceram no local e iniciou-se um grande tumulto", destacou.