Família de Moïse Mugenyi Kabagambe levaram a bandeira do Congo e camisas com foto do jovem assassinadoPedro Teixeira/Agência O Dia

Rio - A família de Moïse Mugenyi Kabagambe, de 24 anos, se emocionou ao assistir ao vídeo em que o congolês aparece sendo espancado até a morte. O registro foi exibido nesta quinta-feira (13) durante o depoimento da primeira testemunha no júri popular de Fábio Pirineus da Silva, conhecido como "Belo", e Aleson Cristiano de Oliveira Fonseca, o "Dezenove", dois dos acusados pelo crime.
Do lado de fora da sala onde acontecia o julgamento, o irmão mais velho do congolês, Maurice Magbo, de 29 anos, pediu a condenação de todos os envolvidos no espancamento. "A família espera que eles paguem pelo que fizeram. Isso o que fizeram não é atitude de ser humano", desabafou Maurice. Familiares levaram a bandeira do Congo e camisas com a foto do jovem.
Estava previsto o depoimento de 23 testemunhas, entre defesa e acusação, porém somente seis foram ouvidas. As demais foram liberadas. O primeiro a falar foi o gerente do quiosque Tropicália, Jailton Pereira Campos, conhecido como "Baixinho". Foi com ele que Moïse se desentendeu antes de ser morto pelos agressores. Durante o depoimento, Jailton foi questionado pela promotoria sobre a dinâmica dos fatos e justificou a falta de um pedido de socorro para o congolês.

"Na ocasião, eu estava sem telefone. Com tudo que passei, nem pensei em ligar", disse o gerente, que também se referiu ao episódio como um momento "traumático". Nesse momento, familiares e amigos de Moïse, que acompanhavam o júri, demonstraram revolta. Em resposta a outra pergunta da promotoria, Jailton justificou por que pegou uma faca durante a confusão com o congolês, que, segundo ele, queria levar mercadorias do quiosque sem pagar.

"Peguei porque tive medo. Não ia conseguir me defender. Teve um momento em que ele pegou um espeto no balcão e quase enfiou em mim, no meu pescoço", disse. As imagens das câmeras, exibidas durante o depoimento, mostram que Moïse se aproxima do balcão do quiosque, pega o espeto de comandas e faz movimentos em direção ao gerente. Contudo, ele não chega a tocá-lo.

Após a exibição das imagens e os questionamentos da defesa, a promotoria voltou a perguntar sobre a suposta "ameaça" citada por Jailton. Em resposta, ele voltou atrás e afirmou que apenas se sentiu ameaçado naquele momento. 
O segundo a depor foi o vigilante Maicon Rodrigues Gomes. No dia do crime, ele aparece nas imagens pedindo para Fábio, Aleson e Brendon pararem de agredir Moïse. Questionado pela promotoria sobre a crueldade das agressões, Maicon afirmou em depoimento: "a nossa intenção era pegar o Moïse, amarrá-lo e chamar a polícia. A intenção do grupo era essa, mostrar o vídeo para o dono do quiosque, provando que ele estava querendo roubar."
Em seguida, foi a vez de Carlos Fábio da Silva Muse, dono do quiosque Tropicália, falar. Durante o depoimento, foram reproduzidos os áudios de Belo enviados após o crime. Na mensagem, ele pergunta sobre as imagens do quiosque e diz que seu "carão vai aparecer na filmagem". Carlos também negou que Moïse fosse de causar confusão, mas confirmou que ele parecia estar alterado no dia em que foi morto. Ao fim, o dono do estabelecimento negou que houvesse qualquer dívida com o congolês.
A quarta testemunha de acusação a falar foi Viviane de Mattos Faria, responsável pelo quiosque vizinho ao Tropicália, o Biruta. Durante a sua fala, a testemunha entrou em contradição. Inicialmente ela afirmou ter ouvido gritos vindo da área externa do Tropicália, no momento em que o congolês era agredido. Contudo, no depoimento de hoje ela disse que ouviu na verdade um falatório, como se fossem pessoas brigando.
Durante o júri, Viviane disse ainda que ouviu a história de que Moïse estaria descontrolado por ter perdido uma companheira e o seu filho durante o parto. A família, contudo, desconhece essa história e nega que ele tivesse namorada.
Relembre o caso
Moïse, que entrou no Brasil como refugiado, em 2011, teve as mãos e os pés amarrados e foi espancado com um porrete de madeira até a morte. Segundo a denúncia do Ministério Público do Rio (MPRJ), Belo agrediu o jovem com o objeto. Já Dezenove deu continuidade às agressões. Ambos estão presos desde 2022.
O motivo do ataque contra o jovem, conforme investigação da Polícia Civil, foi um desentendimento após o congolês cobrar valores de duas diárias de trabalho no quiosque. Os acusados alegaram na época que o ataque teria começado após o congolês, supostamente embriagado, tentar pegar uma cerveja da geladeira do Tropicália, quiosque de onde havia sido dispensado cinco dias antes, depois de beber durante o serviço.