Por bruno.dutra

Rio - A crise na siderurgia brasileira chegou ao setor de reciclagem de aço, que vem buscando o mercado internacional como alternativa à escassez de clientes no Brasil. Segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), as exportações de sucata ferrosa dispararam nos últimos três meses, atingindo o volume recorde de 87,4 mil toneladas em setembro, volume 90% superior ao registrado no mesmo período do ano passado. Em outubro, foram 76 mil toneladas, alta de 50% na mesma base de comparação. As exportações de aço, por outro lado, vêm registrando queda no ano.

“A baixa demanda por parte de produtos longos da siderurgia, que são os principais consumidores de sucata, acarretou queda na demanda e, consequentemente, acarretou queda nos preços”, diz Marcos Fonseca, presidente do Instituto Nacional das Empresas de Sucata de Ferro e Aço (Inesfa). O cenário de crise se intensificou a partir de junho, diz o executivo, com a desaceleração do segmento de construção civil, que vinha mantendo a demanda por aços longos no país, agravando uma situação que já era ruim entre os produtores de aços planos — impactados pela retração da indústria automobilística.

“No segundo semestre, a Usiminas e a CST (Companhia Siderúrgica de Tubarão) praticamente não compraram sucata. A CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) comprou muito pouco”, conta Fonseca. Recolhida em indústrias que têm o aço como insumo e entre rejeitos de eletrodomésticos, a sucata ferrosa é processada por empresas especializadas e revendida a siderúrgicas para a produção de aço em alto-fornos elétricos. Com o crescimento da renda, a geração de sucata ferrosa tem crescido de forma acelerada no Brasil nos últimos anos. Em 2012, último dado disponível, a geração de sucata ferrosa no Brasil atingiu 2,86 milhões de toneladas — quase 30% a mais do que em 2009, ano em que foram iniciadas as exportações do segmento.

Embora menos lucrativa, a opção pelo mercado internacional foi a alternativa encontrada pelas empresas do segmento para driblar a crise do setor siderúrgico, provocada pela retração na demanda global após a crise financeira de 2008 e agravada pela perda de competitividade da produção nacional com relação aos concorrentes internacionais. Entre janeiro e setembro deste ano, por exemplo, a produção nacional de aço bruto caiu 1,3%, mantendo tendência de retração verificada desde o início da década. Já a produção de laminados teve queda de 5%, segundo dados do Instituto Aço Brasil.

As exportações são menos lucrativas, mas vêm sendo encaradas pelas empresas do setor como saída para evitar acúmulo de estoques. “Ainda bem que temos as exportações”, diz Valentin Aparicio Escamilla, proprietário da empresa Apariciofer. “De 2009 para cá, saíram do país cerca de 1,7 milhão de toneladas. Se não fosse o mercado externo, esse volume de sucata ficaria jogado por aí”, comenta. Segundo ele, a participação da chamada sucata de obsolescência, que identifica os rejeitos gerados pela substituição de eletrodomésticos, hoje é responsável por 46% da geração de sucata ferrosa no país — o restante representa a sucata industrial.

O preço de venda no mercado externo, porém, tem um deságio de R$ 100 por tonelada, referente aos custos logísticos para transportar o produto. Segundo a Inesfa, os principais mercados para a sucata brasileira são Indonésia, Índia, Coreia do Sul, Paquistão, Vietnã e Bangladesh. Maior importador mundial, a Turquia recebe apenas o produto em navios — as exportações brasileiras são feitas em contêineres, por falta de estrutura nos portos. “Este é um dos entraves do setor: não temos estrutura portuária. Os portos que têm espaço são mais distantes e o frete rodoviário inviabiliza seu uso”, afirma Fonseca.

A expectativa do segmento é que 2015 mantenha o mesmo ritmo deste segundo semestre, com baixa demanda interna e dificuldades no setor siderúrgico. “Se não vier alguma medida por parte do governo para desonerar setor siderúrgico, o cenário deve se manter. Até porque, vamos ter aumento no custo de energia elétrica, que é um consumível importante para a siderurgia”, comenta o executivo. Clientes e fornecedores andaram em pé de guerra no início da década, quando as siderúrgicas começaram a questionar as exportações brasileiras de sucata, alegando que se destinavam a países com restrições às vendas externas dos mesmos produtos.

O tema saiu da pauta do setor siderúrgico que, em agosto, durante o 25º Congresso Brasileiro do Aço, elencou uma série de desafios e propostas para lidar com o “persistente processo de desindustrialização no país e com o aumento expressivo das importações de aço e de bens intensivos em aço”. “Para a solução estrutural desses problemas, é necessária a correção efetiva das assimetrias competitivas apontadas, ajuste cambial, o aumento significativo dos investimentos do país, particularmente em projetos de infraestrutura, o que se espera possa ser implementado ao longo dos próximos anos”, diz carta divulgada pelo setor ao final do encontro.

No curto prazo, pedem medidas como um programa de renovação da frota de caminhões, a revisão dos regimes especiais de importação e a efetiva implementação das normas de conteúdo local, entre outras medidas. “A indústria do aço vem perdendo competitividade nos mercados interno e externo, devido ao câmbio sobrevalorizado, carga tributária elevada e cumulatividade de impostos, deficiências de infraestrutura e logística precárias e onerosas, aumento dos custos de energia e da mão de obra, entre outros”, conclui o texto.

Você pode gostar