Por bruno.dutra

Rio - Enquanto o governo federal enfrenta uma batalha com Congresso, centrais sindicais e empresários para aprovar um pacote de ajuste fiscal centrado em desonerações e contingenciamentos, governos estaduais por todo o Brasil começam a cortar na própria carne para sobreviver ao cenário econômico adverso. Levantamento feito pelo Brasil Econômico aponta que pelo menos 15 dos 27 estados brasileiros já detalharam medidas para cortar despesas, em um processo que deve resultar em máquinas administrativas mais enxutas. Ontem, foi a vez do governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, convocar entrevista coletiva para anunciar seu pacote contra a crise.

“Vamos trabalhar para equilibrar as contas”, afirmou Pimentel, após anunciar um déficit de R$ 6 bilhões no orçamento de 2015. “Nossa obrigação é trabalhar para reduzir ou otimizar as despesas e ampliar as receitas dentro do que for possível, articulando investimentos das estatais, do próprio governo, das operações de crédito e dando melhor uso a cada centavo”, completou o secretário de Planejamento e Gestão, Helvécio Magalhães, sem antecipar as medidas que serão tomadas. Minas segue o exemplo de outros estados que optaram por otimizar os gastos diante dos déficits orçamentários — em 2014, o rombo na conta dos governos estaduais totalizou a R$ 13,3 bilhões.

Os primeiros impactos dessa estratégia são sentidos por ocupantes de cargos comissionados, que estão sendo reduzidos na maior parte dos estados que anunciaram pacotes de redução de despesas. No Distrito Federal, por exemplo, foram quase 4 mil cortes de cargos este ano, com uma economia de R$ 35 milhões nas folhas de pagamento de janeiro e fevereiro. No Espírito Santo, a meta é reduzir em 20% o valor com cargos comissionados, além de corte equivalente no número de temporários. No Mato Grosso, o número de contratados em cargos de confiança deve ser reduzido em 25%.

“A carga tributária no Brasil é muito alta e o ambiente empresarial, muito acirrado. Não há espaço para aumento de impostos. Por isso, nosso trabalho está voltado para a redução da despesa primária”, afirma a secretária de Fazenda do Espírito Santo, Ana Paula Vescovi. O estado tem a meta de reduzir os gastos em 11% este ano, para “fazer com que as despesas caibam dentro das receitas”, diz ela. Além dos cortes de pessoal, estão sendo renegociados contratos de prestação de serviços, telefonia e aluguel de imóveis — a meta é reduzir o custeio da máquina administrativa em até 20%.

Um dos governos com pior situação financeira, o Distrito Federal tinha apenas R$ 34 mil em caixa na virada do ano, o que levou a atrasos no pagamento de salários do funcionalismo público em janeiro. Entre as medidas já anunciadas para reequilibrar as finanças, além dos cortes na folha salarial, estão a redução do número de secretarias (de 31 para 24); a revisão da frota de veículos disponível para autoridades e dos gastos com telefonia; e a redução em gastos de custeio. “Os secretários estão hoje andando de carro 1.0”, diz o secretário de Gestão Administrativa e Desburocratização, Antônio Paulo Vogel. Algumas secretarias devem ser transferidas temporariamente para escritórios no estádio Mané Garrincha, construído para a Copa de 2014, para economizar aluguel enquanto o centro administrativo do governo não fica pronto.

São Paulo e Rio, as duas maiores economias do país, também já anunciaram a intenção de cortar despesas. O governo paulista, porém, está mais adiantado: recebe no próximo dia 16 uma avaliação de cada secretaria sobre as medidas possíveis para atingir a meta de reduzir 10% nos gastos com custeio e 15% nos gastos com pessoal. Decreto publicado pelo governador Geraldo Alckmin em 25 de fevereiro determina ainda a renegociação de contratos com prestadores de serviços e a reavaliação dos espaços usados pela administração pública, para reduzir o custo com aluguéis. No Rio, a ideia do governador Luiz Fernando Pezão é chegar a uma economia de até R$ 2,6 bilhões este ano, mas ele ainda não detalhou as ações.

As políticas de ajuste nos estados são motivadas pela queda de receitas tributárias gerada pela desaceleração econômica e de royalties do petróleo, fruto da queda das cotações internacionais, mas podem resultar em máquinas administrativas mais eficientes após anos de inchaço. “É até um chavão dizer isso, mas toda crise representa oportunidades. E agora estamos tendo a chance de olhar as coisas por dentro e racionalizar a máquina do estado”, comenta Vogel. “O momento é propício para reabrirmos a discussão de normas e readequação da Lei de Responsabilidade Fiscal, de forma que tenhamos estados mais eficientes na alocação do dinheiro público”, acrescenta Ana Paula, do Espírito Santo.

A crise trouxe ainda uma visão mais crítica com relação a alguns privilégios conferidos a autoridades públicas. No Distrito Federal, diz Vogel, o governo anterior tinha 12 carros de luxo à disposição do governador e de seu vice, tipo de luxo que não deve mais voltar a ocorrer. No Maranhão, o governador Flávio Dino apontou os gastos com jatinhos como uma das prioridades do ajuste, suspendendo um contrato de R$ 15 milhões para a prestação do serviço. “Eu viajo de avião comercial, neste momento. Depois faremos contrato em outros termos, que não consuma R$ 15 milhões”, explicou o governador à imprensa local.

“Tenho a sensação de que governos estaduais estão fazendo um ajuste fiscal profundo e com base em cortes, e não postergação de despesas. Mas ainda faltam números e evidências, está tudo muito rápido”, comenta o economista José Roberto Afonso.

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