São Paulo - Imagine comer uma maçã e, junto, a embalagem que a envolve. Ou, então, preparar uma sopa e colocar o sachê de tempero diretamente na água fervente. Ou ainda levar o frango com saquinho e tudo ao forno. Embora esses exemplos pareçam ficção científica, já são realidade. Pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) desenvolveram um filme plástico comestível produzido a partir de beterraba, mamão, goiaba e tomate. Na composição não há derivado do petróleo, como ocorre com o papel-filme tradicional. Mesmo assim, mantém a mesma resistência, textura e capacidade de proteção.
Ainda não há prazo para que o produto chegue ao mercado, mas o doutorando Marcos Vinicius Lorevice, que participa do projeto ao lado de pesquisadores da Rede de Nanotecnologia Aplicada ao Agronegócio (Agronano), afirma que já há empresas interessadas em produzir o filme comestível em escala industrial. Foram investidos R$ 200 mil e oito anos de estudos para chegar ao resultado das películas coloridas naturais que não necessitam de nenhum derivado de petróleo. A matéria-prima é composta por água, polpa de fruta e biopolímeros.
“A ideia era criar uma embalagem usando matéria-prima renovável para diminuir a dependência do plástico derivado do petróleo, que não é renovável”, explica Lorevice. Outro benefício do filme comestível está justamente na questão ambiental. Ao contrário do plástico convencional, que pode levar até 400 anos para se decompor, a nova embalagem, quando descartada, se desfaz em poucos meses. Ou então, é possível compostá-la para obter adubo.
Lorevice diz ainda que o produto pode se tornar uma fonte de renda adicional ao agricultor, pois a matéria-prima pode ser aquele alimento feio e pouco atraente para venda, que seria descartado. Calcula-se que exista uma perda de 30% de frutas e hortaliças desde a colheita até a mesa do consumidor. “Tomate e maçã são produtos muito sensíveis ao visual, por exemplo. Assim, é possível aproveitar esses alimentos que ainda têm qualidades nutritivas e aplicar nesse filme. Agrega-se valor a um produto que era considerado resíduo e diminui-se o desperdício”, exemplifica o doutorando.
O plástico comestível é feito basicamente de alimento desidratado misturado a um nanomaterial (também vegetal) que tem a função de dar liga ao conjunto. Por isso mesmo, diz Lorevice, o maior desafio foi encontrar a formulação ideal de ingredientes e proporções para que o material tivesse as características necessárias.
Uso apenas como embalagem secundária
Embora a aplicação do filme comestível possa ocorrer nas mais diversas formas, como embalagem só deve se dar de forma secundária, envolvendo o produto, em contato direto com o alimento. Assim, evita-se qualquer tipo de contaminação a que as embalagens tradicionais estão expostas. Ainda assim, tem a característica de proteger, pois a resistência é comparável à do filme normal.
PLÁSTICO DE COMER
? Mamão, espinafre, maçã, beterraba e até alguns tipos de temperos são exemplos de alimentos que podem ser utilizados como matéria-prima na composição do filme comestível em substituição ao material sintético, normalmente derivado de petróleo.
? Essa matéria-prima passa pelo processo de liofilização, um nome complicado para explicar uma simples desidratação. Após o congelamento do alimentos, toda a água contida nele se transforma do estado sólido diretamente ao gasoso, sem passar pelo estado líquido.
? O resultado é um alimento completamente desidratado, mas que mantém suas propriedades nutritivas. A película comestível é polivalente: dissolve fácil na água e pode ser consumida na forma de sucos e vitamina. No futuro, o sachê que acompanha sopas se dissolverá sozinho na água.