Por bruno.dutra

Brasília - Apontada como a grande incógnita entre os projetos que integram o Programa de Investimentos em Logística (PIL), anunciado pelo governo na terça-feira, a Ferrovia Bioceânica ainda nem sequer teve seu o traçado planejado, mas já virou motivo de discórdia. Parlamentares da oposição veem com ressalvas a construção de uma estrada de ferro que cruzará os oceanos Atlântico e Pacífico, e que ligará o Brasil ao Peru. Ontem, durante audiência pública no Senado, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, não só defendeu o projeto, como adiantou que a intenção do governo é iniciar as obras da Bioceânica apenas em 2018, o último ano do mandato da presidenta Dilma Rousseff.

A avaliação do governo é que a obra já se justifica só pelo lado brasileiro, já que a construção da Ferrovia ajudaria a escoar parte da produção agrícola do Centro-Oeste para portos na região Norte, reduzindo custos logísticos e possibilitando o aumento do preço da tonelada de soja exportada.
“A Ferrovia Bioceânica não é o trem-bala, que só faz sentido se se fizer todo o seu traçado”, reforçou o ministro, citando como exemplo trechos já em análise pelo governo, como a construção de um corredor de acesso entre Sapezal (MT) e Porto Velho, em Rondônia.

Respondendo a parlamentares, Barbosa frisou que “não há necessidade de fazer tudo “de uma só vez”, e mencionou que uma das possibilidades em estudo seria estruturar um modelo de concessões que priorizasse, num primeiro momento, a construção de trechos “viáveis comercialmente”. Mas, mesmo essas obras, dependem de estudos técnicos que estão sendo conduzida por empresas chinesas, e cuja data de entrega está marcada para maio do ano que vem.

No entender de especialistas em mobilidade e infraestrutura, há mais motivos para duvidar da viabilidade do projeto, por mais que o governo dê razões para otimismo. “A julgar pelas dificuldades de se erguer uma ferrovia cruzando a Amazônia e a Cordilheira dos Andes, esse projeto tende a ser uma furada ainda maior que a promessa do trem-bala, que sequer saiu do papel, apesar de todo o oba-boa do governo”, disparou o coordenador do Núcleo de Infraestrutura e Logística da Fundação Dom Cabral, Paulo Resende.

O especialista reforçou que as maiores dificuldades para a implementação do projeto não seriam nem mesmo logísticas. “Tecnicamente, existe viabilidade de construir uma estrada de ferro em um terreno geologicamente difícil, como a Cordilheira dos Andes”, disse, reforçando que, em termos de tecnologia empregada na obra, já há ferrovias com maiores dificuldades que essa. “Porém, mesmo que esse projeto fosse construído na Europa, por exemplo cruzando os Alpes suíços e franceses, já seria de difícil execução. Mas, considerando as condições geológicas brasileiras e peruanas, dificuldades de obter licenças ambientas e a proximidade com territórios indígenas na região, essa dificuldade passa a ser extrema”, frisou.

Orçada em R$ 40 bilhões apenas no trecho brasileiro, e com extensão prevista de 3,5 mil quilômetros, a Ferrovia Bioceânica consiste no maior projeto de mobilidade urbana já implementado no país. Sozinha, a obra responde por um quarto de todo o investimento previsto para ser aplicado na segunda etapa do PIL, que será executado até 2019. Apesar da grandiosidade do empreendimento, o governo não está dando prioridade ao projeto, e já elegeu outras obras como mais importantes no pacote, como a Ferrovia Norte-Sul.

Outra área que recebeu atenção da equipe econômica são as rodovias. Prova disso é que, ontem, apenas um dia após o lançamento oficial do programa pela presidenta Dilma, o Ministério dos Transportes publicou 11 editais de chamamento, autorizando as empresas a darem início aos estudos técnicos e de viabilidade para a execução de obras nas rodovias a serem concedidas.

A mesma prioridade não foi dada para a Bioceânica, projeto pelo qual o Planalto esperava incluir em uma agenda positiva, em meio a um noticiário desfavorável tanto na economia, quanto na política. Mas, em vez de solução, a Ferrovia passou a ser motivo de ressalvas por parte de investidores e tem se tornado motivo de dor de cabeça para a presidenta Dilma. “A Ferrovia Bioceânica foi o grande ponto fora da curva desse PIL”, refletiu o advogado Renato Kloss, sócio do setor de infraestrutura do escritório Siqueira Castro Advogados. “Hoje, esse projeto está mais para fantasia do que para realidade”, emendou.

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