Presidente Jair Bolsonaro fez propaganda da cloroquina como tratamento contra a doença desde o início da pandemiaReprodução/TV Brasil

Brasília - Segundo decisão publicada no Diário Oficial da União nesta sexta-feira, 21, o secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Hélio Angotti Neto, recusou todos os protocolos desenvolvidos pela Comissão de Incorporação de Tecnologias ao SUS (Conitec) relacionados ao tratamento de covid-19.
Entre os textos vetados, está o que rejeita o uso do chamado kit Covid — com o uso de medicamentos com ineficácia comprovada cientificamente, como a hidroxicloroquina e cloroquina — no tratamento de pacientes que estão em tratamento ambulatorial.
Em nota técnica divulgada na página da Conitec, Angotti justificou que as recomendações não foram aceitas porque o processo de elaboração dos documentos foi marcado por "inadequações, fragilidades e riscos éticos". Dessa maneira, o Ministério da Saúde não vai seguir as orientações do grupo técnico relacionados ao não uso do kit Covid.
A decisão de Angotti foi registrada em quatro portarias publicadas no Diário Oficial da União nesta sexta-feira, 21. Em todas, o secretário amparou sua decisão em uma nota técnica de 45 páginas assinada somente por ele. Agora, a decisão será encaminhada para Queiroga adotar "as devidas medidas que julgar cabíveis".
Angotti listou 28 motivos para barrar as diretrizes, apontando "diversas inadequações, fragilidades, riscos éticos e técnicos e inconsistências capazes de comprometer negativamente o processo e as recomendações". 
"Diante das diversas inadequações, fragilidades, riscos éticos e técnicos e inconsistências capazes de comprometer negativamente o processo e as recomendações feitas, na qualidade de Secretário Nacional de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde do Ministério da Saúde, conforme competências estabelecidas pelo Decreto nº 7.646, de 21 de dezembro de 2011, não aprovo as ‘Diretrizes Brasileiras para Tratamento Hospitalar do Paciente com Covid-19. Capítulo 2: Tratamento Medicamentoso’ e as ‘Diretrizes Brasileiras para Tratamento Medicamentoso Ambulatorial do Paciente com Covid-19′", diz um trecho do documento.
Ausência de argumentação científica
O vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia e professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Alexandre Naime Barbosa, integrou o grupo que elaborou as diretrizes sobre o tratamento ambulatorial contra a covid. O médico reagiu às justificativas do secretário do Ministério da Saúde e afirmou que a nota técnica é "um texto completamente ausente de argumentação científica". Para ele, o veto às diretrizes é uma questão político-ideológica e não técnico-científica.
 
"A questão da prescrição de drogas off-label na pandemia já caiu porque todas essas opções já foram estudadas de forma extenuante e não é nenhum tipo de falta de lacuna na ciência. Não falta informação, a gente já sabe que são ineficazes", disse ao Estadão.
 
"(A nota técnica) ainda fala um outro termo falacioso, que "o importante é salvar vidas". Todos nós queremos salvar vidas, mas de forma honesta, prescrevendo medicações que tenham comprovação de eficácia."
 
O professor da Universidade de São Paulo (USP) Carlos Carvalho coordenou todos os grupos que apresentaram diretrizes para a covid a pedido do ministério. Ele considerou a decisão de Angotti uma "arbitrariedade" e declarou que os médicos que elaboraram o tratamento foram aprovados pela pasta. "Não é que eu peguei dez amigos para fazer isso. Não entendo, para mim foi uma surpresa por que não foi aprovado", afirmou.
Confira o texto na íntegra:
*Com informações do Estadão.