Golpistas invadiram e destruíram os prédios públicos em 8 de janeiroValter Campanato/Agência Brasil

Os ataques golpistas do 8 de janeiro deixaram um rastro para além do flerte com regimes autoritários, trazendo um prejuízo total de mais de R$ 27,2 milhões ao governo brasileiro na figura do Supremo Tribunal Federal (STF), Palácio do Planalto e Congresso Nacional. 
Os dados mais atualizados foram obtidos pelo O Dia por meio da Lei de Acesso à Informação. Foi feito pedido no início do mês passado, por meio da lei, ao STF, Câmara, Senado e Planalto — apenas o Planalto não respondeu.
Segundo dados do Ministério Público Federal (MPF), na denúncia apresentada contra os financiadores dos atos de vandalismo, o subprocurador-geral pontua que as invasões e depredações causaram prejuízos aos cofres públicos que somam, até o momento, R$ 3,5 milhões no Senado, R$ 2,7 milhões na Câmara dos Deputados, mais R$ 9 milhões no Palácio do Planalto, apenas em relação às obras de arte, e R$ 12 milhões no Supremo Tribunal Federal. Além disso houve danos inestimáveis em bens históricos.
Ao O Dia, as instituições detalharam alguns dos prejuízos e gastos causados pelas depredações.
Supremo Tribunal Federal
A destruição no edifício-sede do Supremo Tribunal Federal gerou prejuízo de R$ 8.616.822,30, com 951 itens que foram furtados, quebrados ou completamente destruídos. Além disso, a despesa para reconstrução do Plenário, com troca de carpetes, cortinas e outros, foi de R$ 3.424.600,25, totalizando cerca de R$ 12 milhões em prejuízo para os cofres públicos. Até o momento foram restaurados 116 itens:

Cerca de 22 esculturas (entre bustos, estatuetas, Crucifixo do Plenário e Estátua A Justiça); 21 telas e tapeçarias; 4 galerias de retratos (Galeria de Ministros, de Presidentes, de Diretores-Gerais e Secretários-Gerais); 19 objetos (lustres, Brasão da República, vasos); 50 itens de mobiliário (cadeiras, mesas, móvel expositor da Constituição etc.). Ainda foi necessária a substituição de 4 telas do fotógrafo Sebastião Salgado.
"Além do acervo restaurado, há 3 espelhos e 9 cadeiras que ainda não tiveram a restauração concluída, em razão da necessidade de material específico que está sendo adquirido. Há outros 15 itens, entre vasos e mobiliários, passíveis de restauração. Esse acervo, que sofreu maiores avarias, está sendo objeto de estudo para definição da técnica mais apropriada e do material necessário", diz a nota. "Também foram perdidos 106 itens históricos de valor imensurável, como esculturas e móveis que não puderam ser restaurados e não podem ser repostos", acrescenta.
De acordo com a instituição, quanto ao valor das restaurações, é necessário considerar dois eixos: a mão de obra e o material utilizado. O maior custo seria o da mão-de-obra especializada, mas, como o serviço foi realizado por servidor e colaboradores terceirizados do Tribunal (contrato de postos com dedicação exclusiva), não há como precisar essa importância. Quanto aos insumos utilizados nas restaurações, além do material que o STF já tinha em estoque e de materiais que conseguiu gratuitamente em parcerias, houve aquisições ao decorrer do ano de 2023.
"Diante desses dados, não há como estimar o custo individual de cada restauração. Vale lembrar que os itens danificados, com natureza de patrimônio cultural, são de valor inestimável. Não encontrados ou inservíveis", finaliza.
Senado Federal
A recuperação de bens musealizados totaliza R$ 483.082,98. Em outubro, foi reinstalada no Salão Negro do Congresso Nacional a tapeçaria de Burle Marx, restando apenas duas obras a serem entregues.
Toda a restauração da tapeçaria foi orçada em R$ 170,3 mil. Devido ao alto valor da obra de arte, foram contratados também uma transportadora especializada e um seguro, nos valores de R$ 37 mil e R$ 28,9 mil, totalizando um curso de R$ 236,2 mil.
Tapeçaria restaurada após os atos golpistas - Senado Federal
Tapeçaria restaurada após os atos golpistasSenado Federal


Para a diretora-geral, Ilana Trombka, o retorno da tapeçaria simbolizou a vitória da democracia: "A verdade é que, apesar das agressões sofridas por este Parlamento, com a resiliência e otrabalho de todos e todas as colegas, a democracia foi mais forte. Essa tapeçaria nos conta um pouco da história daqueles que construíram Brasíliapara ser guardiã dos Poderes, da democracia, do diálogo. Não conseguiram nos tirar esse papel, ainda bem".
As obras e serviços necessários para recuperação das instalações físicas, no Edifício Principal, no Anexo I e no Anexo II do Senado Federal, totalizam 889.412,28.
Câmara dos Deputados
Em seu relatório, a instituição aponta que cerca de R$ 1.401.848,02 serão gastos no total (contemplando materiais de consumo e mão de obra especializada) para reparo e restauração de 68 bens do acervo cultural da Câmara, como pinturas, esculturas, presentes protocolares, painéis e etc. Os itens fazem parte do Salão
Verde, Salão Nobre, Salão Negro, Plenário, entrada principal (acesso ao Salão Branco) e corredores que interligam essas áreas.
Já os 48 bens patrimoniais diverso danificados (mobiliário, computadores, aparelhos telefônicos, monitores de vídeo, capacetes e bens etc.) e 16 bens extraviados (capacetes, escudo e máscaras contra gases), custão em média R$ 74.396,98. Os bens são distribuídos nas Lideranças do PT, PSDB, MDB, sala do DEPOL do edifício principal, corredor das lideranças, colégio de líderes, corredor de acesso ao plenário, salão verde e no museu.
A manutenção de imóvel, com a necessidade de reparo ou substituição de persianas, carpetes, reparos
elétricos e hidráulicos, sistema de detecção de incêndio, vidros e etc., está avaliada em torno de R$ 1.204.546,13.
Por fim, a aparelhagem do setor de mídias digitais, como impressora, fones de ouvido, DVCAM Players, HD externo, leitor de cartão de memória, microfone e etc., — alguns sem condições de reparo ou que estão desaparecidos — R$ 32.076,95.
A Advocacia-Geral da União (AGU) ajuizou ações de cobrança por danos causados ao patrimônio público no mesmo dia dos ataques golpistas. Ao O Dia, AGU informou que "ainda não houve o trânsito em julgado destas ações, razão pela qual ainda não houve o ressarcimento pelos prejuízos, embora a Justiça já tenha acolhido pedido da AGU para bloquear os bens dos envolvidos".
Evento para marcar os atos golpistas
Para marcar a data, um ato "Democracia Inabalada" foi preparado por Lula, junto com os presidentes dos outros Poderes, para lembrar um ano das depredações nesta segunda-feira, 8. O evento acontece no Salão Negro do Congresso com a presença de ministros do governo, do STF, parlamentares e outras autoridades. A réplica da Constituição, que chegou a ser roubada do Supremo no dia em que a Corte foi alvo dos vândalos, ocupará um lugar de destaque na cerimônia.

A cerimônia, originalmente, seria batizada com o nome Democracia Restaurada, mas o bordão desagradou até a base do governo. Lula rebatizou o ato em aceno ao STF, que utilizou o slogan em uma campanha institucional em 2023.
O chefe do Executivo informou que convidou todos os governadores para o evento. Porém, mesmo antes do Palácio do Planalto enviar os convites, chefes de Executivo estaduais alinhados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) já haviam adiantado que não participariam do ato.
Segundo Lula, o ódio de alguns contra a democracia "deixou cicatrizes profundas e dividiu o país". "Colocou em risco a democracia. Quebraram vidraças, invadiram e depredaram prédios públicos, destruíram obras de arte e objetos históricos", comentou.
O presidente, contudo, pontua que a "tentativa de golpe causou efeito contrário". "Uniu todas as instituições, mobilizou partidos políticos acima das ideologias, provocou a pronta reação da sociedade. E ao fim daquele triste 8 de janeiro, a democracia saiu vitoriosa e fortalecida. Fomos capazes de restaurar as vidraças em tempo recorde, mas falta restaurar a paz e a união entre amigos e familiares", disse Lula.
Ato do STF
O STF também promove um evento nesta segunda-feira, 8. Um ano após vândalos depredarem órgãos e instalações públicas na Praça dos Três Poderes, o Supremo realiza a exposição: "Após 8 de janeiro: Reconstrução, memória e democracia".
O objetivo da iniciativa é preservar a memória institucional do STF. A mostra traz cenas que simbolizam a retomada das atividades da Casa diante da tentativa golpista, e, também, dos esforços das equipes envolvidas na reconstrução e restauração do patrimônio da Suprema Corte.

Parte da mostra expõe peças do projeto "Pontos de Memória", implementado logo após os atos antidemocráticos. Trata-se da exposição de peças danificadas, de fragmentos decorrentes da violência e de demais vestígios físicos do ataque.

A cerimônia de abertura da mostra conta com a presença do presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, e ocorre no Hall dos Bustos às 14h. Estarão presentes os demais ministros, autoridades e convidados.

Na terça-feira, 9, o público geral terá acesso à exposição que ocorrerá no térreo do Edifício Sede, das 13h às 17h.