Rio - Em comunicado divulgado quarta-feira, a Presidência da República acusou o ex-diretor da área internacional da Petrobras, Nestor Cerveró, de omitir, em reunião do Conselho de Administração da companhia, informações sobre o contrato de compra da Refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos. Realizada em 2006, representou à estatal uma perda de cerca de US$ 1 bilhão, devido a uma cláusula que determinava a compra de participação de sua sócia no negócio, a belga Astra. A nota deu nova munição para a artilharia da oposição, que tem na empresa um dos principais alvos de críticas contra a gestão petista.
Distribuída no início da manhã, a nota responde à reportagem do jornal "O Estado de S.Paulo", que apresentou uma ata de 2006 comprovando que a compra da refinaria foi aprovada por unanimidade pelo Conselho de Administração da empresa, à época presidido pela presidenta Dilma Rousseff. Naquele ano, a estatal pagou US$ 360 milhões por 50% da unidade, com o objetivo de refinar petróleo brasileiro nos Estados Unidos. Após desavenças com os sócios, porém, o negócio foi parar na Câmara Internacional de Arbitragem, que determinou à Petrobras que pagasse US$ 820 milhões pelos 50% restantes. Em 2005, a Astra havia pago apenas US$ 42,5 milhões pela refinaria.
O alto valor desembolsado pela Petrobras - cerca de US$ 1,18 bilhão, ao todo - decorre de uma cláusula contratual chamada put option, segundo a qual um dos sócios se obrigava a comprar a parte do outro em caso de desentendimento. No comunicado distribuído quarta-feira (abaixo), a Secretaria de Comunicação da Presidência da República afirma que o conselho não teve conhecimento da cláusula na reunião em que a operação foi aprovada, após leitura de um resumo executivo apresentado por Cerveró.

"Posteriormente, soube-se que tal resumo era técnica e juridicamente falho, pois omitia qualquer referência às cláusulas Marlim e de Put Option que integravam o contrato, que, se conhecidas, seguramentenão seriam aprovadas pelo Conselho", diz o texto. Em 2008, após o início dos desentendimentos com a Astra, prossegue o documento, o Conselho foi surpreendido coma existência da cláusula e negou que fosse exercida, preferindo recorrer à arbitragem internacional. Procurado, Nestor Cerveró - que hoje ocupa a diretoria Financeira da BR Distribuidora - não foi encontrado para comentar o assunto.
Investigada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), pelo Ministério Público e pela Polícia Federal, a compra da refinaria é apontada como um ponto de inflexão nas relações entre Dilma e o ex-presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli. Segundo fontes, o desenrolar da história, que resultou em grandes perdas para a Petrobras, teria sido preponderante para azedar de vez o relacionamento entre os dois. Um observador próximo confirma que as cláusulas não constaram da apresentação feita ao Conselho.
A retomada do caso Pasadena deu fôlego à oposição em suas críticas contra a gestão da Petrobras, que vem passando por um momento delicado, com dificuldades de caixa por causa do congelamento dos preços dos combustíveis, e tem sido um dos alvos preferidos neste período pré-eleitoral. Quarta-feira, o pré-candidato do PSDB à Presidência, o senador Aécio Neves, fez um pronunciamento sobre o caso na tribuna no Senado. "Foi algo extremamente grave, e não há mais condições de permitirmos a terceirização de responsabilidade", afirmou. Lideranças da oposição pediram a convocação do ex-diretor da área Internacional para novos esclarecimentos sobre o caso.
Na semana passada, a oposição forçou a abertura de uma comissão para investigar também denúncias de propina na encomenda de plataformas de produção da holandesa SBM Offshore, que vieram à tona no início do ano, após denúncia anônima de um ex-funcionário da empresa fornecedora no site Wikipedia.
A compra da refinaria de Pasadena foi justificada na época pela necessidade de melhorar as margens de exportação brasileira de petróleo pesado, em um momento em que o Brasil atingia a autossuficiência na produção."Na época, a compra fazia sentido, pois o petróleo brasileiro tinha grande deságio com relação às cotações internacionais", diz um observador próximo. A Petrobras planejava investir na unidade de Pasadena para adaptá-la ao petróleo de Marlim, então o maior campo produtor do país.
"Mas depois o pré-sal foi descoberto e o foco da empresa se voltou inteiramente para o Brasil. Ter refino no exterior deixou de fazer sentido", completa. A Petrobras chegou a colocar a refinaria à venda, mas recuou após críticas com relação aos valores apresentados no mercado. Hoje, a unidade está desativada.
A NOTA DO PLANALTO
? 19/03/2014 às 08h25
Resposta ao jornal O Estado de S.Paulo
A aquisição pela Petrobras de 50% das ações da Refinaria de Pasadena foi autorizada pelo Conselho de Administração, em 03.02.2006, com base em Resumo Executivo elaborado pelo Diretor da Área Internacional.
Posteriormente, soube-se que tal resumo era técnica e juridicamente falho, pois omitia qualquer referência às cláusulas Marlim e de Put Option que integravam o contrato, que, se conhecidas, seguramente não seriam aprovadas pelo Conselho.
Em 03.03.2008, a Diretoria Executiva levou ao conhecimento do Conselho de Administração a proposta de compra das ações remanescentes da Refinaria de Pasadena, em decorrência da aplicação da Cláusula de Put Option. Nessa oportunidade, o Conselho tomou conhecimento da existência das referidas cláusulas e, portanto, que a autorização para a compra dos primeiros 50% havia sido feita com base em informações incompletas. Em decorrência disto,o Conselho de Administração determinou à Diretoria Executiva que apresentasse informações complementares sobre a operação. O tema retornou, nas reuniões subsequentes do Conselho de Administração, resultando na não aprovação da compra das ações e na decisão de abertura do processo arbitral contra o grupo Astra. O processo arbitral foi aberto em decorrência de previsão contratual e de acordo com as regras da American Arbitration Association.
A Diretoria Executiva informou ao Conselho de Administração sobre a abertura de procedimento de apuração de prejuízos e responsabilidades.
A aquisição pela Petrobras das ações remanescentes da Refinaria de Pasadena se deu em 13.06.2012, ao ser cumprido o laudo arbitral proferido pela Câmara Internacional de Arbitragem de Nova York e confirmado por decisão das Cortes Superiores do Texas.