Por monica.lima

Rio - O ciclo de alta da taxa básica de juros, iniciado em abril do ano passado, teve o seu efeito claramente refletido sobre o desempenho do comércio em março. Empresários foram alertados pela Confederação Nacional do Comércio (CNC) para não recorrer aos bancos atrás de recursos para a formação de estoques, por causa do encarecimento do crédito. Do outro lado, a Selic mais alta e a consequente piora das condições de empréstimo pelas instituições financeiras contribuíram para que o consumo obtivesse o pior resultado em um mês de março em 11 anos. A queda foi de 1,1%, comparado a igual mês de 2013 (em 2003, a taxa foi de -11,4%), segundo a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Mas, se a política monetária já demonstra o seu ônus sobre o crédito — que interfere tanto nas compras quanto nas vendas do comércio —, na inflação do varejo, de fato, ainda não surtiu efeito. “Estamos em uma encruzilhada, de crédito caro e inflação alta”, afirma o economista da CNC Fábio Bentes. No atacado, os preços até começaram a cair, como demonstra o Índice Geral de Preços - 10 (IGP-10), divulgado ontem pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), mas ainda estão elevados para o consumidor final e explicam parte da retração da principal atividade varejista, a de hipermercados (-2,8%, ante março de 2013). Pelos cálculos da CNC, a inflação do grupo é de 1,5%, superior à da média do setor, de 1%.

Para Carlos Thadeu de Freitas, economista-chefe da Confederação, os efeitos da política monetária “ainda não chegaram à sua plenitude”. Por enquanto, diz ele, a manutenção do crescimento da renda do trabalho garante que as vendas cresçam neste ano. A projeção é de 4% a 4,5% de expansão do comércio em 2014.

Já Bentes ressalta que há o risco de o encarecimento do crédito superar o crescimento do mercado de trabalho. Em março, o empréstimo ao consumidor ficou 3,7%, comparado a igual mês de 2013, enquanto o rendimento do salário, na mesma comparação, subiu 4%. As taxas são muito próximas e, caso o crédito avance mais do que a renda, a tendência é de aumento da inadimplência, prevê o economista.

A pisada no freio não diz respeito exclusivamente ao comércio. Atinge também a indústria e importadores%2C que%2C num efeito em cadeia%2C sentirão a desaceleraçãoHenrique Manreza

Outro sintoma de um cenário mais lento, diz Bentes, é que, no primeiro trimestre, a média diária de concessão de empréstimo para capital de giro, do qual o comércio é o principal demandante, caiu 33%, comparado a igual período do ano passado. Essa é uma sinalização de que, independentemente do alerta da CNC para que o empresariado não recorra aos bancos, há um movimento autônomo contra a formação de estoques.

A pisada no freio, entretanto, não diz respeito exclusivamente ao comércio. Atinge também os seus fornecedores — indústria e importadores —, que, num efeito em cadeia, sentirão as consequências da desaceleração na ponta, afirma o economista-chefe da CNC. Essa é, complementa,mais uma indicação de que 2014 é um ano pouco favorável ao investimento. “Quem quiser investir com dinheiro próprio, tudo bem. O que não vale é recorrer aos bancos”, alerta.

Uma das quedas mais relevantes, segundo a PMC, foi a registrada pelo segmento de automóveis — de 16%, em março, em relação a igual mês do ano anterior. Este é o pior resultado desde novembro de 2008, quando, considerando a mesma base de comparação, o consumo caiu 20,3%. Aleciana Gusmão, pesquisadora do IBGE, ressalta que o resultado do comércio de veículos, segundo a PMC, foi influenciado não só pela piora das condições de crédito, como pelo fim dos estoques de carro com o benefício de isenção de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).

Esta não foi, contudo, a única atividade a influenciar a queda do varejo em março. Dos oito segmento pesquisados, cinco apresentaram taxas negativas, “ com destaque para hipermercados, que, historicamente, é uma das atividades que mais contribui para a composição final da taxa do varejo”.

A pesquisadora atribui o resultado ruim do grupo de hipermercados, assim como o de lojas de departamentos, ao efeito calendário. Março foi um mês de Carnaval, por isso com menos dias úteis, enquanto, em igual mês do ano passado, ocorreu a Páscoa, período de crescimento das vendas, portanto, de uma base de comparação mais alta.

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