Por bruno.dutra

Rio - As projeções de analistas de mercado para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2014, previsto em 0,15%, e de 2015, estimado com retração de 0,66% (segundo o Boletim Focus do Banco Central), podem furar com a mudança da metodologia do Sistema de Contas Nacionais pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que passou a incorporar padrões e recomendações internacionais. A atualização das séries anuais de 2000 a 2011 revelou, em média, uma expansão de 2,1% dos valores correntes do PIB nacional sobre a série antiga.Mas os números inchados não devem animar as agências de risco, segundo especialistas.

Com a revisão, o crescimento do PIB brasileiro em 2011 saltou dos 2,7% para 3,9% . Em valores correntes, o resultado de 2011 passou de R$ 4,143 trilhões para R$ 4,374 trilhões. Já em 2010, a expansão da economia foi revista de 7,5% para 7,6%. Em valores correntes, o resultado saiu dos R$ 3,770 trilhões para 3,886 trilhões.

Em valores per capita, em 2011, o PIB passou de R$ 20.998 para R$ 22.162; em 2010, de R$ 19.285 para R$ 19.882. As taxas de poupança passaram de 17,2% para 19,4% em 2011, e de 17,5% para 19,2% em 2010.

“Com certeza essa revisão metodológica vai quebrar com as perspectivas do mercado”, avalia o economista do Insper, João Luiz Mascolo. “Talvez para 2014 não tenhamos um crescimento do PIB perto de zero e sim em 1%, e 2015 saia da retração. Mas não vai ser nada brilhante. Os números do PIB podem ficar maiores, mas o cenário é o mesmo e o decréscimo de um ano para o outro será tão grande quanto”, completa.

Para o especialista do Insper, a relação dívida e PIB também deve diminuir, assim como os indicadores fiscais e o déficit público, que não devem apresentar um quadro tão deteriorado. Mas, segundo João Luiz Mascolo, os movimentos da economia continuam os mesmos e “as mudanças não devem animar as agências de classificação de risco”.

Economista da Fundação Instituto de Administração (FIA), Rodolfo Olivo também afasta uma possível melhoria da nota das agências de risco, como também da confiança de empresários e das famílias sobre a economia e o governo. “Para as agências, as mudanças do IBGE são apenas um ajuste estatístico, que podem gerar um acréscimo nos números, mas nada que mude a nota de avaliação do país”, diz.

“Entretanto, pelo lado político, dá a impressão de que já que o Boletim Focus aponta para uma recessão, o governo está dando um jeitinho nos números. É preciso lembrar que vivemos ainda um momento de falta de credibilidade das contas públicas, basta recordarmos o uso da contabilidade criativa no ano passado”, salienta Olivo, que reforça que, tecnicamente, as atualizações do IBGE são corretas.

“O IBGE está ajustando os dados a uma recomendação da ONU e a uma metodologia internacional. Basicamente, se trocou o que se caracterizava como despesas e incluiu como investimento e a reclassificação de algumas contas que tem um volume importante. Do ponto de vista técnica, é absolutamente correto. Estão melhorando os números”, diz. Segundo o IBGE, o trabalho de atualização dos dados levou três anos.

A principal contribuição para alavancar os resultados do PIB veio da ampliação do conceito de investimentos, que passou a incorporar os gastos com os produtores de propriedade intelectual — P& D (pesquisa e desenvolvimento), sofware e exploração mineral —, antes tratados pelo IBGE como gastos, consumo intermediário. Com a mudança metodológica, houve um aumento da taxa de investimentos (participação da Formação Bruta de Capital Fixo no PIB) de 16,8% para 18,3% em 2000 e de 19,3% para 20,6% em 2011.

“Em 2010, só a pesquisa e desenvolvimento acrescentou cerca de 1% no valor do PIB. Em países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico foram observado impactos de 2%”, apontou Cristiano Martins, gerente da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE.

Apesar da contribuição da ampliação do conceito de investimento para o PIB, o cálculo do uso da energia termelétrica sobre a produção deve frear uma expansão maior dos números do crescimento da economia. Segundo o IBGE, em 2011, quando o país usou pouco as térmicas, o consumo intermediário caiu para R$ 86,5 bilhões, gerando um valor adicionado bruto maior, de R$ 73,1 bilhões. No entanto, em 2010, a lógica foi inversa.

“Na séria histórica não se observa diferenças grandes, mas entre anos, sim. É um fenônemo que se torna mais importante a partir de 2010, com exceção de 2011, quando o uso de térmicas caiu”, explicou Rebeca Palis, coordenadora de Contas Nacionais do IBGE.

Embora ainda não se tenha a magnitude desse impacto, os especialistas esperam que 2014 e 2015 apresentem um consumo intermediário maior, o que deve gerar um valor adicionado bruto menor para o PIB. “As térmicas podem vir a contrabalançar essa alta dos resultados puxada pelos investimentos”, observa João Luiz Mascolo.

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