Por marta.valim

Os estudos realizados pelo professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) João Saboia apontam que os aumentos reais do salário mínimo explicam 75% da redução das desigualdades na distribuição de renda no Brasil medida pelo Índice de Gini. Trata-se de um índice que leva o nome de seu criador — o estatístico italiano Corrado Gini — e vai de 0 a 1. Quanto mais baixo for o índice, melhor a distribuição de renda de um país.

De 2009 a 2012, por exemplo, o Índice de Gini brasileiro caiu (melhorou) de 0,535 para 0,527. “O papel do salário mínimo tem sido muito relevante no processo de redistribuição de renda no país”, afirma o professor, que apresentou os resultados de sua pesquisa no seminário “Política de Salário Mínimo para 2015-18 — Avaliações de Impacto Econômico e Social”, promovido pelo Instituto Brasileiro de Economia (IBRE) da Fundação Getúlio Vargas (RJ).

Há uma particularidade em relação ao impacto do mínimo na redistribuição de renda, aponta Saboia: seus benefícios são mais claros nos segmentos intermediários de renda — conjunto que vai da faixa da população com renda familiar per capita média um pouco inferior a meio salário mínimo (com precisão 0,43 , conforme a tabela) até aquela com rendimento per capita de aproximadamente um mínimo e meio (1,48, na tabela). Perdem os muito pobres e os mais ricos.

Como se sabe, o salário mínimo tem grande impacto sobre as contas públicas. Ele corrige 65% dos benefícios da Previdência Social (para cada R$ 1 de aumento do mínimo, a despesa da Previdência sobe R$ 300 milhões); 100% dos benefícios assistenciais pagos a deficientes e idosos muito pobres; o piso do Seguro-Desemprego; e 1,7% da folha de salários do funcionalismo público federal, de acordo com dados apresentados por outros economistas no mesmo seminário.

Independentemente do foco intermediário do mínimo, há um grade debate sobre até onde as contas públicas aguentariam a norma de correção atual que combina a variação do Produto Interno Bruto (PIB) do ano retrasado com a inflação do ano anterior medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). Diversos especialistas em contas públicas, sugerem, por exemplo, que o mínimo passe a seguir o aumento real médio dos salários da economia. Considerando o foco intermediário do impacto do mínimo, há quem defenda inclusive o reforço de outras políticas de distribuição de renda em lugar dos aumentos reais do mínimo.

João Saboia discorda. “Entendo que é possível e importante manter por mais alguns anos a política de aumentos reais do mínimo e, ao mesmo tempo, reforçar ainda mais as políticas públicas bem focadas nos mais pobres, como o Programa Bolsa Família (...) Como feito recentemente, quando foi dado o aumento de 10% ao benefício básico do programa”, afirma.

O professor, especialista das áreas de mercado de trabalho e desigualdades socioeconômicas, explica alguns motivos. Em primeiro lugar, ele aponta em seu estudo que as negociações salariais recentes mostram que o salário mínimo está crescendo a taxas próximas das do mercado de trabalho. Em segundo lugar, ele destaca que, embora não alcance os mais pobres entre os pobres, os ganhos com a correção do mínimo incluem faixas de renda média per capita ainda baixas.

Além disso, Saboia trabalha com um cenário de crescimento baixo para este e os próximos anos, o que resultaria em correções reais igualmente modestas para o mínimo. “Considerando este cenário, parecem-me exageradas as preocupações que têm sido levantadas para a atual política do salário mínimo”, avalia. Saboia lembra, ainda, que qualquer mudança na regra com o objetivo de restringi-la teria “enorme custo político”.

O professor faz apenas uma ressalva: com o tempo, a política de aumentos reais do mínimo como ferramenta de redução das desigualdades tende a perder sua eficácia, pois aqueles que o recebem tenderão a se transferir para níveis mais elevados. Só então, talvez seja o momento de repensar a política de valorização do mínimo em um país ainda tão desigual.

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