O presidente Jair Bolsonaro fala com a imprensa no Palacio da Alvorada - Gabriela Biló/Estadão Conteúdo
O presidente Jair Bolsonaro fala com a imprensa no Palacio da AlvoradaGabriela Biló/Estadão Conteúdo
Por MARTHA IMENES
O primeiro ato do novo diretor-geral da Polícia Federal (PF), Rolando Alexandre de Souza, nomeado pelo presidente Jair Bolsonaro, foi trocar o comando da superintendência da corporação no Rio de Janeiro, área de interesse de Bolsonaro e seus filhos. A mudança foi uma das primeiras ações do novo chefe da PF após ser empossado na segunda-feira, cerca de 20 minutos depois de ser nomeado para o cargo. Em mais um rompante de falta de educação e de respeito com a imprensa, Bolsonaro, quando questionado por jornalistas sobre a troca do superintendente da Polícia Federal no Rio de Janeiro, Carlos Henrique Oliveira, Bolsonaro disparou: "Cala a boca, não perguntei nada". Bolsonaro ainda atacou a Folha de S.Paulo, chamando o jornal de "canalha", "patife" e "mentiroso".

Profissionais da imprensa perguntaram sobre o superintendente outra vez. E Bolsonaro, novamente, mandou que calassem a boca, aos berros. Ele afirmou que Oliveira será diretor-executivo da PF, cargo ocupado hoje por Disney Rossetti.

"Cala a boca! Cala a boca! Está saindo para ser diretor-executivo, a convite do atual diretor-geral. Não interfiro em nada. Se ele for desafeto meu e se eu tivesse ingerência na PF, não iria para lá. É a mensagem que vocês dão", disse.

Bolsonaro afirmou ainda que não tem nada contra Oliveira e que não tenta interferir na PF. "Não tenha nada contra o superintendente do Rio de Janeiro. E não interfiro na Polícia Federal. E ele está sendo convidado para ser diretor-executivo. É o zero dois."

Ao deixar o cargo, o ex-ministro da Justiça Sergio Moro denunciou que um dos motivos da insatisfação do presidente com o ex-diretor geral da PF, Maurício Valeixo, era a resistência dele em trocar o superintendente do Rio. Moro disse ainda que Bolsonaro tenta interferir politicamente na PF e as denúncias estão sendo apuradas pela Procuradoria-Geral da República com aval do Supremo Tribunal Federal (STF).


Governadores e associação reagem
Os governadores do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, e de São Paulo, João Doria, criticaram o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) por mandar um jornalista calar a boca ontem pela manhã. "Minha solidariedade aos profissionais da imprensa e aos veículos de comunicação. Hoje (ontem), em Brasília, mais uma atitude condenável de desrespeito à imprensa. Cada ameaça à liberdade de expressão atinge a democracia no Brasil. Lamentável a escalada autoritária no País", disse Doria.
Ferrenho adversário político do presidente, Witzel escreveu no Twitter: "Mandar um jornalista calar a boca é tentar calar a boca da democracia". "Quando você tem um cargo público relevante na sociedade você precisa responder à imprensa e não agredi-la, ofendê-la, espezinhá-la, humilhá-la", completou o governador.

Já a Associação Nacional de Jornais (ANJ) disse em nota que a postura de Bolsonaro mostra "incapacidade de compreender a atividade jornalística". Segundo a associação, o gesto do presidente revela também um caráter "autoritário".

"Mais uma vez, o presidente mostra sua incapacidade de compreender a atividade jornalística e externa seu caráter autoritário. Os jornalistas trabalham para levar os fatos de interesse público ao conhecimento da população e têm o direito e o dever de inquirir as autoridades públicas", afirmou a ANJ.

PGR vai investigar troca na PF
A troca no comando da Polícia Federal no Rio de Janeiro virou alvo de investigação da Procuradoria-Geral da República (PGR). O procurador Augusto Aras quer saber as razões da mudança.
Essa análise será um desdobramento dentro do inquérito aberto pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para investigar a suposta interferência política do presidente Jair Bolsonaro na autonomia da Polícia Federal, conforme denunciado pelo ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, que atribuiu a essa ação do presidente a sua decisão de deixar o governo.

Ao anunciar sua demissão, e a investigadores, Moro afirmou que Bolsonaro tinha interesse em mudar o comando da PF no Rio para ter uma pessoa de sua confiança no posto.
Ontem, o presidente falou sobre a mudança na chefia da Polícia Federal no Rio, berço eleitoral dele e seus filhos, ao criticar diante de apoiadores manchete desta terça do jornal "Folha de S. Paulo", que diz: "Novo diretor da PF assume e acata pedido de Bolsonaro".

"Para onde é que está indo o superintendente do Rio de Janeiro? Para ser o diretor-executivo da PF. Ele vai sair da superintendência, são 27 superintendentes no Brasil, para ser diretor-executivo. Eu estou trocando ele? Eu estou tendo influência sobre a Polícia Federal? Isso é uma patifaria, é uma patifaria", afirmou, aos berros, Bolsonaro.

Planalto tem 72h para se explicar
O juiz Francisco Alexandre Ribeiro, do Distrito Federal, deu um prazo de 72 horas para que o Palácio do Planalto apresente informações sobre a troca no comando da Polícia Federal. O coordenador nacional do Movimento Brasil Livre (MBL), Rubens Alberto Gatti Nunes, entrou nesta semana com ação popular na Justiça Federal pedindo a suspensão imediata da nomeação do delegado Rolando Alexandre de Souza para a diretoria-geral da PF.

Um dos pontos levantados na ação é que o presidente Jair Bolsonaro escolheu um nome "alinhado a seus interesses escusos, como ficou evidenciado em seu primeiro ato após empossado" - a troca no comando da Polícia Federal do Rio, área de interesse de Bolsonaro e seus filhos.

Nunes classifica ainda a escolha por Rolando como uma patente burla à decisão do ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal que barrou a nomeação de Alexandre Ramagem, amigo da família Bolsonaro, à chefia da PF. Isso porque Rolando Alexandre é pessoa de confiança de Ramagem.