Rio - A entrega da diretoria da Secretaria de Comunicação Social da Câmara dos Deputados (Secom) a um deputado da bancada evangélica, Cleber Verde (PRB-MA), e as primeiras intenções anunciadas de reduzir a programação cultural da TV Câmara — para aumentar a divulgação dos parlamentares, incluindo suas atividades nos finais de semana em seus estados — preocupa os servidores e vários partidos. O temor é de que a Comunicação da Câmara, que sempre foi dirigida por jornalistas concursados, passe a adotar uma linha editorial sob forte influência religiosa.
Às vésperas da mudança, uma repórter da Casa questionou o presidente Eduardo Cunha (PMDB-RJ) se era verdade que a secretaria deixaria de ser comandada por um jornalista concursado. Dias depois, o diretor de jornalismo da Secom, Antonio Vidal, foi exonerado e reconduzido à sua função anterior de repórter.
Dirigida desde a sua criação, há quase 20 anos, por profissionais de carreira, a Secom foi alvo de uma nova política implantada por Cunha na Mesa Diretora da Casa, que prevê a substituição de servidores por parlamentares na chefia de vários órgãos da Câmara. Na votação, partidos como PT, Psol, Pros, PCdoB e PPS colocaram-se contra a intenção de entregar a Secom a um parlamentar. Após a aprovação, o líder do PRB, deputado Celso Russomanno (SP), sinalizou que poderia haver redução da grade cultural da TV Câmara, com o argumento de que a Secom deveria focar mais na atuação parlamentar. Em entrevista ao Brasil Econômico, Cleber Verde não deixou clara a proposta de Russomanno.
“Entendemos que é preciso manter programas culturais de forma muito pontual. Não vamos dar fim a eles, mas vamos colocar parlamentares dentro do programa ou nos intervalos. A questão da cultura faz parte do processo legislativo, os deputados estarão ali apresentando e defendendo projetos relacionados ao assunto que estará em discussão”, afirmou o novo diretor da Secom, dando como exemplo a atração musical “Brasil Caipira”: “Vamos reservar o espaço, com a condição de que haja a inserção de um parlamentar e sua atividade”.
Os profissionais do sistema de comunicação — que inclui TV, rádio, jornal, site e estrutura de relações públicas — já convivem com as demandas da nova administração. Além das anunciadas mudanças na grade cultural, o novo diretor atendeu ao pedido do presidente Eduardo Cunha para que jornalistas da Secom passem a acompanhar os parlamentares em seus estados nos fins de semana, no projeto Câmara Itinerante.
De acordo com um profissional da Secom, a linha editorial da TV e da rádio — que mescla a transmissão dos trabalhos parlamentares com programas culturais e a exibição de filmes e documentários brasileiros — sempre incomodou aos deputados e eram comuns os pedidos de cobertura de eventos pessoais e agendas fora da Câmara. “O veículo de comunicação não trabalha para divulgar um deputado. Quem faz isso são as assessorias. Nunca tivemos censura, e isso incomoda. Eles querem cobertura de mídia do que fazem nos finais de semana, acham que isso vai melhorar a imagem deles”, diz a fonte.
Apesar das declarações de Russomanno, Verde dá garantias de que não há partidarização ou ingerência da bancada religiosa. “Não há caça às bruxas, não vamos partidarizar a comunicação ou fazer fundamentalismo religioso”. No entanto, o novo diretor da Secom confirma a possibilidade de que um profissional da TV Record seja nomeado para um Cargo de Natureza Especial (CNE). “Estou avaliando alguns currículos. Pode ser, sim, da Record, mas não tem obrigatoriedade de vir de lá”, contestou Verde.
A Record, cujo acionista majoritário é o Bispo Macedo, líder da Igreja Universal, tem Russomanno na sua grade de programação. Os servidores temem, por isso, a presença de funcionários da emissora na estrutura da Secom.