A entrada do ex-governador gaúcho Tarso Genro (PT) na política fluminense, para criar uma frente de partidos de esquerda e centro-esquerda, dará o tom do congresso estadual que o PT realiza amanhã no Rio de Janeiro. A expectativa é que o presidente regional e prefeito de Maricá, Washington Quaquá, suba o tom das críticas a Genro e coloque em votação uma resolução para frear a tentativa do ex-governador de criar dissidências em relação às alianças regional e nacional do PT com o PMDB.
Embora a manutenção oficial da aliança com o PMDB só possa ser decidida nas convenções petistas do ano que vem, Quaquá vai reafirmar amanhã a orientação partidária atual, que é a de apoiar o deputado federal e secretário-chefe da Casa Civil Pedro Paulo (PMDB-RJ), indicado pelo prefeito Eduardo Paes como pré-candidato no PMDB à Prefeitura do Rio em 2016. O encontro de amanhã é preparatório para o Congresso Nacional do PT, que acontece no mês que vem, em Salvador.
Numa das mesas de sábado, em que será feita uma análise da conjuntura e da organização partidária no estado, Quaquá terá a seu lado, como debatedor, o senador Lindbergh Farias (RJ). O parlamentar tem sido uma das vozes dissonantes em relação aos rumos do PT no estado. Petistas que apoiam o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) creditam ao senador a ruptura com o governo estadual, embora ainda haja a expectativa de o PT voltar a participar da gestão atual, por meio de secretarias.
O ponto mais crítico, porém, é o fato de Lindbergh encabeçar, ao lado de Tarso Genro e do deputado federal Alessandro Molon (PT-RJ), o movimento “A saída é pela esquerda”, que espera reunir hoje à noite integrantes de partidos como o Psol e o PCdoB, e petistas insatisfeitos com os rumos do PT. Além da presença no congresso, no qual Quaquá pretende fazer críticas ao ex-governador do Rio Grande do Sul, Lindbergh está confirmado para a reunião de hoje à noite.
Apesar disso, o documento de 26 páginas, intitulado “Campo da esquerda popular e socialista”, que funciona como guia para o congresso estadual do PT, admite que a ascensão ao governo federal em 2002 deu início ao desgaste da imagem do partido, “quando teve que fazer concessões à burguesia financeira para acumular forças e continuar governando”. O documento petista aponta ainda para o surgimento do Psol, a partir do momento em que houve indisposição “com nossas bases sociais históricas” e relata a ampliação do desgaste “depois de todo o processo de denúncias contra o partido, iniciadas pelo deputado Roberto Jefferson (PTB), e que culminaram na ação penal 470 (mensalão) e em todo o espetáculo midiático que a burguesia desenvolveu em torno dela”.
Outro ponto do documento que coloca em xeque a hegemonia das decisões de Quaquá e que promete dar trabalho ao prefeito de Maricá é a contundente crítica à aliança com o PMDB fluminense: “O PT do Rio de Janeiro, na capital e no estado, passou muito tempo sem altivez, apequenado e subordinado ao projeto de poder exclusivista e hegemonista do PMDB. Nos transformamos em uma sublegenda do PMDB, em troca de cargos e benefícios para alguns dirigentes e parlamentares”.
5 MINUTOS
TARSO GENRO
Ex-governador do Rio Grande do Sul
Qual é o objetivo do encontro de hoje?
Discutir a conjuntura nacional e avaliar a possibilidade de termos candidato próprio, no Rio, iniciando a formação de nova frente política — com os partidos e setores de partidos, intelectuais, movimentos sociais — destinada a pensar o Brasil, a partir das mudanças iniciadas pelos governos Lula e Dilma. Mudanças essas, que, em função da conjuntura internacional e nacional, estão dando sinais de exaustão.
Qual é a tônica dessa nova frente?
A visão que nos preside é mais crescimento econômico, mais distribuição de renda, taxas de juros menores, não ao financiamento empresarial das campanhas, e mais participação da cidadania nas grandes decisões públicas.
E por que a escolha do sr. pelo Estado do Rio de Janeiro?
Entendo a importância do estado e, sobretudo, a importância do arco político que se formou, no segundo turno, para eleger Dilma Rousseff. Não sou líder de nenhum movimento, não sou uma liderança nacional, mas me permito dialogar com todos os setores da esquerda e do centro democrático e progressista, em busca de soluções para o meu país, como fiz ao longo da minha vida. Não sou candidato a nada, nem no Rio nem no Rio Grande.
Como o sr. vê as críticas de Quaquá?
Encaro as críticas do presidente Quaquá como normais, pois o PT do Rio participa dos governos do PMDB, o que leva a relações de dependência política muito fortes. Isso não pode impedir que as pessoas discutam, defendam candidatura própria. Mas as críticas do presidente estão mal endereçadas. Eu não tenho liderança política no Rio, apenas sou um colaborador e debatedor de temas nacionais e regionais, dentro do partido, na academia, na sociedade civil. O que me preocupa é que essas críticas possam ser tomadas pela nossa militância — não por mim que sou “china velha”, como dizemos aqui no nosso Rio Grande — como uma vedação ao debate. Isso lembra o Maranhão, e não é nada bom. O partido lá terminou. Eu, atualmente, defendo que o PT no Rio tenha candidatura própria, mas nem sei se isso é a opinião de quem vai no debate hoje.
Essa entrada no cenário fluminense indica mudança do domicílio eleitoral do senhor?
Não estou tratando de mudar domicílio eleitoral, porque não tenho motivos para isso.