Em recente decisão, o Banco Central Europeu (BCE) introduziu um programa de alívio quantitativo por meio da compra de ativos soberanos. O pacote divulgado pelo presidente da instituição, Mario Draghi, deverá injetar estímulos monetários de até um trilhão de euros. O programa prevê a aquisição mensal de 60 bilhões de euros em títulos da dívida pública a partir de março deste ano. A geração de mais liquidez para os mercados europeus pretende amenizar a estagnação econômica e evitar a deflação. O objetivo é gerar mais possibilidades de investimentos para as empresas e de consumo para as famílias. No entanto, há o risco de tais facilidades diminuírem a urgência por reformas estruturais nos países-membros da União Europeia (UE), tornando-os dependentes das decisões de política monetária do BCE.
A prática anunciada pelo Banco Central Europeu (BCE) é conhecida como relaxamento quantitativo, já é exercitada há alguns anos por países, como EUA, Japão e Reino Unido. A ampliação da oferta de liquidez, agora também feita pelo BCE, deverá favorecer países emergentes, como Brasil, Índia e México, entre outros, já que haverá busca por maiores taxas de juros para investimentos.
Indícios dessas mudanças no fluxo de capitais nacional já podem ser vistos por meio do fluxo cambial da semana de 19 a 23 de janeiro. Até o dia 22, o fluxo estava negativo em US$ 341 milhões. No entanto, no dia 23 — um dia após a decisão do BCE — houve uma entrada líquida de US$ 1.097 bilhão, fechando positivamente o saldo semanal. Além dos rendimentos elevados da taxa de juros básica brasileira, a nova direção da política econômica deverá ter grande importância na recuperação da credibilidade do país.
Os investidores externos estão atentos às oscilações da moeda nacional e à deterioração da atividade e de outros indicadores. Portanto, as mudanças que serão guiadas pela nova equipe econômica, principalmente na área fiscal, serão fundamentais para manter a atratividade dos capitais estrangeiros, que vai além dos rendimentos monetários.
A determinação do BCE também deverá afetar a economia norte-americana. A queda nos preços do petróleo já está se refletindo na inflação — alento para os países importadores e retração para os países exportadores.
Neste início de ano, vários outros países com baixa inflação e juros também relaxaram suas políticas monetárias. Alguns exemplos são Índia, Turquia, Peru e Canadá. Um dos poucos países, em conjunto com Rússia e Venezuela, que optam por um aperto monetário é o Brasil, estratégia que voltou a ser aplicada a fim de contornar a inflação, que segue elevada em comparação com países similares. Por esse e outros motivos, o Copom, em sua última ata, deixou a porta aberta para os próximos passos da política monetária e confirma que ainda é cedo para prever quando será o fim do ciclo de aumento da Selic.
Mesmo com o andamento dos ajustes dos administrados, a perspectiva é de continuidade da pressão inflacionária, pelo menos em curto prazo, já que esses deverão, inicialmente, elevar ainda mais o nível de preços. Nessa linha, o último boletim Focus acentuou a previsão do IPCA para 2015, que foi para 6,99%, e reduziu a perspectiva de crescimento da atividade de 0,38% para 0,13%. Ou seja, o nível de atividade já está sendo afetado antes da melhora no nível de preços. Além disso, há os possíveis impactos do câmbio, intensificando a trajetória dos preços relativos na economia.
A evolução do câmbio também influenciará o curso da evolução do nível de preços. O câmbio está pressionado por fatores internos e externos. Externamente, a desvalorização dos preços das commodities impacta o real e moedas de outras regiões exportadoras desses insumos. O dólar também tem se fortalecido, em razão da evolução positiva dos indicadores norte-americanos.
Internamente, a piora nas contas externas também deve influenciar a moeda nacional.
Resta lembrar que a inflação está no limite do amplo intervalo de tolerância em torno da meta. Logo, qualquer desvalorização cambial mais acentuada irá demandar uma continuidade da política monetária mais restritiva vigente ou um ajuste fiscal mais forte. A última renovação do programa de leilões de swaps cambiais configurou-se de forma diferente das anteriores, ou seja, foi renovado por três meses — metade das renovações anteriores. Também não há sinais sobre a rolagem dos swaps para os próximos meses. O Banco Central, para eliminar incertezas desnecessárias, deveria evitar fixar calendários para o fim das operações de swaps, enfatizando, assim, que elas são temporárias e que podem acabar quando o momento exigir, principalmente na atual conjuntura de liquidez internacional abundante.
Neste início de ano, o real se valorizou em relação ao dólar e ao euro, num momento em que há necessidade do real não valorizado para ajustar os preços relativos da economia. No entanto, essa valorização não deve permanecer. É cada vez maior o risco de problemas sérios com o abastecimento de água para a indústria e a agricultura, e há também probabilidade crescente de dificuldades no fornecimento de energia elétrica, questões essas que poderão provocar novas desvalorizações para a moeda nacional. Dada a impossibilidade de trazer a inflação para a meta central de 4,5% em 2016, a prorrogação dos swaps cambiais combina com a menor intensidade do aumento das taxas de juros, devido à expectativa de um crescimento negativo do PIB para 2015. Portanto, o curso do câmbio, em conjunto com o do nível de preços, intensifica as incertezas acerca dos próximos capítulos na condução da política monetária.