Enquanto o Federal Reserve prepara o mercado para a primeira elevação nas taxas de juros em nove anos, as taxas efetivas continuam em níveis extraordinariamente baixos. Os juros dos títulos de dez anos nos Estados Unidos estão em torno de 2% ao ano, e para os de 30 anos a taxa é de 3%. O cenário não é diferente na Europa e em alguns países, como é o caso da Suíça, que oferecem juros nominais negativos.
Ben Bernanke, ex-presidente do Federal Reserve, em uma série de artigos para explicar esse fenômeno o atribuiu, entre outros fatores, a uma tendência secular de desinflação, provocada por um excesso de poupança internacional, proveniente de alguns países emergentes, como a China, e exportadores de petróleo. No entanto, mesmo com a expectativa de que o Federal Reserve inicie o processo de elevação das taxas de juros de curto prazo, as taxas de longo prazo não reagiram.
Nas taxas de juros de mercado está embutida a expectativa para a trajetória da taxa de juros de curto prazo no futuro, a expectativa de inflação e uma margem de prêmio a termo. As taxas de juros extremamente baixas estão precificando uma expectativa de inflação baixa, como também de atividade econômica fraca e, consequentemente, de juros baixos no futuro. Bernanke também atribui às taxas de juros baixas a redução do prêmio a termo, que é aquele sobre a preferência por liquidez no curto prazo quando o investidor adquire papéis de longo prazo. Prêmios menores podem estar relacionados à busca por segurança do investidor e a uma postura defensiva por meio de uma maior demanda por títulos de governo — tendência que havia sido reforçada pelo excesso de poupança internacional no período pré-crise e pelas políticas monetárias não convencionais ao redor do mundo no pós-crise.
Adicionalmente, taxas de juros comprimidas por longos períodos de tempo indicam queda também das taxas de juros de equilíbrio, ou seja, redução da taxa de juros de neutralidade da política monetária, patamar que não exerce impacto restritivo ou expansionista sobre a atividade. Enquanto juros elevados são compatíveis com economias dinâmicas, de elevado retorno do capital — ou, o comum entre economias emergentes —, inflação elevada e taxas mais baixas estão relacionadas ao pouco dinamismo da atividade econômica.
Dessa forma, o atraso na resposta da estrutura a termo das taxas de juros dos Estados Unidos está sinalizando, em primeiro lugar, uma grande demanda por seus títulos soberanos, devido ao excesso de liquidez internacional, e, em segundo lugar — mas não menos importante —, à pouca confiança na recuperação da atividade econômica. Apesar do crescimento acima do potencial, com a tão esperada geração de postos de trabalho, ainda não houve resposta da renda, e a inflação continua abaixo da meta de longo prazo. Adicionalmente, o fortalecimento do dólar em relação às demais moedas deve gerar impactos negativos sobre a atividade.
A maior preocupação com a apatia dos investidores, no momento, é a possibilidade de uma resposta tardia e, portanto, de uma correção mais forte, levando à elevação dos prêmios de risco e a uma volatilidade elevada. Por esse motivo, a comunicação do Federal Reserve tem sido feita de modo a conduzir às expectativas de que, apesar de chegado o momento de elevação das taxas de juros, estas continuarão em patamares históricos baixos por bastante tempo.
No caso da Europa a situação é diferente. Muito embora as ações do Banco Central Europeu tenham sido bem-sucedidas para recuperar o sistema financeiro, ainda não se conseguiu desobstruir o canal do crédito, e a atividade econômica reage mais lentamente na região. Enquanto nos Estados Unidos já foi iniciado o processo de normalização da política monetária, com o fim do programa de alívio quantitativo, o BCE delineou, recentemente, um novo programa de compra de ativos. Espera-se que o enfraquecimento do euro ante o dólar impulsione sua recuperação econômica. Assim sendo, a expansão monetária proveniente da Europa — como também do Japão —, devida à recuperação econômica tardia, tem ajudado a manter as taxas de juros nos Estados Unidos comprimidas.
As taxas de juros internacionais em patamares muito baixos também afetaram significativamente as taxas de juros no Brasil. Por muito tempo a liquidez internacional abundante sobrevalorizou o real e pressionou os juros para baixo. No entanto, o fortalecimento da economia americana passou a acompanhar um ciclo de fortalecimento do dólar em relação às demais moedas. Essa mudança do cenário internacional ajuda a explicar o porquê de, mesmo com taxas de juros internacionais ainda excepcionalmente reduzidas, a correção das taxas de juros no Brasil tem se dado de maneira tão expressiva. A taxa de juros real ex-ante, que mede a taxa de juros real esperada para os próximos 12 meses, hoje ultrapassa os 7% ao ano — o maior patamar desde 2008. Desequilíbrios internos na conta-corrente do balanço de pagamentos e nas contas fiscais, além da inflação elevada no curto prazo e de expectativas de inflação acima da meta no curto e no médio prazo, completam esse cenário.
O governo já conseguiu evitar o rebaixamento do rating brasileiro com as medidas de ajustes anunciadas. Resta, agora, estabilizar as expectativas inflacionárias e minimizar as consequências sociais das medidas já tomadas e das outras que ainda faltam ser implementadas. A economia brasileira, atualmente, ao absorver todos os reajustes dos preços administrados e do ajuste parcial do câmbio reprimido, já está mostrando recuos consideráveis. Resta, agora, calibrar melhor as taxas de juros, visando estabilizar as expectativas inflacionárias para atingir o centro da meta ao longo de 2017, e não em dezembro de 2016.