Se a memória não falha, era maio de 2012. Chegavam más notícias da Europa, que sofria com a nova etapa da crise iniciada em 2008. O Brasil passara ao largo da primeira onda negativa gerada pelo estouro do mercado de hipotecas nos EUA, mas dava sinais de que não conseguiria repetir o feito. A economia brasileira, desta vez, seria contaminada. Na tentativa de evitar o contágio, o governo recorreu novamente a medidas de incentivo ao consumo, como abatimento do IPI na compra de automóveis. Acreditava-se que o subsídio daria frutos, como dera em 2009. Em conversa informal na Fazenda um assessor do ministro Guido Mantega fez previsão otimista: “As pessoas vão correr às revendedoras, eu mesmo vou trocar de carro”. Um dos jornalistas ponderou que as famílias estavam com o pé atrás. Mas o técnico oficial insistiu: “Vocês vão ver!”.
Não deu certo. Falaram mais alto o endividamento e o fantasma da recessão em Portugal, na Espanha e na Grécia. Apesar dos incentivos, os consumidores se retraíram e por aqui a economia cresceu apenas 1% em 2012. No ano passado, não foi muito diferente. O governo insistiu com subsídios e desonerações, mas a taxa de investimento caiu e a indústria continuou a perder fôlego. Mantega, que falara em evolução do PIB de 4,5%, viu 2013 fechar em 2,3%, graças basicamente à agropecuária. Veio 2014 e o quadro se agravou, diante da necessidade de elevar a taxa de juros para conter a inflação. Juros elevados, é sabido, representam uma ducha no ânimo de empresas e famílias. Resultado: a cada semana, as previsões do mercado financeiro para o crescimento do PIB são piores. A última ficou abaixo de 1% pela primeira vez. E o próprio Ministério do Planejamento foi obrigado a refazer de 2,5% para 1,8% sua estimativa.
Entre os economistas, mesmo os simpáticos ao PT, estabeleceu-se um consenso: o estímulo ao consumo deixou de funcionar como mola propulsora do crescimento. Acima de tudo, é necessário restaurar os índices de confiança dos agentes econômicos. Isso, porém, só vai acontecer com medidas estruturais que eliminem antigos gargalos. Se a indústria nacional não investe e perde competitividade é porque convive com condições adversas. Entre outros fatores, a infraestrutura é precária, a carga tributária no Brasil é proibitiva e o câmbio valorizado incentiva importações e limita a capacidade de aumentar exportações. Nesse ambiente inóspito, a produção industrial não para de encolher. Tecnicamente, o setor já se encontra em recessão. E os assalariados começam a se preparar para o pior, que é a ameaça de desemprego.
Portanto, a economia brasileira inspira cuidados. E parece exigir medidas de fundo. Mas o governo não vê dessa maneira. Continua a apostar na mágica do consumo. Esta é a única justificativa para o pacote anunciado pelo Banco Central na sexta-feira, que eleva em R$ 45 bilhões o volume de crédito, com mudanças no depósito compulsório e nas exigências para empréstimos de longo prazo. Seria chover no molhado apontar contradição com a decisão do Copom de não baixar a taxa básica de juros. Na ata da reunião, o Copom afirmou que, no momento, não considera recomendáveis subsídios para operações de crédito. Ao voltar atrás, certamente teve bom motivo. Mas a dúvida de 2012 persiste: Será que os consumidores vão às compras? Será que os empresários vão investir?