Por diana.dantas

Numa entrevista especialmente inspirada, em que encontrou espaço para citar Machado de Assis e Cecília Meireles, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afirmou que a economia brasileira está vivendo uma espécie de ressaca. O Brasil, explicou, enfrenta a força das águas de que o escritor falava (em “Dom Casmurro” sobre o olhar de Capitu) e “isso tem afetado as decisões das empresas, as perspectivas para o futuro e a confiança na economia”. Mas ele garante que esse momento de dificuldades vai passar. “Nossa estratégia é preparar o país para o período de pós-ressaca”. Baseado em sua experiência de iatista amador, que costuma navegar na Baía de Guanabara nos fins de semana, Levy explicou que é importante se preparar e conduzir com segurança no meio do mar bravio: “Não pode deixar o barco bater nas pedras”. Vindo de quem vem, é uma advertência grave, de meter medo em empresários e consumidores.

Mas, pelo tom do ministro da Fazenda, fica claro que ele mantém a tranquilidade de quem acredita que a nau está sob controle. Que assim seja. A torcida dos passageiros é que o condutor da economia esteja de fato no comando da situação. Seria terrível se Levy cometesse, por exemplo, o equívoco do capitão italiano Francesco Schettino, que jogou seu imponente cruzeiro contra as pedras no Mediterrâneo. Também seria desastroso se Levy baseasse sua confiança em dados equivocados, como aconteceu com os responsáveis pelo transatlântico Titanic, em 1912. O proprietário e os construtores da embarcação garantiam que, com o casco dividido em compartimentos, não havia risco de o colosso afundar. Sabe-se, hoje, que o casco foi cortado como uma lata de sardinha por um iceberg. O Titanic bateu no gelo e afundou.

Por mais pessimistas que sejam, os analistas não preveem o mesmo destino para a nau de Joaquim Levy. Afinal de contas, estamos todos no mesmo barco. E temos de torcer para que o capitão consiga ultrapassar a tempestade sem bater nas pedras. Só que o horizonte da economia continua bastante sombrio e não transmite segurança a ninguém. Por enquanto, nada indica que a força das águas vai diminuir. Ao contrário, o próprio Banco Central acaba de refazer para pior suas projeções sobre o desempenho da economia. No relatório trimestral da inflação, o BC ampliou de 0,5% para 1,1% a queda do PIB este ano. Já a inflação deverá subir para 9%, contra a previsão anterior de 7,9%. Caso os números se confirmem, será o pior resultado do PIB em 25 anos e a maior taxa de inflação desde 2003.

Conformado, o diretor do BC, Luiz Awazu, diz que 2015 é um ano de ajuste tradicional. À semelhança de Levy, explica que a economia vai se recuperar. Segundo ele, numa primeira fase do ajuste, foi necessário aplicar um freio à atividade, o que foi acompanhada de forte queda no investimento. Uma segunda etapa foi a do impacto do ajuste na inflação, com a correção de preços administrados. Virá, então, a terceira fase, com resultados melhores que sinalizam horizonte de estabilidade com inflação na meta de 4,5%. Para isso, porém, tudo indica que haverá necessidade de novos aumento dos juros básicos. A consolidação do processo de ajuste “requer determinação e perseverança”, afirma Awazu, repetindo os termos da ata do Copom.

Como se vê, Fazenda e BC estão mais afinados do que nunca. Garantem que o barco sairá incólume e já fazem planos para o período pós-ressaca. Mas não custa acender uma vela para Nossa Senhora dos Navegantes.

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