Gastão ReisDivulgação

O segundo plebiscito sobre uma nova constituição para o Chile foi, em boa hora, rechaçado pela população chilena. O placar foi de 55 a 44%. Curiosamente, no primeiro plebiscito, a recusa dos chilenos foi de uma Carta eivada de uma visão de esquerda que dava ao Estado a condição de salvador da pátria. Nesta segunda recusa, o texto tinha até caráter conservador e de direita. E, espertamente, o povo chileno
disse não. Por quê?
É preciso recorrer à História chilena para entender. O Chile sempre foi um país diferente no contexto latino-americano. De certa forma, lembra a excepcionalidade do Brasil até 1889, no sentido de ter orçamento impositivo em que o escrito era cumprido e respeitado. E ter uma auditoria rigorosa das aplicações do dinheiro público. E ainda educação pública de qualidade. Muito diferente do caso dos argentinos com quem
mantinham uma forte rivalidade.
O estranho nessas duas recusas é que continua valendo a constituição imposta por Pinochet. (Deixo claro minha antipatia pela figura). Como entender então a reação do(a)s chileno(a)s uma vez que, em consulta popular anterior, eles foram, majoritariamente, favoráveis à promulgação de uma nova Carta.
Certamente, alguns fatores positivos pesaram nessa aparente contradição. O Chile tem hoje uma renda per capita pelo critério do PPP (Paridade do Poder de Compra) em torno de 24 mil dólares, que é o dobro da nossa. Podemos detestar as atrocidades cometidas pelo gal. Pinochet, mas é forçoso reconhecer que ele chamou profissionais para conduzir a política econômica do país sem se meter em coisas que desconhecia. Bem diferente do nosso caso. Por trás, estava a Escola de Chicago, Friedman e os Chicago boys tão ridicularizados pela imprensa brasileira na época.
Os números mostram que o Chile decolou, podendo ser considerado um país desenvolvido. Ou muito perto disto. E nós marcando passo há quatro décadas, em boa medida, em função da Carta de 1988, que travou o país. O Chile seguiu uma política liberal na economia, reduzindo o tamanho do Estado para não atrapalhar seu desenvolvimento. E a coisa funcionou.
Quando Pinochet consultou a população e outorgou uma nova constituição, ele convocou um grupo de juristas competentes que não misturaram no texto da Carta legislação constitucional de boa qualidade com a legislação ordinária (e esta pode ter duplo sentido) no corpo da nova Carta. Tem 40 anos e, na verdade, proporcionou ao Chile o desenvolvimento que nós não tivemos, exatamente nos mesmos 40 anos.
O chileno é um povo educado e bem informado. Sabe do que aconteceu com Cuba, Nicarágua e Venezuela, e não quer embarcar em canoa furada. Pouco se diz, mas o trágico governo de Allende, em seu melhor momento, nunca tingiu popularidade superior a 40%. Normalmente, tinha oposição de 2/3 da população contra suas medidas socializantes. Como seguir na direção desejada por Allende nessas condições? Acabou abrindo espaço para o terrível golpe dado por Pinochet. 
O atual presidente do Chile, Gabriel Boric, tem memória aguda destes fatos, em especial após sua aprovação ter despencado para 37%. Já pôs um ponto final em matéria de mudança de constituição. Até que surja algo equilibrado, é preferível continuar crescendo com a atual Carta.
Nota: Digite “Dois Minutos com Gastão Reis: Confiança a ser reconquistada”. Ou pelo link: https://www.youtube.com/watch?v=CLG9Q7cY12E
* Gastão Reis é economista e palestrante
E-mails: gastaoreis@smart30.com.br// ou gastaoreis2@gmail.com
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