Nesse calor que não dá refresco, e que agora chega em ondas pelo país, decidimos fazer o churrasco ao anoitecer, quando os termômetros baixam um pouco dos malditos trinta e tantos graus e dá até mesmo pra sentir uma pequena brisa no ar. E como pede esse verão, um churrasco feito na pedra, à moda antiga, no quintal, sob o abrigo da parreira de uva.
Afinal, a pedra remete à caverna, que remete aos homens dessa caverna aqui de Água Santa. Tudo parecia Serra dos Pretos Forros. A única luz que se via, vinha do pisca-pisca dos pirilampos, que nós aqui nem tínhamos ideia que ainda sobreviviam.
O breu ameaçou, mas não impediu o churrasco.
– O jeito é fazer à moda antiga – arriscou Ibiapina. – Será uma confraternização à luz de velas e do lampião.
O fundo musical ficou por conta da cantoria do assobio de um sabiá-laranjeira, uma das poucas aves boêmias, que baixou por essas bandas já faz algum tempo. Mas, antes mesmo de seguir com o evento, foi preciso correr para tirar da tomada todos os eletroeletrônicos da casa, pelo receio razoável de que algum pico de luz no momento da volta da energia pudesse queimar os aparelhos.
O blackout dessa vez deixou até mesmo um bom trecho da Linha Amarela às escuras. Céus, há quanto tempo eu não via a escuridão tomar conta daqui da região! Parecia até que a gente estava no meio da mata. Não se enxergava nada. Claro, até acender o lampião.
Lembrei, e cheguei a comentar com a turma, do tempo que a escuridão tinha hora marcada na Vila do Abraão, na Ilha Grande, quando a luz elétrica que vinha de um gerador do presídio, era desligada ainda cedo, ao cair da noite, deixando a população sob a luz eventual do luar. A pequena população da vila, então, andava renitente naquelas ruas, na maioria, de barro, tendo cuidado para não tropeçar em buracos e obstáculos no meio do caminho.
– Quem diria, que hoje não tem nem mesmo Luar nessa caverna – brincou Nelson.
E eu retruquei: está em greve.
Luz de lampião, canto de pássaro, agora era necessário pôr a pedra em ponto de brasa. Que jeito? Pra aquecer a pedra nós usamos uma antiga lamparina de solda a querosene, que era o instrumento usado por bombeiros hidráulicos nos anos 50, 60, que eu ainda tenho algumas aqui no meu baú de velhas utilidades. Pouca gente usou, os mais novos nunca ouviram falar. Uma espécie de maçarico do passado, do tempo do Onça.
Foi ela, a lamparina de solda, que manteve o altíssimo grau de calor da pedra do churrasco. Depois de tudo equacionado e funcionando, a energia resolveu, duas horas depois, dar o ar da graça.
– Deixa tudo como está e vamos curtir o churrasco às escuras na caverna – defendeu Júlio.
Tudo, menos a tomada da geladeira, põe para gelar a cerveja. Afinal, essa não é do tempo das cavernas! E pra quem já está ardendo nesse calor de maçarico, atenção, atenção!
O calor vai continuar.... e aumentar!!!