Estava recarregando os bebedouros das aves que gorjeiam pelo principado quando avistei um vizinho que descia a rua pra trabalhar, vestindo um terno de risco de giz, camisa de linho, gravata e.… tênis. Pensei: por onde será que andam os sapatos de cromo alemão, bico fino ou quadrado, que um dia foram sinal de status em qualquer evento? Os meus, por exemplo, estão guardados no armário e bem cuidados para não deixar que a poeira do tempo os carregue para mais longe ainda da memória. A última vez que os vesti foi no casamento do amigo Athos, que aliás, calçava tênis de marca.
Hoje, é fato, os sapatos, botas, sandálias (mesmo as do pescador) vêm perdendo cada vez mais espaço por essa praga que domina o mercado dos pés. Tornou-se o pisante oficial nos esportes e em eventos sociais como casamentos batizados, premiações. Recentemente, o primeiro ministro canadense Justin Trudeau surpreendeu ao calçar um tênis colorido adidas, durante a visita do rei Charles e da rainha Camilla ao Canadá. E olha que não foi sequer o primeiro Trudeau a pisar no protocolo cerimonial: em 1981, o pai dele, Pierre Trudeau, também usou tênis num evento oficial com o presidente João Figueiredo, durante uma visita ao Brasil.
Ainda pensando em calçados novos e antigos, reabasteci a ração para os pássaros e a cadela, recolhi as folhas caídas e sentei na varanda pra conversar com o primeiro veterano a chegar para o encontro de quinta-feira, o amigo Júlio, que também usava tênis.
A conversa sobre o pisante levou a outra: ninguém mais quer saber o que o pé veste, mas o que pisa. E o que importa, no momento, são as tais terras raras. Aliás, não se trata de um punhado de areia, mas do metal mais precioso dos novos tempos. Fundamental pro futuro energético, dizem.
Nesse momento, chegaram os amigos com seus tradicionais acepipes e engradados de cerveja, enquanto a patroa passava o café pra início de conversa.
Nesse momento, chegaram os amigos com seus tradicionais acepipes e engradados de cerveja, enquanto a patroa passava o café pra início de conversa.
E, como entre veteranos tudo remete ao passado, o assunto deixou o futuro em direção ao passado. Hoje, o presidente Pato Donald Trump vocifera, ameaçando o mundo com seus tarifaços, só pra garantir seu quinhão de metais críticos, e já anunciou que iria anexar a Groelândia e comprar o Canadá. Aqui no Brasil, no passado, a erva-mate (sim, a do chá) foi o motivo do conflito que ficou conhecido como a Guerra do Contestado, uma brigalhada por um território que ficava na fronteira entre Paraná e Santa Catarina que foi chamado de "Contestado" por que os dois estados contestavam a posse da região, rica em erva-mate e madeira.
Agora, a moda entre chefes de estado deixou os pisantes e subiu pras cabeças, que agora usam bonés com palavras de ordem pra ficar bem na foto: começou com o próprio Pato Donald Trump, que vem vestindo um com a frase “Faça a América Grande de Novo”. O presidente brasileiro pegou a dica e já vestiu “O Brasil é dos brasileiros”. A moda do boné ativista pegou e o primeiro-ministro da província de Ontário, no Canadá, Doug Ford, mandou na própria testa um “O Canadá não está à venda”!
Os sapateiros, hoje em dia, cuidam dos tênis e os velhos calçados estão cada vez menos em uso. Mas, como foguete não dá ré, vou cuidar direitinho do meu par de tênis!

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