Ações reforçam lado positivo da periferia cariocafoto de divulgação

Apesar de sua inegável pujança cultural, a periferia carioca é historicamente negligenciada.  Não resta a menor dúvida de sua riqueza e perseverança para furar os bloqueios elitistas. Ela nos deu parte da base não só da cultura brasileira, mas também de movimentos que conquistaram o mundo e que imprimem a imagem brasileira no exterior.
Em poucas palavras, podemos citar: Escolas de Samba, Quadrilhas Juninas, Baile Charme do Viaduto de Madureira, Jongo da Serrinha, Black Music Brasil… Mesmo com esses inegáveis legados, a cultura e o cotidiano da periferia ainda encontram pouquíssimos espaços midiáticos que não seja através das páginas e editorias dos noticiários policiais.
No entanto, nos próximos dias, duas ações podem ajudar na abertura desse quadro.
Bom dia Favela
Tentando reverter a baixa audiência no Rio de Janeiro, em boa parte por conta da programação ser quase totalmente paulista, a atual direção regional da Band Rio se esforça para reverter a situação e está relançando sua grade local. Ela foi praticamente banida ou vendida para programas religiosos nas últimas duas décadas.
Ressaltando que o antigo Canal Sete foi um dos maiores produtores da praça carioca. Na década de 80 chegou a ter mais de oito horas diárias locais, programas ancorados simultaneamente pelas duas praças (com apresentadores no Rio e em São Paulo) ou nacionais produzidos para toda a rede direto dos antigos estúdios da Rua Álvaro Ramos em Botafogo.
Neste pacote de reocupação carioca, destaca-se o “Bom dia Favela”, um jornal positivo que pode fazer diferença no paradigma da mídia atual e não ficar restrito a criminalidade e a miséria como únicas narrativas referentes às comunidades. Diário, estreia no dia 4 de setembro, às 8h00.
O programa será apresentado por Joyce Alves, Camila Monteiro, Leon Marques, Wic Tavares e João Vitor Nascimento. Formado o elenco, o grande desafio é não repetir, de uma forma inversa, o mesmo erro dos demais noticiários.
Ao mesmo tempo em que pode ser o diferencial na televisão atual - onde a diversidade não é proporcional nem no jornalismo assim como nas artes e teledramaturgia - a nova atração deve tomar cuidado para não cair nas mesmas armadilhas dos concorrentes.
A foto de divulgação já demonstra que o caminho pode ser tortuoso e o tiro sair pela culatra. Apesar da intenção positiva todo cuidado é pouco para que o conteúdo não escorregue e acabe reforçando preconceitos. Sabemos da realidade da desigualdade social. Mas por que somente apresentadores pretos para um programa que fale justamente de Favelas?
Embora infelizmente seja maioria, mas será que somente negros moram nessas comunidades? O desafio da nova atração não é justamente quebrar os mesmos estereótipos que fazem com que negros sejam os mais parados em blitzes, os mais vigiados em lojas e supermercados e os mais apontados aleatoriamente como autores de crimes?
Bem-vindo ao programa que tem tudo para ser disruptivo se conseguir desvencilhar-se do lugar comum.
Subúrbio Singular
Começando pelas obras de três artistas periféricos, a Coleção Subúrbio Singular tem lançamento no próximo dia 31 na Biblioteca Popular Municipal Cecília Meireles Meireles em Jacarepaguá. O movimento contará com tarde de autógrafos, seminários e oficinas para crianças. A coleção da Atelier Editora selo editorial da plataforma Atelier Cultura inclui as obras inéditas dedicadas ao trabalho dos artistas visuais Ana Hortides Andréa Hygino e André Vargas.
O projeto tem como objetivo fortalecer a produção artística suburbana e foi selecionado no Programa de Fomento à Cultura Carioca (FOCA) da Secretaria Municipal de Cultura com apoio da Prefeitura do Rio de Janeiro.
A coleção surge do desejo de fomentar e dar visibilidade à produção de artistas visuais emergentes negros e LGBTQIAPN+ nascidos ou que desenvolvam suas práticas artísticas em subúrbios do Rio de Janeiro cujo trabalho verse ou reflita sobre questões periféricas.
“Subúrbio Singular vem do desejo de fomentar a prática artística oriunda do subúrbio da cidade do Rio de Janeiro, mapeando artistas emergentes, mulheres, negros e dissidentes que desenvolvam por meio de seus processos artísticos questões urgentes à contemporaneidade, e, desse modo, pensando e elaborando seu primeiro livro de carreira”, explica Ana Hortides, artista e organizadora da coleção.
Todas as publicações têm tradução dos textos para o inglês e trazem discussões múltiplas e interdisciplinares urgentes à contemporaneidade, como moradia, território, protagonismo feminino, descolonialidade, língua, etnografia, ensino e educação.
"Estamos empenhados em ampliar o acesso à publicação e ao trabalho desses artistas e curadores tão ativos na cena contemporânea. Assim, distribuiremos gratuitamente uma cota das publicações em seu lançamento na Biblioteca Cecília Meireles, no Pechincha, quando teremos oficinas gratuitas com os artistas para os moradores e escolas do entorno”, conta Joana Nantes, produtora e organizadora da coleção.