Rafael Nogueira Divulgação

Outro dia, um amigo, desses que acham que descobriram o fogo, veio com a velha máxima: "Os extremos são perniciosos. Nem esquerda, nem direita. O equilíbrio está no centro."
Respirei fundo. Essa ideia de centro como terra prometida é apenas um disfarce sofisticado para a covardia intelectual. É o esconderijo dos que preferem não se comprometer, acreditando que, ficando no meio, escaparão de serem criticados. Mas, no final, acabam esmagados pelos dois lados, como quem tenta atravessar a rua devagar demais no meio do tráfego.
O problema não está no equilíbrio real, que exige reflexão e sabedoria. Aristóteles já o defendia, e ele, convenhamos, sabia do que falava. O problema está na falsa moderação, que não passa de uma diluição do erro, um meio-termo entre a catástrofe e o caos, como quem, diante de um copo de leite estragado, decide beber só um gole, achando que assim evitará o mal-estar.
Ser moderado não é ficar parado no meio do campo, esperando a bola vir aos pés. O jogador que se mantém imóvel acreditando que o jogo se equilibra sozinho acaba sendo driblado pelo adversário ou, pior, perde a chance de marcar um gol. O verdadeiro equilíbrio exige movimentação, inteligência tática e a percepção de quando é preciso avançar para o ataque ou recuar para se defender. Mas os adeptos do centro preferem ficar observando, esperando que o jogo se resolva por conta própria, sem perceber que, assim, nunca saem do zero a zero.
A natureza equilibra forças; as ideias, não. Se um conceito é correto e outro não, misturá-los não produz um ponto intermediário virtuoso, mas sim um erro revestido de moderação. A burguesia, sempre ansiosa por parecer sensata, adora esse jogo: acredita que com isso desarma a esquerda. Mal percebe que, há séculos, a esquerda a manipula, empurrando o campo de batalha sempre um pouco mais para lá, enquanto os supostos moderados cedem pouco a pouco.
Há um método nisso tudo. Criam-se extremismos fictícios para que os ingênuos corram para o "meio", onde aceitam absurdos com um verniz de razoabilidade. Mas o meio-termo entre um furto e um assassinato ainda é um crime. Se um grupo defende princípios sólidos, logo surgem os arautos da prudência para chamar isso de "radicalismo" – porque, no fim, a espinha dorsal incomoda os que se acostumaram a viver curvados.
Se cada lado político tem uma parcela de razão? Pode ser. Mas a verdade não é um bufê onde se pode pegar um pouco de cada coisa para criar um prato equilibrado. Algumas verdades não aceitam mistura. Descobri-las exige estudo sério, não essa preguiça disfarçada de ponderação.
Direita e esquerda não são blocos homogêneos. São labirintos de ideias, crenças e contradições. Entendê-los exige exige curiosidade genuína, experiência de vida e uma boa dose de ironia.
Se há algo aproveitável na esquerda antiga, talvez seja a preocupação com os pobres. Mas isso não precisa vir com fuzilamento na embalagem. A direita pode ressignificar essa responsabilidade sem precisar exaltar Karl Marx. Mas, claro, isso exigiria um esforço que poucos estão dispostos a fazer.
O problema da direita não é o fanatismo, mas a ilusão do individualismo absoluto. Como se aceitar hierarquias e trabalhar em grupo fosse um atentado à liberdade. Como se reconhecer a importância da comunidade de que faz parte fosse sinônimo de coletivismo. Assim, enquanto a esquerda trabalha por seus objetivos, a direita se ocupa de denunciar os males do mundo, esquecendo-se de plantar aquilo que defende. Uma perda de energia.
Por isso, pensar exige mais do que encontrar um ponto de conforto. Quem busca a verdade não se contenta com soluções mornas. A verdade pode estar em um extremo, no outro, no meio ou fora de qualquer eixo. Mas uma coisa é certa: ela não se revela para quem se acomoda na neutralidade ilusória. Porque a verdade é para os fortes.