Por karilayn.areias

Rio - Para Alinne Prado, repórter e apresentadora do ‘Vídeo Show’, da Globo, usar turbante nunca foi questão de moda. Seja em casa, na rua ou na bancada do programa vespertino de variedades, Alinne defende um melhor conhecimento sobre o adereço. Tanto que ela participará da oficina gratuita ‘Odarah — Turbantes e Memórias’, ministrada por Fabíola Oliveira, hoje, a partir das 15h, no Instituto Black Bom (Rua do Senado 338, Centro). O preço do turbante é R$ 10.

Alinne Prado adora usar turbantesDivulgação

“O uso do turbante é uma forma de coroar as mulheres negras. Sou contra a apropriação cultural. Mas não sou contra as mulheres brancas usarem turbante, que deixa os cachos lindos. Espero que elas se aprofundem sobre o significado dele. No Oriente Médio, os homens usam turbante. No período pós-Segunda Guerra, as mulheres o usavam como acessório de moda e para esconder o desleixo capilar”, rememora. “Carmen Miranda é um ícone da cultura brasileira e usava o turbante com as frutas tropicais. Acho interessante o uso dele por todas as pessoas. Só que quando as mulheres negras usam o turbante, são apontadas como macumbeiras, e quando uma mulher branca o usa, é adereço de moda. Isso que é de se condenar”, salienta a apresentadora de 34 anos.

ALGUNS SIGNIFICADOS

A iniciativa é organizada pelo Odarah Produção Cultural Afirmativa e tem como objetivo trocar experiência entre as participantes. “Vou falar sobre a minha vivência. E mais que isso, ouvir e aprender”, frisa. Segundo a jornalista, o turbante virou uma forma de representatividade de uma resistência, de valorização da cultura e história negra. “O turbante é usado no candomblé para proteger a cabeça, pois tudo de bom e ruim entra pelo ori (região na frente da testa). As mulheres de religião de matriz africana o usam como proteção nessa área durante as festas. O tipo de amarração que faz no turbante mostra até de que casta, tribo você é”, explica ela, cuja religião é “seguir o preceito cristão de amar o próximo como a si mesma”.

LIBERDADE NA CABEÇA

Sheron Menezes e Alinne usam turbantesReprodução

Alinne se considera uma resistente. Desde pequena ela tem orgulho do cabelo e hoje é reconhecida pelos seus cachos exuberantes. Mas o exemplo não veio de casa — neste caso, da mãe, dona Gil, de 67 anos. Pelo contrário. “A minha mãe com 10 anos alisava o cabelo. Isso era um crime que ela fazia contra ela mesma. Ela esquentava o ferro no fogão para alisar o cabelo. Ficou careca três vezes por uso de química. A vida inteira foi escrava do alisamento, por imposição da ‘cultura’ de que o bonito era ter cabelo liso”, lembra a filha. Dona Gil só conseguiu assumir o cabelo crespo natural este ano por conta da filha. Hoje, há mais de um ano sem química, Alinne conta que a mãe está bem mais feliz. “Ela está num empoderamento absurdo. Se sentindo maravilhosa. Parece que virei missionária da transição capilar. Não sou contra a mulher negra alisar o cabelo. Ela tem que se amar, se respeitar, se entender e entender a história dela e de onde ela vem”, reforça.

BULLYING NA INFÂNCIA

Quando pequena, Alinne sofria bullying no colégio onde estudava. Era a única menina negra da sala de aula, e no recreio não tinha bonecas bonitas, como as colegas. “Me chamavam de preta suja, de macaca”, lamenta. “Me trancava na biblioteca e lá conheci a obra de Machado de Assis. Ele era mulato, epilético, extremamente tímido e conseguiu se alimentar de cultura e ascender socialmente. Foi um exemplo para mim. Me tornei uma leitora voraz para entender os movimentos sociais. E entendi que a cultura branca e católica classificou tudo que é do negro como algo menor e inferior. Tentaram apagar nossa história e cultura. A dominação de um povo se dá através da queima de sua história e da cultura. Por isso, a resistência é importante”, defende.

SEM RADICALISMOS

A valorização pela beleza natural da mulher negra e a história africana são bandeiras carregadas com orgulho pela repórter. Para ela, a educação é redentora e tem papel transformador. “Minha origem é pobre. Nasci no Morro do Dendê, na Ilha do Governador. Moro hoje em uma cobertura. Nada é fácil, tudo é fruto de muito esforço. Meu pai sempre me falou que se eu quisesse alguma coisa na vida tinha que trabalhar”, conta ela, que mora no Recreio dos Bandeirantes. Mas deixa claro que é avessa aos exageros. “Não quero me tonar uma xiita. Os movimentos acabam tendo radicalismos e temos que compreender bem até a limitação do outro”, pondera.

POR UMA TV MAIS COLORIDA

Para Alinne turbante é muito mais que modaDivulgação

Na primeira vez em que assumiu a bancada do ‘Vídeo Show’, Alinne lembra que foi emocionante. “Recebi mensagem da Taís Araújo, a Cris Vianna chorou comigo no corredor do Projac. Quando vejo uma vitória da Taís e do Lázaro (Ramos), da Cris Vianna, é uma vitória minha. Torcemos uns pelos outros. A ‘Malhação’ tem mais diversidade. Entendo a minha importância na TV. A maioria dos meus seguidores é negra e são pessoas que se reconhecem em mim. Assim como me via na Glória Maria, Zileide Silva, Dulcinéia Novaes, Taís Araújo. Está tendo uma mudança. Durante muitos anos, andei sozinha. Hoje, consigo ver mais similares. A TV, como ‘grande máquina de Narciso’, agora é mesmo em cores!”, exclama.

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