Biografia da cantora recorda mortes do filho e de dois irmãos. "A gente não supera. Vai guardando alegrias e tristezas no coração", diz
Por karilayn.areias
Rio - Na entrevista que concedeu a este caderno em janeiro, Wanderléa estava animada com o primeiro musical que faria em 50 anos de carreira, '60! Década de Arromba - Doc. Musical'. Que inclusive volta ao cartaz a partir do dia 4 de janeiro, no Theatro Net Rio, em curta temporada. Começamos e fechamos o ano com a Ternurinha. A cantora continua cheia de vigor e entusiasmada. Mas agora o motivo é o lançamento da tão esperada autobiografia.
Foram 20 anos juntando os manuscritos que deram origem a 'Foi Assim' (Ed. Record, 392 págs., R$ 39,90). Com pesquisa e edição de Renato Vieira, Wanderléa revisita uma vida marcada por sucessos e experiências pessoais trágicas. Como o acidente do então namorado José Renato, filho do apresentador Chacrinha, que o deixou tetraplégico; a perda de dois irmãos, Bill que era seu estilista e uma espécie de assessor, por complicações relacionadas à Aids, e Leninha, vítima de bala perdida aos 17 anos.
E ela também teve uma das maiores dores que se possa sentir: a morte de um filho. Leonardo se afogou, aos 2 anos, na piscina de casa, recém-comprada com o marido Lalo Califórnia. Mas 'Léa', como é carinhosamente chamada em família e pelos amigos, é uma mulher corajosa. E esse livro mostra isso.
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"Escrevi como uma terapia. Trabalhava o tempo inteiro, passei por momentos muito difíceis. Não tinha tempo de viver essas emoções inteiras. Como sempre gostei de escrever, nas horas vagas comecei a vivenciar os episódios, os sentimentos que vinham", lembra a cantora. "E fui juntando um material grande. Ouviram que eu estava escrevendo e fui convidada pra fazer o livro".
Embora tenha decidido escrever, ela confessa que se assustou com o assédio para que fizesse a biografia. "Fiquei em dúvida porque eram coisas muito pessoais. Pensava: 'A quem pode interessar isso?' Os amigos me convenceram a dividir as memórias com o público, que sempre me trouxe carinho. Era íntimo. Me desnudei", diz. E revela o motivo: "Queria mostrar que as pessoas também têm outro lado. Somos muito vulneráveis. O trabalho me ajudou muito a superar tudo que vivi".
Superar? "Na verdade, a gente não supera. Vai guardando dentro do coração, as alegrias, as dificuldades da vida. Foi tudo muito intenso, não tive tempo de viver a dor. Tinha que estar em cima do palco, feliz, fazendo meu trabalho".
AS GLÓRIAS
De um lado, tristezas. De outro, os sucessos, as histórias da música e curiosidades dos bastidores. "A editora viu meus escritos e percebeu que faltava falar das glórias. Porque tive muitas. E o Renato (Vieira) veio organizar isso, levantar a memória, as curiosidades. Juntamos os capítulos muito intensos com a carreira e deu esse resultado maravilhoso", conta.
A biografia tem o mesmo nome do sucesso eternizado na voz da cantora, 'Foi Assim' (Ronaldo Corrêa e Roberto Corrêa, 1967). Lançada há 50 anos, a canção esteve na trilha de 'Rainha da Sucata', em 1990. E o livro revela histórias como a da amizade com Roberto Carlos, de quem recebeu o primeiro beijo na boca, e com Erasmo Carlos, que tentou diversas vezes namorá-la, durante o auge da Jovem Guarda, movimento que se desdobrou em programa de TV, discos, shows e filmes.
"Algumas fãs idealizavam Roberto e Erasmo como grandes partidos. Outras os viam como figuras públicas que poderiam lhes dar status e um passaporte para a fama", escreve em trecho do livro.
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AUTORAL
Aos 71 anos, ela é casada com seu produtor e guitarrista, Lalo Califórnia, desde 1981. Com ele, tem as filhas Yasmim Flores, 32, e Jade Salim, 26. Ela revela nesta entrevista que tem planos de fazer um trabalho mais autoral.
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"Seria um trabalho meu e do Lalo, coisas que criamos juntos. Um sonho nosso, pessoal e profissional. Ele é um grande compositor", entrega Wanderléa, que lançou este ano um CD com canções da Sueli Costa, 'Vida de Artista'.
Prestes a se tornar avó de uma menina (sua filha Yasmim pode dar à luz a qualquer momento), a cantora mineira vive uma fase fértil por todos os lados. "Tem a chegada da neta, o livro e o musical, que volta para o Rio em janeiro. Não procuro os projetos. Eles vão chegando, e vou administrando para realizar".
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MUSICAL
Celebrando a carreira e o sucesso da sua estreia nos palcos de um teatro, Léa se prepara para reestrear em solos cariocas '60! Década de Arromba - Doc. Musical'.
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"Fico achando que vai terminar e o público pede mais. Estou curtindo fazer. O grupo é ótimo, são como filhos. Quando pararmos, vou sentir falta. São 60 pessoas envolvidas", diz. Mas a ausência dos colegas é passageira, já que o musical vai para São Paulo. "Temos propostas de seguir com ele na estrada. Temos convites para ir pra Dubai e para os Estados Unidos".
E sobre a experiência de escrever? "Gostei bastante do resultado. Tem passagens do livro que me emocionam ainda hoje. Os acontecimentos ficam guardados em nós, e o livro foi uma forma de liberar isto. Mas não consegui reler ainda", confessa. E o público pode querer mais? "Sim! Escreveria sobre impressões pessoais, sobre a vida. Hoje, tenho outra visão".