Por daniela.lima

Rio -‘Procure saber? Isso é uma babaquice”, indigna-se o jornalista inglês casca-grossa Mick Wall, responsável por biografias de Led Zeppelin, Metallica e agora lançando no Brasil ‘AC/DC — A Biografia’ (Globo Livros, 456 págs., R$ 49,90.

Avisado de que no ano passado floresceu um movimento de estrelas brasileiras da música que colocou em pauta a proibição de biografias não-autorizadas (leia no destaque abaixo), ele diz não entender por que artistas querem ser vistos como seres humanos perfeitos. “Por acaso eles têm as mesmas atitudes a respeito de livros sobre futebol, ou sobre a guerra ou sobre a pobreza?”, vocifera. “Não entendo por que é que artistas são mimados do jeito que são e acham que com eles tem que ser diferente. 

Primeira foto de divulgação da banda depois da entrada do vocalista Bon Scott%2C em 1974Divulgação


A verdade é uma só. E quem acha que ela tem que ser suprimida é inimigo dos artistas reais, que deveriam estar mais preocupados em falar sobre liberdade”.
‘AC/DC — A Biografia’, diz Wall, traz a verdade por trás de uma das instituições mais sólidas do rock ‘n’ roll, formada em 1973 na Austrália pelos irmãos escoceses Angus (guitarra solo) e Malcolm Young (guitarra base). Ele diz que nenhum dos integrantes chegou a responder qualquer dos seus contatos telefônicos para o livro. “Se você ler a biografia, vai ver que esse é o modo de eles lidarem com seus problemas. Ou você está do lado deles ou sequer existe para eles”, resume.

Ele ressalta que seu livro é bem diferente de outra bio do AC/DC já lançada no Brasil, ‘A História do AC/DC — Let There Be Rock’, da jornalista Susan Masino, que basicamente tece loas sobre a banda.

“Essa biografia dela é um livro de fã. Ela comprou a ideia de que eles são caras gente boa, baseados no tempo breve em que esteve com eles, e pronto. Meu livro, ao contrário, foi feito para caras crescidos que já não acreditam mais em Papai Noel”, ironiza. “Os irmãos Young são um clã, não ligam para nada que esteja fora do círculo deles. Nem mesmo para os outros integrantes da banda, nem mesmo para o (vocalista morto em 1980) Bon Scott. Eles não se tornaram uma das maiores bandas do mundo por acidente. Como a música deles, eles são durões, têm a sabedoria das ruas e não fogem de briga”.

O fato de rodear atentamente a vida, as histórias e os segredos de cada artista que biografa já trouxe problemas anteriores a Mick. Ao escrever ‘Metallica — A Biografia’, disponível no Brasil também pela Globo Livros, teve problemas com o vocalista e guitarrista James Hetfield. Em 1991, publicou a não-autorizada ‘Guns ‘N’ Roses — The Most Dangerous Band In The World’, sobre o grupo. O vocalista Axl Rose respondeu em ‘Get In The Ring’, música do álbum ‘Use Your Illusion’ (1991), citando nominalmente Wall e chamando-o para a briga. Você já chegou a se encontrar com Axl depois disso, Wall? “Pelo amor de Deus, me perguntam sobre isso há vinte anos... Olha, não estou nem aí para Axl. Sinto-me da mesma forma que os ex-integrantes do Guns ‘N’ Roses quando Axl decidiu que não queria mais tocar com eles. Esse cara é um otário”, dispara.

BIÓGRAFOS COMEMORAM

Na semana passada, a Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que libera a publicação de biografias não-autorizadas, sem a necessidade de licença prévia dos biografados — registre-se que o texto ainda precisa ser avaliado pelo Senado. A discussão ganhou os holofotes depois que nomes como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Djavan e Chico Buarque, unidos no grupo Procure Saber, declararam que defendiam a necessidade de autorização para a publicação de obras biográficas, alegando que é necessário preservar o direito à intimidade.

“Espero que finalmente possamos trabalhar em paz”, torce Denilson Monteiro, autor de ‘Dez! Nota Dez! Eu Sou Carlos Imperial’ e ‘A Bossa do Lobo: Ronaldo Bôscoli’. “É uma luta grande, cujo maior prazer é entregar um documento sobre uma personalidade que teve relevância na história. Minha biografia sobre Ronaldo Bôscoli foi fonte para Felipe Camargo e Tuca Andrada em ‘Elis, a Musical’, e a filha de Ronaldo, Mariana Bôscoli, disse que seus filhos agora têm um livro no qual saberiam quem foi o avô”.

A jornalista Christina Fuscaldo, que finaliza um livro (autorizado) sobre Zé Ramalho, completa: “Os artistas precisam entender que cada biografia será a leitura do autor da historia dele, e ele tem o direito de lançar a versão dele. Se a história for mal contada, quem paga mico sou eu”.

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