Por daniela.lima

Rio - Poucas vezes nos últimos tempos ouvi uma palestra tão esclarecedora quanto a que o maestro, músico e produtor paulista Benjamim Taubkin proferiu no festival Acorde Brasileiro, em Porto Alegre. No evento, um encontro nacional de música regional, ele foi convidado para falar sobre ‘Viver de Música’, nome do livro que lançou em 2011 com entrevistas de companheiros de ofício sobre suas histórias pessoais e a opção de viver exclusivamente de sua arte. 

Renato Teixeira no festival Acorde BrasileiroDivulgação


Entrevistado por Marcelo Melo, fundador do Quinteto Violado, ele lembrou que sua geração foi criada para escolher uma profissão, ser correto, permanecer 40, 50 anos no mesmo emprego e conseguir uma boa aposentadoria. Socorro! 

Então, um dia um amigo desenhista faz um cartum em que o personagem se lamenta por viver dentro daquele quadrado. Queria sair daquelas quatro linhas, romper suas limitações. Quem sabe quebrar a ponta do lápis do seu criador, ou do seu opressor. A ditadura militar estava em sua plenitude, o triunfo da tirania. No quadrinho seguinte, ele rompe uma das paredes, põe a cara pra fora e grita: “Mamãe!!!!!”.
Essa imagem foi lembrada para fazer uma crítica sensível aos parceiros musicais que reclamam da falta de espaço, da falta de oportunidades, enquanto dedicam a vida a tentar emplacar projetos em leis de incentivo, em editais. 

Ele lembrou que seis décadas após a Revolução Francesa Richard Wagner ainda lamentava o fato de muitos de seus colegas serem contra o movimento que quebrou a monarquia e a aristocracia, acabando também com o mecenato que tanto agradava seus beneficiários.

Para Taubkin, que se autointitula um “fora da lei”, os músicos estão livres do quadrado opressor das gravadoras, mas seguem gritando “Mamãe”, produzindo eles mesmos discos limitados artisticamente, copiando sonoridades, formatos de sucesso. Ou seja, como produtores, são tão cerceadores da própria liberdade quanto aqueles que lhes cortavam as asas. A progenitora a quem pedir socorro hoje tem nome de lei de incentivo, os mecenas atuais são editais que pedem como contrapartida mais que o social, a mediocridade reinante, a mesmice sem fim. Para ele é hora de reinventar, de misturar tuba com serrote para ver no que dá. E não pensar em um projeto vendável que embota a criação artística. 

O festival, idealizado por um sonhador chamado Luiz Carlos Contursi, reuniu músicos como Renato Teixeira, o violeiro mineiro Chico Lobo, o ótimo Trio Manari, do Pará, além do mítico Quinteto Violado, de Pernambuco, e teve discussões interessantes sobre o ensino de música nas escolas, oficinas como a da turma gaúcha da Tamborada, mas, principalmente, discutiu o papel da música e dos músicos em nossas vidas. 

Não temos mais a Rádio Nacional e seu projeto de integração do país. As rádios, em sua maioria, prestam um desserviço à população há algumas gerações. Portanto este tipo de encontro para a troca de ideias deveria se espalhar por todos os cantos. 

Mas não dá para reclamarmos que as novas gerações ouvem músicas ruins apenas por conta de rádios e gravadoras. Elas já fizeram seu serviço sujo lá atrás e estragaram gerações de ouvintes.

Otimista, Taubkin acha que seus pares deveriam pensar que há um país para ser reconstruído. Ao menos um país musical a ser refeito, e que eles deveriam aproveitar a liberdade do quadrinho rompido, rasgar o coração materno e voltar a fazer música, em vez de apenas projetos.

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