
Rio - Prosseguindo com a série de verbetes afetivos sobre o Rio de Janeiro, hoje com a letra P:
Pão de Açúcar — Para esse, eu tomei a liberdade e a ousadia de fazer um poema:
O Pão nosso
Como é bonito daquele ângulo,/ disse o poeta numa canção./ Deste também e daquele outro:morro encantado,/ céu, devoção./ Pão nosso de cada Rio, das ribanceiras,/ dos escaladores, das preces ligeiras,/ dos dissabores: no pão, o castigo e até sacrifícios./ A poesia de cada dia no Pão de Açúcar, desde o escapulário oswaldiano,/ ano após ano, subindo e descendo do céu à plenitude, à platitude carioca/ de observar o mundo como quem masca chicletes. / Mais de cem anos, em plena validade, em pleno gozo das funções e faculdades a que a natureza lhe incumbiu./ Velho pão que mata a nossa sede de beleza./ E que de cem em cem venham outros tantos, que venham os ventos para dançarmos um tango no ar,/ e que junto com ele também venha à mesa o vinho/ — que não merece faltar.
Parque Lage — Fica perto do Jardim Botânico, do Humaitá, do Horto Florestal e bem debaixo do suvaco esquerdo do Cristo Redentor. O lugar é lindo, um passeio inesquecível. Ali funciona a Escola de Artes Visuais, com diversos cursos de artes plásticas, e o casarão imponente já serviu até de cenários para muitos filmes nacionais — como o ‘Terra em transe’, de Glauber Rocha. Nos anos 1970 e 80 muitos shows de música brasileira aconteciam por ali, porque o astral é mesmo dos melhores.
Paulinho da Viola — Desde o dia em que um Rio passou em nossas vidas — e lá se vão mais de três décadas — que nunca mais conseguimos viver sem ouvir Paulinho da Viola. Viemos com ele, de lá para cá, chorando e cantando, gemendo e dançando, no mar que nos navega ou nos sinais fechados.
Ele diz que a homenagem foi para a Portela, mas não importa; foi para todos nós, cariocas e brasileiros. Instrumentista de primeiríssima qualidade — ouçam os solos dos choros chorados —, intérprete que carrega nas cordas vocais a malícia e a embocadura do samba, e amigo de todas as horas dos seus amigos — a turma da Velha Guarda da Portela que o diga —, Paulinho ganhou o apelido carinhoso de Príncipe do Samba não por exibir qualquer traço ou ranço de nobreza; mas pela invejável elegância com que trata o gênero, os ouvintes e os seguidores.
Volta e meia ele fica um tempão se gravar. Depois, outro tempão sem fazer shows. Mas não é para fazer fita ou bancar o difícil. É que o carioca de Botafogo Paulo César Faria, filho do também nobre violonista César Faria, como o seu pai sabe o quanto o mercado fonográfico é complicado. E jamais se mostraram interessados em virar “mercadoria”.