Conselheiro do TCM, Nestor Rocha era presidente da Riotur na época da construção do SambódromoDivulgação / Abracom
Ex-presidente da Riotur relembra bastidores da construção do Sambódromo
Nestor Rocha, atualmente conselheiro do Tribunal de Contas do Município, apresentou ao governador Brizola a ideia de erguer a Passarela do Samba e foi decisivo para criação do Desfile das Campeãs
Rio – Quatro décadas após ser construído, o Sambódromo guarda, ainda, histórias pouco conhecidas do grande público. Presidente da Riotur em 1983, Nestor Rocha acompanhou de perto os bastidores das conversas que antecederam o início das obras e teve papel fundamental, sendo o autor da ideia de erguer uma Passarela do Samba fixa para os desfiles.
Desde 1998 atuando como conselheiro do Tribunal de Contas do Município (TCM), Nestor, atualmente com 71 anos, lembra que decidiu sugerir ao então governador Leonel Brizola (1922-2004) um projeto que colocasse fim às estruturas provisórias de arquibancadas, montadas anualmente no Centro do Rio.
Nestor havia assumido a Secretaria de Turismo e o cargo acumulado de presidente da Riotur, em 1983. Na ocasião, assim como em anos anteriores, o grande problema da logística dos desfiles era a montagem e a desmontagem de estruturas tubulares, num processo que costumava durar até seis meses.
"Era sempre aquele monta e desmonta. Era um absurdo, caríssimo, porque as empresas se juntaram e fizeram um cartel, e aí botavam o preço que quisessem para fazer aquilo, geralmente em ritmo de emergência", relembra Nestor.
Durante uma reunião na casa de Brizola, Nestor revela que aconselhou o governador a construir um um espaço fixo que abrigasse o público e servisse como "palco" para o Carnaval, diminuindo os custos e acabando com os transtornos no entorno da Avenida Marquês de Sapucaí, onde as escolas já se apresentavam.
Nestor detalha que o desenho inicial foi desenvolvido com a ajuda de dois arquitetos da Riotur. "O projeto criava, também, um espaço enorme embaixo das arquibancadas. Além disso, abrigaria escolas pré-moldadas como as que foram criadas pelo Brizola quando governador do Rio Grande do Sul. Quando toquei no assunto das escolas, o Brizola pulou de alegria", afirma.
Feliz com a aprovação do governador, Nestor chegou a chamar o renomado arquiteto Sérgio Bernardes (1919-2002) para se juntar ao projeto. Nas semanas seguintes, no entanto, depois de conversas sobre a estética da futura construção, Oscar Niemeyer (1907-2012) acabou assumindo o projeto em definitivo, ao ser convidado pelo vice-governador Darcy Ribeiro (1922-1997), de quem era muito próximo.
Muitas sugestões de lugares para abrigar o Sambódromo foram listadas, inclusive a Barra da Tijuca. No entanto, a pressa para entregar a obra a tempo para o Carnaval fez com que o local escolhido fosse a própria Avenida Marquês de Sapucaí.
"A decisão que ficou em maioria era de fazer ali mesmo. Foi a pressa, a iminência do Carnaval acontecer já em fevereiro ou março de 1984... Tinha muito pouco tempo. Saiu lá e pronto, foi lá mesmo. Passaram-se 40 anos e o Carnaval ainda está lá, rondando. Nunca mais ouvi reclamação, porque organizou. Aquilo era um inferno. Um dinheiro danado, tudo sujo... e a Passarela veio para organizar isso. O projeto inicial era termos arquibancadas de ponta a ponta, sem espaços entre os setores, porque assim caberia mais gente", diz o conselheiro.
A Companhia Siderúrgica Nacional, em Volta Redonda, também aparece nesse contexto. Por ter uma dívida na época com o governo do Estado, a empresa chegou a sugerir o envio de estruturas de aço de ponte como pagamento, dando, ainda, garantia de 50 anos, caso as autoridades optassem por "desmontar" o Sambódromo e colocá-lo em outro lugar.
O tempo, porém, era muito curto. Por isso, a decisão de erguer a Passarela toda em concreto era uma manobra arriscada, já que não haveria tempo de posicionar as estruturas tubulares, caso a obra não ficasse pronta.
"O governador [Brizola] assumiu para ele aquela responsabilidade de fazer o Sambódromo em quatro meses. Hoje em dia, isso seria impossível de imaginar. E o risco? E se demorasse a ficar pronto? Não tinha plano B. Não daria tempo de montar a estrutura tubular, pois elas levavam quatro meses para serem montadas e dois para serem desmontadas, então passavam seis meses. Não dava tempo de chegar na hora e pensar: 'não vai ficar pronta'", detalha Nestor.
Desfile das Campeãs
A divisão do espetáculo em dois dias, domingo e segunda, e mais outro para o Desfile das Campeãs também foi uma sugestão de Nestor. Antes, havia uma verdadeira maratona, com todas as agremiações em uma noite só, fazendo com que o espetáculo terminasse quase na hora do almoço do dia seguinte.
"Sempre tiveram 12 escolas que faziam o desfile em um dia só. Só que em 1983, no ano anterior, somos eleitos no novo governo e nosso mandato começava em 15 de março. O Carnaval era antes. O desfile começava às 18h, virava a noite, amanhecia e só acabava depois do meio-dia", lembra Nestor, que cita, também, uma "dica" preciosa dada por José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, que era diretor da TV Globo. "O Boni sugeriu que a gente pintasse a pista da Sapucaí de branco porque iria favorecer a imagem na transmissão."
Em reunião com representante das agremiações, Nestor, que estava acompanhado do jornalista e assessor de comunicação da Riotur, José Luiz Azevedo, propôs a divisão da festa em dois dias, formato adotado até hoje. A criação dos Desfiles das Campeãs foi pensada para atender a quem não pudesse ir nem domingo nem segunda-feira. O plano ganhou adesão imediata dos presidentes e de Brizola.
"A ideia era fazer um desfile equilibrado. No dia que desfilar a Mangueira, não pode desfilar a Beija-Flor. É feito assim até hoje. Separaram as três primeiras escolas – três para um dia e três para o outro – e as outras seis eram sorteadas. Passou a ser, a partir dali, uma regra rígida que todo ano, desceriam duas escolas e subiriam duas escolas. As duas piores desceriam para o grupo de Acesso e as duas melhores do Acesso iam para primeiro grupo."
Grande entusiasta do Carnaval, Nestor Rocha relembrou estas e outras histórias, na última quarta-feira (7), durante um encontro virtual com outros conselheiros e o vereador Carlo Caiado, presidente da Câmara. Muitos destes bastidores estarão em um livro escrito por José Luiz Azevedo, ainda sem data de lançamento.
Recuperando-se da covid-19, o conselheiro do TCM, que também já foi vereador por quatro mandatos, receberá uma homenagem da Câmara Municipal, em breve, por ocasião do aniversário de 40 anos da Passarela do Samba.
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