Rio - Dizendo ser “cristão convicto” — ele fala os nomes de Deus e de Jesus em tom pastoral a cada frase — o cabo bombeiro Benevenuto Daciolo, eleito deputado federal pelo Psol com 49.831 votos, profetiza: “vou me tornar governador do estado num futuro bem próximo”. De acordo com o bombeiro, que ganhou projeção ao liderar o movimento da categoria na greve por melhores salários e condições de trabalho em 2011, quando chegou a ser preso e ficar no presídio de Bangu 1 por nove dias, seu sonho agora “é mais real do que nunca”.
“Só não chegarei ao Palácio Guanabara se não for obediente a Deus, que já traçou meus caminhos. Tenho que ser fiel a Ele e tudo vou conquistar”, acredita. Surpreendendo o próprio partido com a quantidade de votos obtidos nas urnas, Daciolo disse que sua eleição “foi um milagre”, mas que já esperava o sucesso. “É fruto do meu trabalho, da minha luta em prol dos trabalhadores humilhados pelo atual governo”, justifica, comentando que a maioria dos eleitores que depositou confiança nele integra a segurança pública, que tem 127 mil homens — 22 mil deles, bombeiros.
Mas os evangélicos também tiveram peso na “operação do milagre”, como ele mesmo reconhece. Apesar de ter admiração pelas igrejas Assembleia de Deus e Bola de Neve Church, frequentada basicamente por jovens, o novo deputado federal eleito disse que não tem preferência por nenhuma instituição. “Vou a todas elas, seja de qual dominação for, pois Deus é um só. Defino-me como um subidor de montanhas e leitor compulsivo da Santa Escritura”, diz.
Aliás, foi com uma Bíblia nas mãos que ele agradeceu, em frente à Assembleia Legislativa, aos que o apoiaram, conforme mensagem divulgada em vídeo no Youtube, no dia 3, antes mesmo da eleição. “Já somos vitoriosos. Jesus está na nossa batalha. Homem nenhum pode parar esse movimento”, prega, de olhos fechados em determinados momentos, no vídeo que tem um minuto e meio de duração.
Para viajar por todo o estado à caça de votos, Daciolo disse que contou com ajuda de parentes e amigos. “Gastamos exatamente R$ 35 mil no final das contas. Viajamos de ônibus, em carros de colegas e andamos muito a pé”, lembra o bombeiro. Em Brasília, para onde ainda não sabe se levará a mulher e os três filhos, Daciolo disse que vai se dedicar com afinco para melhorar a educação no país. “Se houver educação de qualidade, certamente a saúde e a segurança pública também serão beneficiadas”, afirma.
Militar viveu de ‘vaquinha’
Sem abandonar a entonação evangélica, Daciolo recorda os momentos difíceis que ele diz ter passado, principalmente nos 12 meses que ficou afastado do Corpo de Bombeiros, do qual foi expulso com outros 13 colegas de farda por causa do movimento de 2011, até ser reintegrado novamente por força judicial.
“Meu salário (em torno de R$ 1,5 mil) foi suspenso nesse período. Eu e minha família só não passamos fome porque militares amigos faziam vaquinha para nos ajudar”, revela o cabo, que está há 16 anos no Corpo de Bombeiros e agora passará a receber em torno de R$ 26,5 mil, sem contar com verbas extras, que podem dobrar o valor. Apesar dos “maus momentos”, Daciolo garante não ter mágoa daqueles que, segundo ele, “o perseguiram”. “Eu os perdoo. Jesus ensina a não ter ódio de ninguém”, comenta.
Sobre apoio aos candidatos que disputarão a Presidência da República e o governo do estado, o bombeiro apaga o fogo da especulação ao preferir não manifestar suas preferências. “Vamos ver o que o partido vai decidir em breve”, pondera o único dos cinco militares presos em 2011 eleito este ano no Rio. Os cinco fazem parte de um grupo de 22 bombeiros.