Rio - Saem a euforia, a alegria nas ruas e o clima de festa. Entra de novo a realidade no dia a dia dos moradores do Rio. A partir de amanhã, os cariocas vão enfrentar uma espécie de ressaca olímpica. Hoje mesmo muitos já sentem a sensação deprê. Com o encerramento dos Jogos, a tendência é que o município mergulhe, segundo especialistas, numa espécie de depressão pós-Olimpíada, já batizada de DPO por internautas.
Quem participou intensamente, de alguma forma, das competições e diversões paralelas, confessa que vai ser difícil esquecer os bons momentos. É o caso do engenheiro Gustavo Rocha, de 51 anos, que fez uma verdadeira maratona em companhia da filha, Vitória, 16. Juntos, assistiram a 16 competições, entre partidas de vôlei, handebol, basquete, ginástica e ciclismo.
“É impossível não ficar com saudade dos dias mágicos. Mas estamos orgulhosos da participação em um evento histórico, em uma atmosfera de competição e de respeito ao mesmo tempo. Agora é preciso encarar novamente a rotina”, diz Gustavo.
O jornalista Osmar Neves, de 50 anos, diz ter realizado um projeto pessoal ao atuar como voluntário nos Jogos. “Levarei para o resto da vida essa experiência incrível. Fiz grandes amizades com voluntários estrangeiros. Vai ser difícil cair a ficha de que esse sonho bom acabou de repente”, confessa.
A comerciária Ângela Oliveira, 57, que também foi voluntária, espera que toda a infraestrutura que viu fique realmente como legado para o povo. “Só assim essa angústia pelo fim da Olimpíada vai passar de forma definitiva”, acredita Ângela.
O estudante Celson Ávila, 31 anos, garante ter aprendido grandes lições. “Apesar das dificuldades, o brasileiro mostrou que consegue se superar. Assistir a quase tudo de perto, resgatou a nossa autoestima. Mostramos para nós mesmos que somos capazes. Agora é encontrar forças para continuar”, diz.
Abatimento coletivo
Para a psiquiatra e psicanalista Betty Nesanelovicz, o “abatimento coletivo” será inevitável. “A cidade sairá do mundo do Olimpo, do belo, do conto de fadas, do fascínio dos corpos atléticos, das trocas de afetos e gentilezas, das regras, para cair na escassez de tudo, sobretudo ética, segurança e falta de expectativas com a política e o futuro”, explica.
Para se livrar do desalento, é preciso que cada um mantenha “essa espécie de chama olímpica acesa dentro do coração. Que se ligue em projetos pessoais e coletivos”, aconselha.
O antropólogo Michel Misse, coordenador do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia e Estudos da Cidadania e Violência Urbana da UFRJ, diz que esta segunda-feira vai se assemelhar a uma Quarta-Feira de Cinzas. “Vai ser um baixo astral rápido. O carioca convive com toda espécie de problemas sociais e emocionais há um século. Mas é um povo carnavalesco, alegre por natureza. Não tem essa de ficar para baixo muito tempo não”, opina.
Leonardo Gama Filho, da Associação Brasileira de Psiquiatria, concorda. “O carioca vai ficar meio jururu, mas nada patológico não”, comenta. Já o sociólogo Paulo Jorge Ribeiro, do Departamento de Ciência Políticas da Uerj, acha que as pessoas acabarão voltando à rotina ‘na marra’. “Não há outra saída. Esperamos reflexões políticas. Vivemos num mundo ordinário, em bairros que precisam de mais atenção. Não vivemos num mundo extraordinário como o da Olimpíada, que encobriu até a violência urbana.”