Por edsel.britto

Rio - Das mesmas mãos que empunhavam a enxada na lavoura em Barros Cassal (RS) nascem os ágeis movimentos do primeiro medalhista do Brasil na esgrima em cadeira de rodas em Paralimpíadas. Jovane Guissone ainda ostenta os calos do período em que plantava fumo, milho e feijão. No entanto, o que tem semeado nos últimos anos são medalhas e conquistas no esporte.

“Tenho as mãos meio desconjuntadas porque trabalhei muito na lavoura. Trabalhei com meus pais até os 20 anos, em Barros Cassal. Meu município fica a 300 quilômetros de Porto Alegre. Tem 12 mil habitantes, é pequeno. Morava no interior mesmo, nem carro passava. Era carroça ou cavalo (os meios de transportes). Para ir à escola, eu ia a pé ou de cavalo. Quem possuía carro tinha dinheiro”, conta Jovane.

Jovane Guissone chegou à Vila dos Atletas na quarta-feira em busca do bicampeonato Ernesto Carriço / Agência O Dia

Com o sonho de ser militar, Jovane se mudou para Santa Maria para servir o Exército. A partir dali, despertou a vontade de conhecer outros lugares. Ele trocou sua pequena cidade por Canoas, onde trabalhou num mercado e, depois, numa empresa de segurança.

Um trágico episódio mudou os rumos do jovem sonhador de 22 anos. “Numa tentativa de assalto, o bandido atirou pelas costas. O projétil atingiu a coluna e fiquei dois meses para fazer a retirada. Fiquei mal, deprimido. Foram dois anos sem sair de casa. O fisioterapeuta ia até mim. Foi difícil aceitar... É difícil se aceitar, ir para a rua, pegar um ônibus. Tive muito apoio da família e de amigos, muitos com deficiência, que conheci depois”, lembra o gaúcho.

O crime adormeceu os sonhos de Jovane até que ele conheceu esportes praticados por cadeirantes. O primeiro foi o basquete, que o ajudou a retomar o convívio social. Mas foi a esgrima que lhe devolveu a oportunidade de desbravar o mundo viajando. 

“Nunca esqueço que perguntei ao pessoal do basquete se eles viajavam. Eles disseram que sim, para Lajeado, Santa Cruz... Queria ir para fora (risos). Fui para a esgrima e, com dois meses de treino, fui convidado para um amistoso na Argentina. E lá fui eu para a Argentina. Voltei com duas medalhas de prata”, conta o esgrimista.

MUITAS VIAGENS

Com a convocação para a seleção brasileira, veio a primeira viagem para a Europa, para um estágio internacional na França, e novas portas se abriram. O passaporte de Jovane não parou de ganhar carimbos.

“Para quem nunca tinha saído do Rio Grande do Sul, já conheci a Alemanha, Polônia, Hungria... Fui para Dubai sozinho. O atleta tem que ser uma pessoa decidida. A esgrima não é um esporte de força, é de muita agilidade. O tempo de ação e de reação deve ser planejado antes do combate. Está dando certo”, revela o atleta.

Casado há sete anos com Queli, pai de Jovane Júnior, de 5, e padrasto de Amanda, de 15, Jovane não teme a pressão de competir em casa, perto da família, na busca pelo bicampeonato olímpico.

“Estou num esporte que deu certo e tenho outras Paralimpíadas pela frente. O coração bateu mais forte quando cheguei ao Rio, a emoção pegou... Mas não é uma novidade para mim. Encaro como uma competição, um Mundial... Quebrei essa barreira e sou um competidor”, comenta o campeão paralímpico em Londres-2012. 

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