Por parroyo

Nem a sinalização do Banco Central de que a Selic ficará estacionada em 11% nos próximos meses, tampouco os indicadores econômicos recentes mostrando deflação e atividade mais fraca estão sendo capazes de derrubar o juro futuro na BM&F, que parece ter se acomodado. Falta confiança aos agentes econômicos em relação ao comportamento dos preços em 2015, bem como sobre as condições de um possível ajuste no início do próximo governo.

O derivativo com final em janeiro de 2015 é um exemplo da resistência do juro em acompanhar a fraqueza dos indicadores. Após cair da casa de 10,8% na sexta-feira passada, voltou a fechar acima da marca na terça-feira, mesmo dia em que a prévia para junho do Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M) surpreendia o mercado ao apontar deflação de 0,64%. Ontem, o contrato terminou o pregão pagando juros de 10,81%.

“O que determina a movimentação do juro futuro é uma equação complexa, que leva em conta fatores domésticos e externos”, explica Italo Lombardi, economista-chefe e estrategista para América Latina do Standard Chartered Bank. “Não compro essa ideia de corte de juros no Brasil no início do próximo ano.Há gente falando que a economia entrará em recessão no segundo trimestre, mas o corte só seria aceitável após uma sequência de trimestres ruins na atividade econômica junto com uma inflação mais comportada”, disse.

Para Lombardi, é possível que a atividade econômica continue dando demonstrações de fraqueza até o fim do ano. Mas a parte da conta que cabe à inflação não permitirá ao Comitê de Política Monetária (Copom) fazer cortar os juros.

“Estou no grupo que acredita em alta no próximo ciclo da Selic porque levo em conta todos os ajustes que o governo terá de fazer em 2015, principalmente em relação aos preços represados”, lembrou o especialista.
No cenário internacional, o evento mais esperado é o da alta nos juros norte-americanos, aguardada há anos e que deverá tomar seu lugar na história finalmente em 2015. “Acontecerá, imagino, de forma gradual, com o juro futuro dos Estados Unidos iniciando a precificação no início do ano que vem. A concorrência por ativos é uma pressão importante na definição da Selic. Com os norte-americanos pagando mais pelo dinheiro, emergentes como o Brasil deverão acompanhar o movimento corrigindo seus juros”.

Um exemplo da força externa no juro negociado na BM&F aconteceu nas últimas semanas. Em 28 de maio, os títulos da dívida norte-americana (os treasuries) de 10 anos eram negociados no mercado futuro com prêmio de 2,44%. Ontem, o mesmo treasury pagava 2,64%, melhorando a atratividade da aplicação mais segura do mundo. “O componente externo teve mais peso na cotação do juro futuro brasileiro do que a prévia do IGP-M ter apresentado deflação, o PIB fraco ou a confiança de consumidores e empresários em queda”, complementou.
Para os próximos meses, Lombardi vê o juro futuro de curto prazo — em janeiro de 2015 — sem variações persistentes, recebendo volatilidades da disputa eleitoral. “Mas a curva longa, de 2016 para frente, vai empinar, muito por força da recuperação da economia norte-americana”.

Daniel Cunha, economista da XP Investimentos, acredita haver uma acomodação na cotação futura do juro brasileiro patrocinada pela indefinição da corrida eleitoral. “Os agentes econômicos no segmento BM&F estão testando um novo patamar de equilíbrio para o juro futuro. Estão atrás de uma sintonia e à espera do evento mais importante para a precificação, que é a eleição”.

Por esse fato, Cunha não acredita que o contrato de juro futuro vá sofrer grandes variações nos próximos meses.
“Estamos vendo uma consolidação das taxas de juros futuras, com mercado reavaliando para baixo o crescimento, a fraqueza da economia corrente, da atividade econômica também. Mas o juro futuro não despencou no mercado futuro. Isso se deveu um pouco pela falta de novidades no cenário externo e muito porque a eleição ainda está indefinida. É difícil saber hoje qual será o próximo passo da política monetária porque é possível que ele seja dado apenas no próximo mandato presidencial, quando não temos certeza sobre quem será o mandatário”, explica o economista.

Cunha lembra, contudo, que a possibilidade de o próximo ciclo da Selic ser de corte deixou de ser desprezível. “Não é o meu cenário base, mas vem ganhando corpo há cerca de dois meses. Há economistas respeitáveis apontando nesse sentido. Temos chances razoáveis de contração econômica no segundo trimestre”. Hoje, lembra Cunha, haverá divulgação da Pesquisa Geral do Comércio, feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), trazendo números de abril. “Será mais um indicador a jogar luzes sobre a temperatura da atividade. Mas não necessariamente isso será repassado ao prêmio do juro futuro porque os cenários para 2015 são muito diversos quando se considera os diferentes programas de governo”.

Arnaldo Curvello, diretor da Ativa Corretora, também imprime peso à corrida eleitoral na precificação dos ativos e derivativos. “Tem sido a regra: quando uma pesquisa sai a favor da oposição, o prêmio de risco cai por se esperar que a condução da política econômica seja mais ortodoxa. Com mais heterodoxia, o que tem sido a maneira de governar da presidenta, o investidor pede mais prêmio. Isso vale para as ações de estatais e também para os juros futuros”, explica Curvello, para quem a presidenta Dilma Roussef continua sendo a favorita a vencer o pleito de outubro.

O diretor da Ativa vê o juro na parte mais curta da curva futura — até o início de 2015 — sem grandes variações nos próximos meses. “A cotação do contrato com fim em janeiro de 2015 será pouco afetada por novos indicadores econômicos. Ficará em torno de 10,8% e 10,7%, nos níveis que temos hoje. O prêmio no curto prazo, como vemos, nem existe, e no longo está apertado”.

O diretor conta que o pouco espaço para aferir lucros e a baixa movimentação no prêmio dos contratos mais curtos, estabilizados no patamar atual, o levou a indicar aos investidores outras aplicações. “Aqui na corretora praticamente zeramos as posições de clientes que estavam posicionados em contratos pré-fixados. Avisamos a eles que há pouco espaço para ganho com esses títulos”. Até a elevação no juro norte-americano, que pode afetar a cotação dos contratos aqui no Brasil, faz Curvello se animar. “A normalização da política monetária nos Estados Unidos é um pouco como ‘À espera de Godot’, nunca chega”.

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