São Paulo - As empresas de meios de pagamentos eletrônicos estão vislumbrando uma chance de ouro para concorrer com os bancos pelos clientes não-bancarizados no Brasil. A legislação que colocou essas empresas não-financeiras sob a fiscalização do Banco Central (BC) está exigindo investimentos para sua adaptação às novas regras — as que faturam mais de R$ 500 milhões por ano precisarão abrir uma conta no BC, manter um capital mínimo, enviar relatórios periódicos e reforçar a governança até novembro, se quiserem continuar no negócio. Em compensação, as que conseguirem obter licença do BC depois dessa data poderão funcionar quase como um banco, abrindo contas correntes e emitindo moeda eletrônica.
Este é o exemplo da empresa Moip. Hoje ela administra as contas para onde vão os pagamentos dos clientes da Natura, repassando uma parte para a empresa e outra para as revendedoras. Mas hoje elas não podem movimentar essa conta de pagamento, precisam sacar em espécie ou transferir para uma conta-corrente bancária, própria ou de terceiros. Depois de receber a licença do BC, a Moip vai oferecer produtos associados a essa conta de pagamento para que os recursos possam ser movimentados.
“Fazemos a gestão de pagamentos para toda a rede de revendedoras da Natura. E 30% delas não tem conta em banco”, explica Bruno Poljokan, diretor financeiro da Moip, dando um exemplo do potencial de crescimento que vislumbra. A Natura tem 1,77 milhão de consultoras (como chamam as revendedoras de seus produtos) — excluindo as 366 mil fora do Brasil, são 1,4 milhão, ou seja, 420 mil sem conta em banco. “Sob o guarda-chuva do BC, poderemos oferecer soluções financeiras para elas, como boletos, pagamentos, DOC, TED e cartões pré-pagos”.
Além das revendedoras Natura, o executivo lembra ainda que existe um universo ainda maior, já que segundo o próprio BC 40% da população brasileira que poderia Moip é uma empresa de soluções de pagamentos online para e-commerce, que fatura mais de R$ 500 milhões por ano. “Como queremos obter licença de instituidor de arranjo de pagamentos e emissor de moeda eletrônica, precisaremos de um capital de R$ 3 milhões”, diz o presidente da Moip, Igor Senra, sem revelar contudo quanto a empresa está investindo para se adequar às novas exigências do BC.
Para se adaptar à nova regra, a Moip contratou a ajuda da Matera Systems. “O novo marco regulatório acabou modelando essa indústria para algo que lembra um minibanco. Já prestamos serviços para mais de 60 instituições financeiras, agora o mercado cresceu”, diz Carlos Augusto Leite Netto, presidente da Matera Systems. “Estamos ajudando a adaptação de dezenas de empresas de pagamento”, conta. E nos próximos cinco anos novos clientes chegarão ao mercado, pois o BC escalonou a exigência de licença por tamanho da empresa — as maiores precisarão pedir primeiro.
Para Netto, a nova regra do BC é “disruptiva”, na medida que quebra paradigmas do Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB): “As empresas de pagamento estarão ligadas diretamente ao sistema bancário. Em vez de pagar aos bancos R$ 3 por uma transferência (que custa dois centavos na Câmara Interbancária de Pagamentos - CIP), a empresa poderá receber boletos bancários — e cobrar tarifas por isso.
Poljokan, da Moip, lembra que as empresas que precisam obter uma licença do BC para operar no SPB estão correndo. “Foi criado, inclusive, um comitê para intermediar a nossa comunicação com o BC, resolver dúvidas e apresentar propostas”, diz. Mas ele acredita que a Lei vai inibir a entrada de novas empresas, assim como as inovações. “Muitas empresas pequenas não vão sobreviver, a menos que se associem. Por outro lado, um setor mais regulado, com regras claras, dá mais segurança para grandes empresas do ramo, inclusive estrangeiras, investirem no negócio. Vai haver um movimento de consolidação”, diz. A própria Moip, que está há sete anos no mercado, tem recebido propostas de empresas maiores, inclusive estrangeiras. “Mas não estamos interessados”, diz Senra.