Por monica.lima

A instabilidade política, a incerteza quanto à execução do ajuste fiscal e o cenário externo formaram uma combinação explosiva que catapultou o dólar frente ao real. No ano, a divisa norte-americana já acumula uma valorização de 16,80%, com uma volatilidade que dificulta a análise de investidores e economistas quanto aos rumos que o mercado de câmbio tomará.

O componente especulativo na formação da cotação do dólar ficou claro ontem, com a moeda abrindo em alta, chegando à máxima de R$ 3,17 para depois ceder 0,82% em relação à divisa brasileira. O real fechou cotado a R$ 3,104 interrompendo um rali de seis sessões em que a divisa norte-americana acumulou alta de 10%. A queda reflete a estratégia das mesas de operação: os investidores aproveitaram para embolsar os ganhos, vendendo os dólares e reduzindo a pressão sobre o real.

Porém, na opinião de analistas, a tendência de alta ainda vai perdurar.

“Estamos passando por um momento imponderável porque a gente não consegue estimar qual o teto para a moeda norte-americana. Não é só um problema econômico que afeta a divisa, há um problema de confiança institucional que tem afetado muita a decisão de investimentos. Tentar mensurar o dólar para o final do ano neste momento é pura ilusão. Tudo vai depender da conjunção de fatores econômicos e políticos”, afirma o economista da X-Infinity Invest Jason Vieira.

Para o profissional, no curto prazo, a apreciação da moeda deve continuar independente de um aumento da taxa Selic. “É uma questão política. O maior problema que temos agora é um cenário de ingovernabilidade, se o governo não conseguir aliados políticos o cenário econômico pode ficar muito mais difícil”, avalia.

O economista-chefe da Garde Asset Management, Daniel Weeks ressalta que o dólar vêm experimentando um movimento global de alta, mas, no Brasil, a situação se agrava em virtude da insegurança causada pela crise política que vem minando o governo da presidenta Dilma Roussef. “O movimento do dólar no mundo reflete a divergência política monetária entre a Europa e o Japão em relação aos Estados Unidos, que deve elevar a taxa de juro em algum momento este ano” explica.

Internamente, a paralisia política tem gerado pressão adicional sobre a moeda. “A Fazenda, o Planejamento e o Banco Central têm mostrado maior leniência com o câmbio. Antes, a preocupação era maior, agora, parecem sinalizar que que esta alta faz parte do ajuste”, diz.

Weeks pondera que a alta da moeda dos EUA, por um lado, favorece a competitividade doméstica e ajuda no déficit de conta corrente, que precisa se reduzido. “A desvalorização do real tem efeito ruim no curto prazo, principalmente na inflação, mas num prazo maior devolve a competitividade da indústria e ajuda a reduzir o déficit externo”, diz.

Para o economista, a autoridade monetária não deve determinar um teto para a moeda, mas a questão é saber em qual nível a moeda começa a ter um impacto positivo sobre as contas externas. “Obviamente, tem um tempo para o câmbio ter efeito nas contas externas, mas a moeda perto de R$ 3,20 a R$ 3,30 começa a melhorar a balança comercial”, estima.

Weeks ressalta, no entanto, que se a situação política piorar e o ajuste fiscal ficar mais difícil de ser concluído, haverá uma pressão adicional sobre o câmbio. Para evitar esse movimento, o executivo avalia que o BC poderia aumentar mais fortemente a taxa Selic, que encerraria o ano em 13,50% ou mais, se necessário. “O BC deve promover mais uma alta de 0,50 e outra de 0,25 pontos percentuais nas próximos reuniões,” diz. Para justificar a alta maior da Selic em abril, o economista lembra que em março a inflação deve ser fortemente impactada pelo avanço dos preços administrados e pela depreciação do câmbio mais forte do que o esperado. “Neste cenário, convém ser mais duro e sinalizar que pode subir o juro, se necessário”, avalia.

O diretor-executivo da NGO Corretora de Câmbio, Sidney Nehme, acredita que o mercado está operando sem fundamentos claros que determinem o ponto de equilíbrio para a câmbio. “É mais um movimento irracional do que racional”, diz ele.

O executivo avalia que a incerteza dos investidores quanto à aprovação do pacote de ajuste fiscal no Congresso tem causado forte pressão altista na divisa norte-americana e é necessário que haja uma resolução o quanto antes. “Um impasse pode colocar o superávit em risco, colocando o grau de investimento em risco, o que aumentaria o risco no câmbio. Se (o Brasil) perder o grau de investimento a situação deve ficar drástica porque o BC não tem tantos elementos para conter a pressão de alta”, diz.

Nehme ressaltou ainda que há cunho especulativo que vem do mercado futuro. “Hoje, a moeda subiu também por pressão externa, com o povo vendendo euro e indo para o dólar. Este ambiente justifica a moeda ter atingido R$ 3,17 hoje”, diz.

De acordo com o executivo, o mercado também está aproveitando este momento de incerteza política para antecipar uma possível rolagem integral de swaps cambiais do Banco Central. Nehme lembra que dos R$ 9,9 bilhões que estão vencendo até o final do mês, o BC só rolou 22%. “Provavelmente, com esta taxa o BC deve acabar rolando o resto e esta percepção fez com que o especulador vendesse sua posição para aproveitar o preço atual”, diz.

Para Nehme, a autoridade monetária não tem condições de interromper o programa de swap cambial. “Se interromper, a taxa explode”, afirma. Assim como Weeks, Nehme também acredita que a alta do dólar pode levar o BC a elevar a Selic em mais de 0,25 ponto porcentual em abril. “O BC vai ter que aumentar mais os juros se a moeda continuar subindo. Além disso, também tem a alta de mais 30% da energia que já vai impactar a inflação a partir de março. O juro deve subir além dos 13%”, estima.

O professor de MBAs da Fundação Getulio Vargas (FGV), Mauro Rochlin, também faz questão de ressaltar o movimento de depreciação do euro e das moedas emergentes em relação ao dólar, embora num ritmo mais lento que o real. Segundo ele, a tendência de alta global do dólar é decorrente da expectativa de alta dos juros nos Estados Unidos, no Brasil ela é intensificada pela aversão ao risco. “Apesar de todas as dificuldades, déficit primário, inflação de administrados e juros nos EUA, o que mais pesa é a aversão ao risco”, diz, se referindo à cena política.

Rochlin também lembrou que a desvalorização do real tem um impacto positivo. “No caso da exportação, o movimento pode ajudar a indústria nacional, pois um dólar mais caro colabora para as empresas a ganharem competitividade diante dos produtos importados”. Porém, pode haver pressão sobre os preços. “No caso da importação, várias cadeias podem ser atingidas pela alta da moeda, ampliando o efeito na inflação”, diz.

O professor chama a atenção para o fato de o último boletim Focus do Banco Central mostrar que os analistas ouvidos pela instituição estão projetando inflação de 5,5% para 2016 e de 7,8% este ano. “Esse é um ponto muito importante. O mercado está projetando inflação em queda em 2016. O mercado financeiro entende que a alta da inflação este ano é transitória, causada pela alta dos preços administrados”, avalia.

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