Por monica.lima

São Paulo - Há chances de o Banco Central desacelerar e até parar em breve o aperto monetário. A avaliação é da economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, que considera que, se a inflação de 2016 for de 5,5%, será um belo resultado. A executiva destacou que hoje existem mais chances de o Brasil perder o grau de investimento. A economista também criticou a condição do ajuste pelo governo, dizendo que é necessário enviar ao Congresso mais medidas para contenção de gastos. Sobre a Grécia, acredita que a possível saída do país da zona do euro terá impacto de curto prazo.

O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, voltou a afirmar que o foco da instituição é trazer a inflação para o centro da meta em 2016. Você acredita que ele irá conseguir?

O BC praticamente já fez o seu trabalho. Qualquer trabalho que seja feito agora é residual. Eu acho que tem uma chance, se a inflação permitir, de fazer 0,25 pontos base na próxima reunião (elevar a taxa básica, de 13,75%, para 14% ao ano). Ainda tem muito efeito de política monetária para se materializar. A taxa real de juro certamente está bem acima da taxa de equilíbrio, como política monetária tem defasagem, ainda há bastante contração da demanda. Tem chance de o BC desacelerar e parar em breve com o aperto monetário, apesar das expectativas da inflação para 2016 estarem tão rígidas em 5,5%. É importante colocar que mesmo que seja 5,5% em 2016 já é um tremendo sucesso, a luz do que está sendo este ano. As expectativas para o mercado para preços livres no ano que vem estão em torno de 5,4%. Já é um belo resultado, dada a natural contaminação dos preços, já tem ganho de reputação que o BC vem conquistando.

Você então espera só mais uma alta de 0,25 ponto base da Selic?

Em princípio, sim. Eu não tenho enorme convicção. Mas, é um cenário bastante possível.

Trazer a inflação para o centro da meta em 2016 não vai custar caro ao país?

É, mas tem um ponto interessante. Hoje, a expectativa do boletim Focus está 5,5% e tem espaço para cair. O que impede essa queda? Tem muita rigidez da inflação. Por um lado tem efeito de política monetária, mas o fato é que tem fatores, como o próprio câmbio que acaba dando mais rigidez na inflação, tem que aguardar um pouco mais para ver. O BC já começa a ver sinais de menor persistência da inflação, e o discurso do Tony Volpon, diretor do BC, é assim: você tem mais queda dessa persistência, porque tem uma política fiscal que ajuda, já não tem um mercado de trabalho apertado. O BC está, sim, confiando numa queda mais forte da inércia inflacionária. Essa resistência inflacionária será menor o ano que vem e vai abrindo espaço para as expectativas caírem. Quando o BC fala em 4,5%, para mim ele está dizendo: temos confiança que tem espaço para 4,5% porque tem muita coisa acontecendo na economia. Tem efeito de política monetária para se materializar e, desta vez, ao contrário do passado, a política fiscal e os bancos públicos estão ajudando. Essa é minha interpretação da fala do BC.

Você esteve na semana passada no exterior. Como os estrangeiros estão vendo o Brasil?

Existe uma decepção com o Brasil, isso é inquestionável, uma decepção, um ceticismo, mas isso não quer dizer que o estrangeiro está totalmente fechado, de forma alguma. É difícil ficar longe de um país que tem taxa de juro tão elevada. O estrangeiro olha os preços de ativos e avalia se está caro ou barato sem grandes julgamentos, sem questão estrutural. Eles olham posicionamento de mais curto prazo em função de avaliação de preço versus risco. Aquele cenário do passado, de confiança maior, de fluxo de prazo maior, posições estruturais mais firmes, isso a gente não vê. É muito mais buscar oportunidade de curto prazo em função de janelas de preços. Vejo que vamos demorar para ter posições estruturais mais fortes. Enquanto não conseguir ter, pelo menos, uma recuperação cíclica da economia, eu acho difícil.

A visita da presidente Dilma Rousseff aos EUA passa alguma confiança para o investidor?

Acho que não exatamente. Mas o que eu vejo de positivo é que, ainda que seja tardio e lento, a gente começa a ver certa renovação na agenda econômica do Brasil. Nesta questão específica da agenda de comércio com os EUA, o país estava muito isolado, era uma agenda totalmente esquecida. Discutir acordos de facilitação de comércio eu vejo como um sinal, ainda que limitado, de que está havendo alguma renovação. Tem um vento mais fresco começando a soprar.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, está tendo dificuldades para aprovar o ajuste. O que está sendo aprovado é suficiente ou pode haver alguma desestruturação do pacote proposto?

Eu acho que o Levy precisa encaminhar mais medidas para o Congresso. A impressão que dá é que deu um certo cansaço de novas medidas, uma certa fadiga, isso é muito precoce. A falta de uma agenda positiva do Congresso muitas vezes acaba se transformando em uma agenda negativa. Acho importante que novas medidas sejam enviadas para contenção de gastos. Aquela rigidez que tem no orçamento, só 10% despesas discricionárias e 90% é mandatório, precisa flexibilizar isso. A gente precisa de mais medidas do tipo da MP 664 e 665 para reduzir essa rigidez dos gastos obrigatórios. É essencial que se faça, porque ajuste fiscal só cortando gastos discricionários é de curto prazo, você não consegue fazer isso por muito tempo e o ano que vem já não tem o que fazer, já cortou o que tinha que cortar. Esse avanço das despesas precisa ser contido. O que eu espero é que novas medidas sejam enviadas, que o governo supere esta fadiga. É importante até para evitar a agenda negativa no Congresso, a gente tem visto algumas nas últimas semanas. Vamos lembrar que a 664 e a 665 já estavam prontas e era do time do Mantega (Guido Mantega, ex-ministro da Fazenda), então, certamente, precisa de mais medidas nesta linha. É compreensível, ninguém espera o cumprimento da meta este ano. Agora, o não cumprimento junto com medidas para que o ano que vem tenha chances de resultados melhores, isto é sinalização essencial. Este ano tem que mandar medidas para que o ano que vem continue tento melhoras dos indicadores fiscais.

A crise da Grécia pode implicar em menos recursos para países emergentes e Brasil?

Essa crise da Grécia está cantada há muito tempo e os momentos de redução de liquidez para o Brasil, o que não foi nada dramático, é muito mais por causa das nossas questões internas. Hoje tem um quadro de baixa volatilidade das moedas emergentes, mesmo com Grécia podendo colapsar.

Quando o movimento de alta do juro nos EUA começar podemos ver uma migração de recursos do Brasil para lá?

Acho que não chega a tanto. Toda vez que o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) se mexe ele traz volatilidade, tem potencial grande. Por mais que a prática esteja precificada, não se sabe como vai ser. É um evento importante que vai trazer volatilidade de moedas. Para o mercado, uma vez que começa, fica a dúvida sobre o ritmo. Isso quer dizer que vai ter inflexão de fluxo para Brasil? Não acho que seja isso. O diferencial de juros ainda é muito favorável para Brasil. Claro que o evento do Fed traz volatilidade, mas, no médio prazo o que pode mudar nossa história aqui é se a gente não cuidar dos nossos fundamentos e perder o investment grade.

Estamos próximos de perder o grau de investimento?

Não está próximo. Mas as notícias dos últimos tempos aumentaram este risco. Não seria meu cenário básico, mas o risco aumentou.

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