O lema central do governo Dilma Rousseff na área econômica foi sempre combater a inflação, mantendo o IPCA o mais distante possível do teto de 6,5% da meta, sem sacrificar muito nem a atividade nem o emprego. O ajuste desinflacionário jamais seria feito às custas da compressão da renda dos trabalhadores. Os números mais recentes sobre atividade e inflação mostram que os dois objetivos são dificilmente conciliáveis. Ou conciliáveis só até determinado ponto. A inflação perde ímpeto de maneira imprevista. A atividade, também. Para que esta não <QA0>
piore ainda mais, o juro tem de parar de subir. A cada nova declaração oficial o Banco Central reitera o seu aviso: a 11%, a Selic já bateu no teto.
Após a divulgação do IPCA de abril — tombo para 0,67% após o salto de 0,92% de março —, o mercado futuro de juros da BM&F parou de estranhar as advertências do BC. As taxas dos DIs caíram, ampliando a precificação da estabilidade do juro básico por um longo período. A do contrato para a virada do ano cedeu de 11,02% para 10,97%. E o contrato para janeiro de 2017 refluiu de 12,20% para 12,11%.
No dia 2 de abril o Copom subiu a Selic de 10,75% para 11% para atacar uma possível disseminação do choque dos alimentos para a cadeia de preços. Não precisava: o choque, em acelerada dissipação, foi muito localizado em março. Divulgada na sexta-feira, a primeira prévia de maio do IGP-M foi espantosa: o índice degringolou de 0,72% em idêntico período de abril para 0,06%. O IPA agropecuário desacelerou de 1,61% para 0,09%, e o industrial não só parou de acelerar como deu marcha à ré: passou de inflação de 0,50% para deflação de 0,42%.
Mas o Copom não quis correr o risco, fez a alta de abril por excesso de precaução, pois já na ata desta reunião consignou seu entendimento de que o impacto da estiagem (em algumas regiões) e das chuvas (em outras) se esgotaria rapidamente. Foi o que se viu. Acontece que a Selic vem subindo aos poucos faz um ano. E a totalidade da alta já acumulada ainda nem bateu plenamente na atividade. Se a defasagem do efeito prático das decisões monetárias é de nove meses, hoje a economia absorve a alta acumulada pela taxa de abril (quando estava em 7,5%) a agosto (9%). Só no fim do ano a atividade vai acusar a atual taxa de 11% e todo o peso do ciclo de 3,75 ponto de aumento do custo do dinheiro. Para uma atividade já cambaleante, continuar subindo a Selic seria a pá de cal.
Para quê? Os sinais são de que o IPCA do ano ficará na “meta” (ou seja, levemente abaixo de 6,5%), o BC não precisa aumentar a remuneração do capital estrangeiro para obter dólares suficientes para sedar o câmbio (ao contrário, a Selic em 11% é tão atraente que ele já está pensando em diminuir mais ainda suas intervenções cambiais), os assalariados já sentem no bolso os efeitos dos juros altos (como mostra o saque líquido de R$ 1,27 bilhão ocorrido na caderneta de poupança em abril, um fenômeno não visto há mais de dois anos) e os investidores domésticos não irão votar em Dilma Rousseff só porque aumentou os ganhos dos fundos de investimentos (o que os economistas mais à esquerda chamam de “Bolsa Rentista”, os R$ 257 bilhões pagos ao ano somente em juros da dívida pública interna, dez vezes mais que o gasto com o Bolsa Família, não retorna sob a forma de votos, desencadeando a crítica petista à “ingratidão das elites”).
Sem falar que o ciclo de alta do juro já conseguiu reverter o pessimismo dos eleitores com a inflação. O único dado realmente novo da última pesquisa Datafolha foi, pela primeira vez desde 2012, a queda de 65% para 58% na expectativa de alta da inflação. Quem disse que a atual política monetária era incapaz de reverter as expectativas inflacionárias negativas?
Se todas as cartas de 2014 já estão na mesa, o que esperar de 2015? Reeleita, Dilma envia todos os sinais de que não fará o ajustamento em cima dos assalariados e dos 40 milhões que foram recentemente incluídos no mercado. Isso significa: se os juros tiveram de subir em 2015 será pouco, a recuperação das tarifas públicas será feita gradualmente e as prodigalidades excessivas no salário mínimo e no seguro-desemprego serão aparadas. E os gastos públicos? Ainda há pouca indicação a respeito, mas devem crescer alguma coisa a mais que as receitas, não muito como hoje. Não será, de qualquer forma, uma guinada, seja o novo ministro da Fazenda quem for.
Nesta semana pobre em novos indicadores de inflação, não faltarão os relativos à atividade. O IBGE divulga as suas pesquisas sobre trabalho (PIM Emprego e Salário) e vendas varejistas (PMC) ambas referentes a março. E o BC edita o seu índice de atividade econômica, o IBC-Br, proxy do PIB. A expectativa é de que reforçarão os indícios de apatia econômica.
A agenda americana está repleta de índices de atividade e inflação capazes de mexer com os juros longos americanos e, em consequência, com os mercados em geral. Sairão os índices de preço de importação, ao produtor e ao consumidor. E também dados fiscais, vendas no varejo, de confiança, construção de residências e concessão de alvarás. Ao longo da semana passada, as taxas das T-Notes de 10 anos caíram de 2,67% para 2,62%, juros surpreendentemente baixos para uma economia em processo de normalização monetária.
O cenário externo não sugere ao dólar abandonar por enquanto sua rota de desvalorização. Após três pregões em baixa, ao longo dos quais acumulou perda de 1,44%, a moeda conseguiu fechar sexta-feira com modesta alta de 0,05%, cotada a R$ 2,2154. Ainda não foi afastado o perigo de um recuo para aquém do piso de R$ 2,20.