Por douglas.nunes

Ao contrário dos fundos de investimentos, cujas cotas são “marcadas a mercado” por meio da atualização dos preços antigos dos papéis a seu valor corrente, os segmentos de câmbio e juros futuros “marcam a futuro”: eles trazem para o preço presente o valor que acreditam ser o mais provável no futuro. Os preços de ontem do dólar e dos DIs já se ajustam a essa visão de futuro. Qual? Para o mercado, salvo se acontecer incidente traumático capaz de provocar comoção nacional, Dilma Rousseff já está reeleita. As incertezas de curto prazo — todas as três hipóteses podem acontecer no domingo: vitória em primeiro turno da petista, disputa do segundo com Marina Silva ou com Aécio Neves – não impedem de os mercados já se movimentarem em função daquela certeza. Os investidores já estão no terceiro turno: o da pressão desabrida e franca para que Dilma faça uma nova gestão econômica mais pró-mercado.

O dólar deu mais um esticão ontem. Fechou a R$ 2,4848, com valorização de 1,5%. O pregão de juros futuros, apesar do favoritismo de Dilma, vinha relutando em inclinar a curva de forma positiva. Os vértices para o início de 2017 e 2021 estavam com polarização negativa desde a emergência da candidata Marina Silva. O DI futuro informou ontem que perdeu as esperanças. A taxa para janeiro de 2017 fechou a 12,33% (12,24% na véspera) e o contrato para janeiro de 2021 foi a 12,38% (12,22%).

O comportamento mercurial do dólar em setembro remotamente se vinculou à prescrita lei da oferta e da procura. A moeda valorizou-se 9,33% frente ao real no mês passado apenas para tornar presente a visão de um futuro econômico instável e desfavorável aos mercados. Entraram mais dólares do que saíram no Brasil, o que deveria empurrar a cotação para baixo se aquela lei não tivesse caducado. Não vale diante da cada vez mais concreta possibilidade de Dilma Rousseff permanecer até 2018 no Planalto. Segundo dados divulgados ontem pelo BC, o fluxo cambial foi positivo em US$ 3,51 bilhões no acumulado de setembro.

A contratação de câmbio para exportação e importação mostrou modesto superávit de US$ 960 milhões. Não foi maior menos por um problema de preço (já que exportar com o dólar a R$ 2,45 parece sedutor) e mais pela retração dos mercados globais, abatidos por economias inapetentes. O saldo foi bem mais avantajado pela conta financeira, aquela que contabiliza as entradas e saídas de aplicações de portfólio (renda fixa e ações), investimento estrangeiro direto e remessas de lucros e dividendos. Ela exibiu um ingresso líquido de US$ 2,6 bilhões. É essa conta que mede o grau de confiança dos investidores estrangeiros no Brasil. O superávit diz que não temem um segundo mandato de Dilma, o que não significa dizer que apoiam.

O BC não vem fazendo nenhum esforço adicional para obstar o avanço do dólar. Manteve até agora inalterada a cota diária de novos swaps cambiais: 4 mil contratos por dia, correspondendo a uma venda semanal de US$ 1 bilhão no mercado futuro. Quem ainda não está hedgeado poderá fazê-lo sem precisar comprar moeda à vista por preço politicamente inflacionado. E quem já está, também não encontra problema: como aconteceu em setembro, também em outubro praticamente todo o lote de US$ 8,84 bilhões em títulos antigos que vencerão no dia 3 de novembro será renovado. O BC já abriu o mês ontem iniciando a rolagem desses contratos velhos. Para tanto, vendeu 8 mil swaps, no valor de face de US$ 400 milhões. Mantido o ritmo até o final do mês, revalidará US$ 8,4 bilhões, ou 95% do total.

Mas por que o BC não quer ser mais arrojado na contenção da disparada da moeda? O mercado se divide entre duas explicações, bastante antagônicas. A primeira é que acredita num movimento de volta assim que, no dia 6 ou no dia 27, o governo anunciar um programa econômico de maior austeridade, sobretudo na recomposição das contas públicas. A segunda é oposta: o BC deseja uma taxa de câmbio mais depreciada porque no segundo mandato será tentada uma nova versão, mais visceral, da nova matriz econômica, cujo um dos pilares de sustentação é o câmbio realista, favorável ao comércio exterior e ao equilíbrio do balanço de pagamentos. Pela primeira interpretação, o dólar cai, pela segunda, mal começou a subir.

Em nenhuma das hipóteses será preciso utilizar os US$ 376,16 bilhões estocados nas reservas internacionais. Na prevalência da segunda hipótese, é até possível se pensar na redução do estoque de swaps cambiais, a bater em US$ 100 bilhões em meados do mês. O BC não se preocupada muito com os swaps. Estes papéis vêm dando lucro. No acumulado do ano até agosto, eles renderam ao BC R$ 20,071 bilhões. Em agosto, a diferença entre a Selic e a variação cambial foi positiva em R$ 2,479 bilhões ao caixa da autoridade. Em setembro, perdeu dinheiro, porque o dólar subiu 9,33% e a taxa básica variou 0,91%.

Do exterior, o dólar não recebeu ontem amparo técnico para a forte valorização obtida contra o real. O mercado de câmbio ainda não foi contaminado pela tensão reinante nas bolsas de valores do primeiro mundo. Wall Street discutia ontem se os sinais de perda de vigor da economia dos EUA no terceiro trimestre, após a disparada de 4,6% no segundo, não poderiam precipitar o estouro da bolha de ações, sobretudo as de empresas de médio porte. Na dúvida, o mercado começou a vender. Era só o que faltava: a dois pregões do primeiro turno, explodir a bolha da Nyse inflada pelo afrouxamento quantitativo do Federal Reserve (Fed). Como tudo e qualquer coisa influenciam o comportamento do detentor do capital até os protestos em Hong Kong e o primeiro caso de ebola nos EUA foram invocados para justificar as vendas.
Tecnicamente, o que predominou nos mercados globais foi o abatimento derivado de uma onda negativa de PMIs, indicadores da área industrial. O da zona do euro desacelerou de 50,7 pontos em agosto para 50,3 em setembro.

Na Alemanha foi pior: o índice caiu a 49,9. Nos EUA, o congênere ISM recuou a 56,6 pontos, quando os especialistas esperavam taxa de 58,2 pontos. A área habitacional americana também não vai bem. Os gastos com construção, ao invés de subirem 0,6% como imaginavam os economistas, caíram 0,8% em agosto. Da área de emprego veio um bom dado – a geração líquida de 213 mil postos no mês passado, acima das expectativas de criação de 209 mil --, mas o mercado não estava ontem a fim de precificar um “payroll” (relatório oficial de emprego) amanhã mais promissor. E a taxa da T-Note de 10 anos tombou de 2,49% para 2,39%.

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