Por diana.dantas
Os mercados viam o rei nu, mas era preciso que uma autoridade externa, provida de lentes especiais, dissesse se ele estava completamente despido ou se ainda conseguia conservar alguma peça íntima. Embora raramente escapem da obviedade já precificada, as projeções semestrais de crescimento econômico do Banco Mundial são aguardadas com ansiedade pelos analistas. Funcionam como um carimbo desinteressado e insuspeito. E a visão privilegiada da instituição confirmou o que todo mundo estava vendo: só os EUA florescem em meio ao pântano geral. Mas o manto americano é curto, mal cobre a si mesmo.
Os EUA foram a única grande economia cujo prognóstico de expansão foi revisto para cima. No relatório anterior, de junho, o Banco Mundial previa um crescimento de 3% este ano para os EUA. Agora, já projeta 3,2%. Numericamente, 0,2 ponto não é lá grande coisa. Mas hoje em dia qualquer melhora merece ser comemorada. Para a segunda maior economia, a China, a escadinha é de baixa: 7,4% em 2014, 7,1% este ano, 7% em 2016 e 6,9% em 2017. O binóculo apontado para a zona do euro e para o Japão foi ajustado agora para objetos de tamanhos menores em relação aos de junho, mas pode estar fazendo aproximações exageradamente otimistas quanto ao futuro. O crescimento da primeira passaria de 0,8% no ano passado para 1,1% neste e 1,6% no próximo. O segundo avançaria de 0,2% para 1,2% e depois para 1,6%.

E o novo Brasil, o da austeridade fiscal? A expansão do PIB para 2014, cujo número oficial do IBGE só será conhecido em março, foi reduzida de 1,5% para 0,1% e, para 2015, de 2,7% para 1%. Ao projetar 0,40%, o Focus do Banco Central vê um rei mais despojado de ornamentos que a instituição. O Brasil só não está pior na foto que a Argentina (-0,3% este ano) e a Rússia (-2,9%).

Mas foram as projeções para o desempenho da economia mundial como um todo as responsáveis por desencadear ontem uma nova rodada geral de baixa das commodities metálicas. Em junho, o Banco Mundial acreditava que o mundo iria crescer 3,4% este ano. Agora, indica avanço de 3%. O cobre liderou as perdas, mas elas atingiram também o chumbo, o zinco, o alumínio e o ferro.

Quem exporta esse tipo de produto são os países emergentes e, portanto, as suas moedas deveriam ter perdido valor frente ao dólar. Essa lógica não foi respeitada ontem porque saiu um indicador muito ruim nos EUA. As vendas varejistas caíram 0,9% em dezembro, quando a expectativa dos especialistas era de um recuo bem mais leve, de 0,2%. Parece que o consumidor não está destinando os dólares economizados na hora de abastecer o carro para fazer novas compras. E as moedas se fortaleceram perante a americana. O dólar fechou cotado a R$ 2,6213, em baixa de 0,59%.
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Além do impulso de baixa vindo de fora, o mercado de câmbio se convenceu de outras tantas obviedades: o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, vai mesmo, quem diria, cumprir a meta deste ano de superávit primário, equivalente a 1,2% do PIB. O mercado está encantado com a adesão presidencial ao arroz-com-feijão liberal-conservador anunciado. Não há nenhuma inovação, nenhuma sacada genial, nem insight estarrecedor nos “ajustes” pretendidos. E o país já é outro, no entender do câmbio, uma economia em processo de reforma que, alinhada ao curso correto, nem precisaria pagar tanto juro assim para atrair multidões de investidores estrangeiros.
Falta combinar com os russos. O BC divulgou ontem relatório sobre o comportamento da balança cambial (tudo o que entra e sai de dólares do país) no acumulado do ano até o dia 9. O fluxo foi negativo em US$ 2,41 bilhões no período (dos quais US$ 2,325 bilhões somente em capital financeiro), montante que, acrescido dos US$ 14,5 bilhões que se evadiram em dezembro, dá uma fuga de quase US$ 17 bilhões em apenas 30 dias úteis. Executivos de corretoras de câmbio garantem que o pior já passou. Identificaram nesta semana a entrada de um expressivo fluxo positivo externo, sobretudo ontem e na terça-feira, ainda não captado nas estatísticas oficiais. Só na próxima quarta-feira, quando o BC divulgar os dados sobre o comportamento desta semana, se saberá ao certo. O BC poderia inovar na próxima quarta-feira, e abrir os números referentes à conta financeira para que, expurgados os movimentos do setor produtivo, se saiba o montante aproximado dos “tiros curtos”, as incursões ligeiras de “hot money” atrás da Selic de 12,75% (a embutida na curva futura de juros) enquanto não começar a correria pré-alta da “fed fund rate”.

As visões comprobatórias do Banco Mundial reforçaram o movimento de aversão global a risco, principal característica dos mercados neste início de ano. Os investidores não têm muito para onde fugir. Prevalecem as trilhas clássicas: compra de iene (considerada a moeda mais segura do mundo) e de bônus do Tesouro americano (os títulos idem). Se as economias patinam, os juros, por mais baixos que já estejam, podem estar na verdade incompativelmente altos. Essa percepção levou a uma bateria baixista nos juros mundo afora. A taxa de 10 anos dos EUA recuou ontem de 1,89% para 1,81%, enquanto os títulos de mesmo prazo emitidos pelos governos da Alemanha (0,42%), da França (0,66%), da Itália (1,71%) e do Japão (0,25%) desciam a mínimas históricas.

No Brasil, a ameaça de um tarifaço elétrico conteve a baixa dos DIs. As taxas para janeiro de 2016 e janeiro de 2021 fecharam estáveis em 12,67% e 12,10%, respectivamente, enquanto que o contrato para janeiro de 2017 recuou de 12,48% para 12,45%.
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