O dólar amplificou ontem em relação ao real o leve sinal externo de alta por causa da decisão do Banco Central de restringir a oferta de swaps cambiais destinados à rolagem dos que irão vencer no começo de junho. A autoridade indicou que pretende renovar não mais do que 80% do lote de US$ 9,656 bilhões em contratos antigos a serem liquidados no dia 1°. Na passagem de abril para maio, reduziu a quantidade diária de papéis de 10,2 mil para 8,1 mil, externando a intenção de levar ao resgate cerca de US$ 1,961 bilhão, ou seja, irá retirar do mercado proteção cambial no valor de quase US$ 2 bilhões. Na falta do BC, este volume terá de ser suprido por instrumentos de hedge privados e também por dólares “cash”, o que exerce pressão de alta sobre a moeda. E o dólar fechou com valorização de 2,24%, cotado a R$ 3,0807. Mas tal pressão tende a se exaurir nos próximos dias. À medida que investidores e empresas forem conseguindo refazer sua proteção, o dólar voltará a refletir as condições favoráveis a uma tendência de baixa.
O BC não pode ser acusado de ter desrespeitado as regras definidas em nota oficial, expedida em 24 de março, por meio da qual comunicou ao mercado sua decisão de acabar com a oferta diária de swaps cambiais novos. Na nota, diz que “os swaps cambiais vincendos a partir de 1º de maio de 2015 serão renovados integralmente, levando em consideração a demanda pelo instrumento e as condições de mercado”. Esse compromisso de renovação integral valeu apenas por um mês, abril, quando foram rolados todos os US$ 10,115 bilhões que venceram ontem, primeiro dia útil de maio.
Neste mês, já vale a ressalva feita na nota, a condicionalidade relativa às “condições de mercado”. Efetivamente, elas mudaram. Em abril, o dólar acumulou desvalorização de 5,57% porque o robusto fluxo de capitais externos de investimento respondeu positivamente ao cenário externo mais favorável às aplicações de risco – um reflexo da expectativa de que o Federal Reserve (Fed) só deve, no melhor dos mundos, subir o juro básico americano no fim do ano – e também à distensão da crise política interna que ameaçava o ajuste fiscal.
O mercado cambial mudou e, já que o BC pode, a decisão de tirar de circulação swaps velhos no montante de quase US$ 2 bilhões é coerente com as diretrizes traçadas pela política monetária. Ao insistir no severo aperto monetário, mantendo o ritmo de alta da Selic em uma velocidade incompatível com a desaceleração da atividade econômica, e, simultaneamente, provocar a alta do dólar, o BC está dizendo que a inflação se combate com juro e não com taxa de câmbio. A autoridade mostrou que não irá ceder à tentação, recorrente do Plano Real para cá, de utilizar o câmbio apreciado para neutralizar pressões inflacionárias. A alta do juro é um vigoroso estimulante à entrada de capitais de fora, sobretudo os mais especulativos. Mas, ao permitir a valorização da moeda americana por meio da limitação da oferta de instrumentos de hedge, o BC anula esse efeito.
Insistir na manutenção de uma taxa de câmbio competitiva, acima dos R$ 3,00, equivale a tentar contrabalançar o impacto negativo do rigor monetário sobre o setor produtivo. O pior dos mundos estaria na conjugação de juros elevados e câmbio apreciado. As empresas não teriam para quem vender tanto internamente quanto no mercado externo.
Se o cenário global se alterar negativamente, se a aversão a risco retornar, o BC poderá voltar atrás em sua sinalização de corte de 20% da rolagem dos swaps antigos. A própria nota do dia 24 de março fornece esse “plano B” ao avisar que “sempre que julgar necessário, o Banco Central do Brasil poderá realizar operações adicionais por meio dos instrumentos cambiais ao seu alcance”.
Se a intenção oficial é utilizar apenas o “instrumento monetário” – a taxa Selic – para impedir que o IPCA como um todo seja contaminado pela alta dos “preços relativos” (câmbio e tarifas públicas), os contratos de juros futuros só poderiam mesmo ter subido ontem na BM&F. A taxa do contrato mais líquido, com vencimento em janeiro de 2017, avançou de 13,46% para 13,55%. O contrato para janeiro de 2021 passou de 12,71% para 12,86%.
O pregão não quis ver o lado positivo da mudança da postura cambial do BC. Os gastos com os juros da dívida, que subiram de R$ 56,34 bilhões em fevereiro para R$ 69,49 bilhões em março, crescem não só porque a Selic está em alta, mas também como reflexo das despesas com os swaps cambiais. Ao reduzir a oferta de swaps, o BC irá baixar o volume de estoque dessas operações dos atuais US$ 112,83 bilhões para cerca de US$ 110,8 bilhões. Não é muito, mas já é o começo da descompressão de uma conta que contribui decisivamente para o aumento da dívida bruta como proporção do PIB.
O DI futuro prefere focar no lado negativo, a suposta deterioração das expectativas inflacionárias relatada pelo boletim Focus. A mediana do total de cem previsões fornecidas por instituições para o IPCA acumulado este ano subiu de maneira quase imperceptível de 8,25% para 8,26%, enquanto que o grupo das cinco que mais acertam palpites elevou as suas de 8,67% para 8,73%.
Em primeiro lugar, chama a atenção a discrepância entre os dois grupos. Um dos dois tem de estar muito errado. A desarmonia prejudica a confiabilidade da pesquisa? Em segundo lugar, poucos notam a queda no prognóstico que interessa mais diretamente aos investidores. Trata-se do IPCA acumulado para os próximos 12 meses. Ele caiu agora de 6% para 5,96%, quando estava em 6,11% há quatro semanas. A projeção para 12 meses é utilizada para um cálculo essencial, o do juro real “ex-ante”, o critério de taxa real da economia mais observado na hora da tomada da decisão de investimento. Como o juro nominal para o mesmo período – o do swap pré/DI de 360 dias – só sobe e a projeção de IPCA só cai, o juro real não para de subir. Enquanto o IPCA recuava, o swap de 360 dias subia de 13,52% no fim de março para 13,67% no fim de abril. Resultado: o juro real saltou de 6,98% para 7,28%. É muito juro real para uma economia que vai cair este ano, segundo o Focus, 1,18%. Está na hora de o BC suspender o seu aperto monetário.