Por diana.dantas

A ata da reunião do final de abril do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc) do Federal Reserve (Fed), divulgada no início da tarde de ontem, acentuou o declínio dos juros e do dólar. Os mercados domésticos estão mais conectados aos eventos monetários americanos do que às idas-e-vindas do ajuste fiscal e às mudanças de tom do Banco Central. Não poderia ser de outra maneira: todos os esforços do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, em reorganizar as finanças públicas e do BC em puxar a inflação à meta dependem, em primeira e última instância, do comportamento da economia dos EUA e das reações subsequentes dos mercados globais e do Fed. Se o “novo normal” externo – acomodação monetária e hiperliquidez – estiver em vigência (como deverá continuar por mais longos meses, a se acreditar na ata de ontem), só então as agonias locais farão preço nos segmentos de câmbio e juros futuros.

Já antes da ata, a remuneração do título de 10 anos do Tesouro americano escorregava dos 2,29% do fechamento de terça-feira para 2,26%. Depois dela, desceu a 2,24%. E o Dollar Index reduziu sua evolução já modesta. Contra o real, a moeda caiu 1,24%, cotada a R$ 3,0035. Os contratos de juros futuros negociados na BM&F distenderam a corda esticada pelo BC. E as taxas caíram em bloco. Para a virada do ano, recuou de 13,83% para 13,77%. O contrato com vencimento em janeiro de 2017 baixou de 13,47% para 3,34%.

O quadro da economia americana desenhado pelo Fed, embora se refira a um período (até o final de abril) que exibiu indicadores bem melhores do que os veiculados na primeira quinzena de maio, não foi nada animador. Logo de cara, o documento descarta qualquer possibilidade de a “fed funds rate” (a Selic dos EUA) subir na próxima reunião do Fomc, agendada para 17 de junho. A maior parte dos 12 membros do Comitê reconhece que a fraqueza do mercado de trabalho retira impulso da inflação. Ao desprezar a hipótese de o ciclo de aperto se iniciar no mês que vem, diretores e presidentes regionais do Fed estão dizendo que não acreditam que os indicadores possam ter uma súbita melhora até lá. A ata exibiu um conjunto de aflições e decepções: o declínio do petróleo não estimulou os gastos dos consumidores na proporção imaginada por eles; as apreensões globais com a China e os rumos da eurolândia a partir da crise grega podem estar afetando os EUA; e os juros dos títulos de longo prazo do Tesouro podem subir exageradamente quando o Fed for deslanchar o aperto, o que cria um constrangimento.

O Fed teme que haja uma disparada dos rendimentos das “treasuries” capaz de amplificar o movimento inicial muito comedido de elevação da taxa básica. Ou seja, a alta oficial seria pequena, mas a feita pelo mercado, pesada demais a ponto de sabotar a recuperação econômica. Por isso, o Fed gostaria que a economia estivesse sólida na presença de taxas de 10 anos não tão baixas. Seria indício de que a atividade poderia resistir e manter-se em recuperação a despeito de elevações adicionais dos juros, neste caso, bem menos expressivos, pois partiram de bases não muito deprimidas.

O documento atenuou a suposição de que a perda de fôlego da economia poderia decorrer exclusivamente de razões passageiras, como o inverno rigoroso. Apesar de a ata passar a impressão de ter sido atualizada em consonância com as informações mais recentes, os mercados, a despeito das quedas de ontem, não fecharam questão sobre a rota da política monetária a partir de setembro. E esperam que a chair Janet Yellen, no discurso de fará amanhã, possa ser mais conclusiva sobre o período que considera mais favorável à normalização monetária, se o final deste ano ou o começo do próximo.

Antes da fala de Yellen, percepção cristalizada é de que dificilmente o Fed encontrará ambiente favorável a uma mexida monetária ainda este ano. Sinal verde para a continuidade da farra da liquidez. Após amargar um pesado déficit de US$ 2,56 bilhões na primeira semana de maio, a balança cambial voltou a exibir saldo positivo na semana passada. Foi de US$ 983 milhões, graças às entradas líquidas de capital financeiro de US$ 1,01 bilhão, já que a conta comercial foi negativa em US$ 31 milhões. Mas os ingressos foram insuficientes para reverter o acumulado de maio deficitário agora em US$ 1,58 bilhão. A primeira semana de maio pode ter sido apenas um ponto fora da curva.

O fluxo cambial acumulado de janeiro até o último dia 15, de US$ 16,3 bilhões, é 5,2 vezes superior ao de igual período do ano passado. A razão interna para o aumento na captação de aplicações estrangeiras é a elevação da taxa Selic. Do primeiro quadrimestre de 2014 para cá, os indicadores macroeconômicos do país se degradaram, tornando os investimentos potencialmente mais arriscados, mas a Selic subiu da faixa entre 10,5% e 11% para 12,25% e 13,25% no mesmo período de 2015. A arrancada da taxa básica talvez não fosse suficiente para seduzir os capitais externos se não viesse acompanhada por um cenário externo mais propício aos ativos emitidos por emergentes.

Com o “novo normal” global consolidado, câmbio e juros voltam a concentrar suas atenções na arena fiscal. O governo terá de definir hoje o tamanho dos cortes no Orçamento sem dispor ainda de uma visão completa sobre o montante que o ajuste fiscal elaborado pela Fazenda conseguirá angariar após finalizado o longo e lento processo de votação das MPs pelo Congresso. O projeto de lei que trata das desonerações tributárias ficará fora do cálculo. Ele só será apreciado pela Câmara em 10 de junho e, dadas as pressões de entidades empresariais, pode chegar desfigurado. Por isso, o mercado torce para que a dimensão do contingenciamento orçamentário beire o teto estudado, de R$ 80 bilhões, para que a meta de superávit fiscal para o ano não sofra questionamentos capazes de minar a confiança dos investidores.


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