Por diana.dantas

As operações de renda fixa não são afetadas tecnicamente pela deterioração das expectativas de inflação denunciada pela pesquisa Focus do Banco Central. Na edição publicada ontem, constatou-se a elevação pela oitava semana em sequência da projeção de IPCA para este ano. Nesta oitava alta, foi de 8,39% para 8,46%. Esta é a mediana da expectativa do universo total de 100 instituições pesquisadas. E ainda pode ser considerado um prognóstico “benigno” – uma das três palavras mais utilizadas por analistas, ao lado de “robusto” e “resiliente” —, já que entre as Top 5, grupo escolhido pelo BC entre as firmas que mais acertam palpites inflacionários, o IPCA antevisto para o acumulado de 2015 subiu de 8,79% para 8,88%. Esta expectativa catastrófica do mercado não abala a renda fixa pois não se trata de uma visão sobre o futuro.

Ao contrário do que sugere a simples lógica temporal, adivinhações sobre 2015 são ilações sobre o que já passou. E o passado não interessa a quem põe dinheiro em títulos de renda fixa. As projeções para o ano em curso só servem ao propósito de dar munição aos executivos da linha-dura mercadista — a linha que se esforça em encontrar argumentos para amparar e subsidiar o discurso “hawkish” do BC. Na prática, não servem para nada. Isso porque o tesoureiro de banco ou o CFO (Chief Financial Officer) de uma empresa, antes de se decidir por uma aplicação, olham apenas para dois dados: o IPCA projetado para os próximos 12 meses e o juro nominal do swap pré/DI negociado na BM&F. E o IPCA para 12 meses à frente caiu no Focus divulgado ontem. De 5,99% para 5,95%. É essa a “inflação” do mercado.

As outras são meras curiosidades históricas. E a taxa do swap utilizada é a de sexta-feira, para casar com o prazo do Focus. Ela subiu de 13,92% no dia 3 para 14,02% no dia 5. Ou seja, embute um juro real de inacreditáveis (se não vivêssemos no Brasil) 7,62%. Trata-se de pura má-fé qualquer análise que, apontando o dedo para a degradação das expectativas de IPCA para este ano, chega à conclusão de que, apesar do ultrarrigor monetário do BC, incorre-se no risco da “eutanásia do rentista”. Nada disso: o rentista está cada vez mais “robusto” e “resiliente” a qualquer inflação. Os ativos de renda fixa — mesmo os pré-fixados, cuja taxa já incorpora mais um aumento da Selic, desta vez de 0,25 ponto, no mês que vem — estão superatraentes, o que explica o saque líquido de R$ 32,3 bilhões da caderneta de poupança no acumulado do ano até maio. Aliás, se disseminar a tese de que o Copom já foi longe demais, os pré são hoje melhor alternativa que os pós-fixados.

A comprovação do fato de que a piora no prognóstico de IPCA para 2015 não serve para nada foi o declínio exibido ontem pelos juros no mercado futuro da BM&F. A taxa para janeiro de 2017 cedeu de 13,66% para 13,57%. E o contrato longo de maior liquidez, com vencimento em janeiro de 2021, fechou a 12,53%, ante 12,60% na sexta-feira. Os contratos caem porque a inflação que conta está em queda, porque o Copom já passou de todos os limites razoáveis em sua cruzada desinflacionária e porque o dólar desvalorizou-se globalmente. Alguns operadores tentaram atribuir à uma fala do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, parcela de responsabilidade no recuo dos DIs. Uma colocação de Levy — a retirada de subsídios creditícios oficiais vai conferir maior potência à política monetária, tornando dispensável ciclo exagerado de aperto — teria ajudado na diminuição das taxas futuras. O que Levy falou nada mais é do que teoria elementar. Está mais para o conselheiro Acácio do que para o “Judas” de Dilma ou o “Cristo” de Temer. Não há nada de novo na colocação do ministro. Num mundo ideal, é isso mesmo o que ocorre, pois a decisão do BC não encontrará canais bloqueados e poderá disseminar-se rapidamente. Só que a economia é, como o mercado, um organismo vivo que pensa politicamente.

Enquanto ente vivo — frequentemente vivíssimo — que pensa politicamente, o mercado dobrou a força que exerce no cabo de guerra travado com o BC. O mercado cobriu a aposta da autoridade monetária e jogou mais fichas na mesa. Na quarta-feira, 3, o Copom, ao elevar a taxa básica de 13,25% para 13,75% e ao manter intacto o comunicado que indica novas elevações, gritou ao mercado: “Você precisa reduzir sua projeção para o IPCA do ano que vem. Ela está muito alta, pois a meta de 4,5% será alcançada de qualquer jeito”. O mercado, ao manter no Focus divulgado ontem, sua previsão de IPCA de 5,5% em 2016, respondeu: “Eu não acredito”.

Aquele juro real fantástico de 7,62% pode estar subdimensionado se o BC estiver certo e a inflação descer mesmo a 4,5% no ano que vem. A inflação efetiva para os próximos 12 meses pode ser mais baixa que os 5,95% estimados pelas instituições. Nessa hipótese, as aplicações prefixadas são as mais indicadas. Este é outro fator que auxilia na queda dos DIs, pois tesoureiros e gestores já ampliaram a oferta de dinheiro na ponta pré.

O dólar caiu nos quatro cantos do mundo por dois motivos principais. O primeiro foi declaração atribuída ao presidente dos EUA, Barack Obama, na reunião do G-7. Teria dito que o dólar forte deve ser visto como um problema. O segundo foi recuo de 2,41% para 2,38% da taxa da T-Note de 10 anos. Após o rali recente, a queda da “treasury” deve ser vista como pausa momentânea destinada a reagrupar forças. Logo começará novo rali destinado à preparação das carteiras para a reunião da semana que vem do Federal Reserve (Fed). Contra o real, o dólar desvalorizou-se 1,29%, cotado a R$ 3,1099. O mercado de câmbio vem navegando desde o final de março na larga faixa entre R$ 3,00 e R$ 3,20 à espera de um fato definidor. Virá nesta reunião do Fed?

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